Combinando questões gerais e outras bastante pessoais, Opera Mundi traz o especial A Pandemia no Mundo. O objetivo é verificar o impacto da covid-19 em diferentes países. Trata-se de uma enquete: as mesmas 27 perguntas são repetidas para moradores deles, de modo que as respostas possam ser acompanhadas e comparadas.
Quando a pandemia começou, dizia-se muito que o coronavírus era “democrático”, atacando igualmente pobres e ricos, brancos, asiáticos e negros, homens e mulheres.
O que a realidade mostrou é que os pobres são mais vítimas da covid-19, como a condução das políticas de saúde por governos de todo o mundo resultou em radicais diferenças no número de contaminados e de mortos.
Quem responde as perguntas hoje é a tradutora Denise Mota, de Montevidéu.
1. Descreva o grau máximo de isolamento social praticado onde você está.
Aqui no Uruguai, o isolamento social foi voluntário. E, após 60 dias do aparecimento do primeiro caso (em 13 de março), vários uruguaios ainda continuam em quarentena.
2. Quando começou sua quarentena?
Comecei quando o governo pediu aos cidadãos que dessem início à quarentena, na época em que surgiu o primeiro caso de coronavírus no país.
3. Quem está com você?
Estou na mesma casa com meus dois filhos (12 e 10 anos) e meu marido.
4. É fácil conviver assim?
No meu caso, sim, porque vivemos em uma casa grande com quintal.
5. Quando você sai de casa?
Nos primeiros 60 dias, não saí de casa, nem meus filhos. Meu marido saía para fazer todas as compras da casa e trabalhar. Agora, que já estamos no dia 70 do primeiro caso, voltei a sair para algumas compras pontuais e compromissos profissionais. Mas não estou saindo mais do que duas vezes por semana e por algo como 2 horas a cada saída. Meus filhos continuam sem sair de casa. Com eles, só saímos de carro para passear um pouco pela cidade. E não descemos do carro.
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6. Teve ou conhece alguém no país em que está que teve covid-19?
Pessoalmente, não.
7. Como viu a ação do governo do país em que está em relação ao coronavírus?
Rápida, inclusive houve críticas aqui de que foi “exagerada” ao pedir quarentena aos cidadãos desde o primeiro dia. Eu achei acertada.
8. Ela mudou muito com o tempo?
Não. A população continua obedecendo às orientações do governo. Claro que, a essa altura, e com os números baixos de mortos e contágios do Uruguai, já se veem pessoas sem máscaras na rua, mas em lugares fechados o uso de máscaras é de quase 100%.
9. Você está neste país por que motivo?
Vivo no Uruguai há 15 anos porque me casei com um uruguaio.
10. Acompanhou a situação brasileira?
Sim, diariamente. E venho sofrendo com o que vejo.
11. A embaixada brasileira se comunicou com você ou com pessoas que você conheça?
Não se comunicou comigo nunca. Não sei de brasileiros que tenham recebido o contato da embaixada.
12. O governo brasileiro ofereceu algum tipo de ajuda?
Não.
13. Como você acompanha as notícias do Brasil?
Por Twitter, principalmente, pela TV e pelos portais de notícias (UOL, Estadão e Globo, principalmente). Mas também Correio Braziliense e alguns outros, dependendo do que queira saber. Tenho visto o portal de coronavírus do governo federal também, para ter uma ideia do número de casos, mortalidade e letalidade por Estado.
14. Gostaria de voltar ao Brasil? Por quê?
Não. Porque tenho minha vida organizada aqui, com uma filha pré-adolescente que tem uma vida criada. Além do mais, não me sinto estimulada a voltar ao Brasil, com o estado de coisas – políticas e sociais – que vejo diariamente.
15. Sua vida profissional mudou durante a pandemia? Como?
Sim. Comecei a fazer home office e depois perdi meu emprego principal (edição de vídeos jornalísticos de esporte). Voltei a me dedicar mais às traduções porque é um trabalho que posso continuar a desenvolver em casa, já que as crianças continuam com as escolas fechadas.
16. Sua vida afetiva (inclusive sexual, se quiser tratar disso) mudou durante a pandemia? Como?
Não. Continua igual porque tenho o mesmo parceiro há 15 anos.
17. Você engordou, emagreceu ou manteve o peso?
Desconfio que engordei um pouco, porque estive bem sedentária. Tenho uma esteira em casa, mas nunca tive vontade de fazer exercício (teria que voltar…). Não é algo que me preocupe no momento.
18. Você bebe mais ou menos durante a pandemia?
Estou bebendo mais, com certeza. Mas já passei do pico. Acho que, ao redor do final do primeiro mês da pandemia, estava bebendo mais. Agora que a quarentena se “normalizou” e que, além do mais, já nos sentimos mais seguros para voltar a sair, estou bebendo menos. Evidentemente, há menos angústia.
19. O que tem feito para ocupar o tempo durante a quarentena?
Lendo bastante e vendo filmes no computador com meus filhos. Também vendo séries que havia postergado durante muito tempo.
20. Desenvolveu, voltou a praticar ou abandonou algum hobby durante a pandemia?
Voltei a estudar tarô e recebi um diploma nisso! Sempre fui autodidata e decidi fazer um curso completo com aulas por Zoom.
21. Desenvolveu, voltou a praticar ou abandonou algum vício durante a pandemia?
Não, todos os meus vícios estão aqui… risos. Mas não há nenhum vício novo.
22. Tem realizado atividades para cuidar da saúde mental durante a pandemia?
Estou meditando muito. Tive mais tempo de ler sobre mecânica quântica, um assunto que me apaixona, e passei a meditar em geral uma vez por dia.
23. A pandemia fez com que você mudasse seu posicionamento político?
Não. Pude ler e ver mais sobre o que está acontecendo e isso na verdade reforçou os conceitos básicos que orientam meu posicionamento político.
24. Se pudesse dar um conselho a você mesmo antes de entrar em quarentena, qual seria?
'Saiba que vai durar mais do que se diz e se imagina'. Nada mais.
25. Você tem lido mais ou menos notícias durante a pandemia? Como é sua relação com o noticiário?
Muito mais. Estou tentando escapar do universo covid e ler mais sobre outras coisas também.
26. Como está a questão do abastecimento de insumos no país em que você está?
Normal, tudo o que procuramos está disponível, felizmente.
27. Como está o relacionamento com sua família? Melhorou? Piorou?
Melhorou. Tenho uma filha pré-adolescente que acabava de começar o ensino médio quando a pandemia estourou por aqui. (No Uruguai, o ensino médio começa aos 12 anos). Só a via de noite, porque trabalhava a tarde toda. Com a quarentena, o home office e as escolas fechadas, pude voltar a acompanhar suas atividades escolares por Zoom, compartilhar suas dúvidas a todo momento, fazer todas as refeições juntas, comentar notícias do dia, comentar séries, rir de coisas que ela me conta do encontro virtual com os amigos. Com meu filho menor também pude participar mais ativamente de suas atividades escolares. Estão super manhosos, vamos ver como vai ser agora a saída da quarentena e a volta à vida “normal”. Com meu marido, como ele ficou em casa só no primeiro mês e depois voltou a trabalhar, é quase como antes da pandemia, porque nos vemos só à noite. Acho que isso também ajuda na saúde do relacionamento…