Em fevereiro deste ano a Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal deu parecer favorável ao Projeto de Lei 4256/2019, que dispõe sobre o armamento de agentes socioeducativos. O autor do projeto é o Senador Fabiano Contarato, ex-delegado da Policial Civil, eleito pelo PT do Espírito Santo. Também tramita na Câmara dos Deputados o PL 376/2024, que versa sobre o mesmo tema e é de autoria do deputado Messias Donato (Republicanos-ES).
Em contraposição à política do governo Lula, que no primeiro ato como presidente assinou um decreto para restringir a compra e registros de armas no país, os projetos de lei em tramitação têm preocupado organizações de direitos humanos ligadas aos direitos de crianças e adolescentes. Em nota técnica, a Coalizão pela Socioeducação conclui que “armar agentes socioeducativos […] será um retrocesso e uma violação grave aos direitos fundamentais de adolescentes e jovens no Brasil, tanto no plano nacional quanto no internacional.”
Quem são os jovens do sistema?
O relator do projeto no Senado, Eduardo Girão (NOVO-CE), defendeu a aprovação do PL argumentando que se trata de uma medida para assegurar a vida dos agentes, uma vez que estes seriam “constantemente ameaçados por elementos que integram quadrilhas, muitas delas comandadas, infelizmente, por menores infratores.“ (Agência Senado)
No entanto, os dados do Relatório Anual do Conselho Nacional de Justiça apontam que a maioria dos adolescentes privados e restritos de liberdade, na verdade, se envolveram em atos infracionais ligados a crimes contra o patrimônio: 45% roubo e 22% tráfico de drogas. Ou seja, a minoria desses jovens estão ligados a atos infracionais análogos a crimes contra a vida.
O relatório destaca ainda que “não é incomum que a implicação desses adolescentes e jovens em dinâmicas infracionais em grande medida se relacionem com questões estruturais vinculadas às desigualdades sociais e ao acesso à bens e renda” e que a própria Organização Internacional do Trabalho “compreende o ato infracional análogo ao tráfico de drogas como umas das piores formas de trabalho infantil”.
Ampliar a circulação de armas de fogo aumenta a violência
Os casos de morte por arma de fogo no Brasil representam 76% do total de mortes violentas em 2022, segundo o 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Em um ano de flexibilização de armas e munições, promovida pelo governo Bolsonaro, tivemos aumento de 24% de assassinatos por arma de fogo no país (2020 a 2021). Um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) aponta que, não fosse essa política, o Brasil teria 6.379 homicídios a menos entre 2019 e 2021.
Portanto, é falso afirmar que aumentar o armamento promoverá mais segurança para a sociedade ou mesmo para o portador da arma. Flexibilizar a posse e porte de armas, ao contrário do que dizem os seus defensores nos rincões do país, corresponde a um aumento direto da violência.
Além disso, a política armamentista está a serviço da ganância pelo aumento dos lucros dos fabricantes de armas.
Não à toa, Salésio Nuhs, que é CEO da maior fabricante de armas do Brasil, a Taurus Armas, se lamenta em entrevista ao jornal O Globo pela queda de 75% dos lucros da empresa após o decreto federal de restrição ao armamento. Isso porque, durante o governo Bolsonaro, a empresa teve recordes de lucro e faturamento com a política de incentivo e ampliação do acesso às armas e munições no país. A receita da Taurus chegou a crescer 204,7%, e o lucro, 1.059% em 2021.
De fato, os senhores das armas se esbaldam com a violência e a guerra, como comprova o disparo das ações da Taurus na medida em que se aprofunda a guerra do Estado de Israel contra o povo palestino, com aumento ainda de 700% das exportações para Israel só no primeiro semestre de 2023.
Violência é sintoma e não a causa
Existem duas posições na sociedade sobre o problema da violência. A primeira, carregada com a ideologia fascista das classes dominantes, propõe armar as pessoas para defender suas posses, aumentar ostensivamente o policiamento para proteger as propriedade nos bairros ricos e reprimir a miséria nos bairros populares.
Fico com a explicação mais justa. Basta olhar para ver que a violência é o sintoma e não a causa. Apesar do Brasil ser um país extremamente rico, como comprova o PIB de 2,62 trilhões de reais do agronegócio ou o faturamento de 115 bilhões do Carrefour em 2023, essa imensa riqueza se concentra na mão de um pequeno punhado de pessoas. A imensa maioria, na realidade, vive na pobreza, com 12,2 milhões de trabalhadores desempregados. A mendicância, criminalidade, tráfico e crescimento da população em situação de rua é o que resta para o povo debaixo de tanta exploração. Só na capital de São Paulo, 31.884 pessoas estão vivendo nas ruas, segundo dados da ONG SP Invisível. Esse número representa uma população superior a 89% das cidades brasileiras. (A Verdade, nº290).
Que oportunidades são oferecidas para a juventude nesse sistema?
Os homens que fazem as leis deveriam estar preocupados em resolver o problema das escolas caindo aos pedaços, da falta de emprego e moradia para nossos jovens. Sem dúvidas, nenhuma criança sonharia em ser ladrão se tivesse comida na mesa e um pouco de dignidade na vida.