O sorriso de Nelson Mandela ainda pode ser visto pintado em diversos edifícios no centro de Joanesburgo, 10 anos após sua morte. A África do Sul celebra nesta terça-feira (05/12) o aniversário do desaparecimento do líder, entre a nostalgia pela sua integridade e a decepção pelo que se seguiu no país.
O aniversário tem um sabor ao mesmo tempo doce e amargo para a África do Sul: de um lado, a memória de Madiba, aquele que instaurou a democracia, o ex-presidiário da Ilha Robben que se tornou o primeiro presidente negro do país após derrotar o regime racista do apartheid, uma estrela mundial que morreu aos 95 anos em 5 de dezembro de 2013.
Do outro, a situação atual do país, ainda liderado pelo seu partido ANC, mas oprimido pela corrupção e pelos cortes de energia, e que se tornou o mais desigual do mundo, de acordo com o Banco Mundial.
“Amamos o que ele [Mandela] fez, apreciamos a liberdade que nos deu. Só desejo que seu legado possa continuar”, declarou Prosper Nkosi, que vive na antiga casa de Mandela em Soweto, cidade vizinha a Joanesburgo, testemunha e cenário da luta contra o apartheid. Mas, “em dez anos, pouca coisa mudou ou melhorou”, ele acrescenta.
Apartheid de gênero
Enquanto o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, optou por não fazer qualquer pronunciamento, a paquistanesa Malala Yousafzai, vencedora do Prêmio Nobel de 2014 por sua luta pelo direito das meninas à educação, foi escolhida para fazer o discurso de aniversário em um teatro em Joanesburgo.
Durante o evento, ela denunciou que o regime talibã tornou impossível “ser uma menina” no Afeganistão e chamou o “apartheid baseado no gênero” de “crime contra a humanidade”.
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Nelson Mandela continua presente em dezenas de estátuas pelo país
“Os talibãs tornaram ilegal ser menina e isso tem um custo”, declarou ela na conferência organizada pela Fundação Mandela, destacando que as meninas afegãs estão “recorrendo às drogas” e “tentando suicídio” por causa da “opressão”.
“É imperativo chamar o regime afegão pelo que ele é: é um regime de apartheid baseado no gênero”, insistiu. “Os sul-africanos lutaram para que o apartheid baseado na raça fosse denunciado e criminalizado internacionalmente, chamando a atenção do mundo para os horrores do apartheid”, comparou Malala Yousafzai.
“Mandela está morto”
No mês do aniversário de falecimento deste líder internacional, a Fundação Mandela organizou na capital econômica sul-africana uma modesta exposição interativa intitulada “Mandela está morto”, para que os visitantes pudessem deixar mensagens, críticas e esperanças, dez anos depois.
O rosto de Madiba continua muito presente: nas notas de dinheiro, nos numerosos murais das cidades e, mais oficialmente, em dezenas de estátuas pelo país.
Para Njabulo Mngadi, morador de Joanesburgo, “a África do Sul deve redescobrir o ‘espírito de Mandela’” para mudar para melhor. “Devemos continuar seu trabalho”, porque “sempre há coisas erradas na África do Sul”.
Já Verne Harris, presidente interino da Fundação Mandela, arquivista por muito tempo de Madiba, reconhece que uma “nostalgia profunda” permanece palpável entre muitos sul-africanos.
Mas ele teme que, ao “se agarrar a este símbolo”, o país fique parado. “Talvez seja hora de nos deixarmos levar e encontrarmos novos modelos para nós”, ele especula.