Combinando questões gerais e outras bastante pessoais, Opera Mundi traz o especial A Pandemia no Mundo. O objetivo é verificar o impacto da covid-19 em diferentes países. Trata-se de uma enquete: as mesmas 27 perguntas são repetidas para moradores deles, de modo que as respostas possam ser acompanhadas e comparadas.
Quando a pandemia começou, dizia-se muito que o coronavírus era “democrático”, atacando igualmente pobres e ricos, brancos, asiáticos e negros, homens e mulheres.
O que a realidade mostrou é que os pobres são mais vítimas da covid-19, como a condução das políticas de saúde por governos de todo o mundo resultou em radicais diferenças no número de contaminados e de mortos.
Quem responde as perguntas hoje é o jornalista Nelson Francisco Sul, de Luanda (Angola).
1. Descreva o grau máximo de isolamento social praticado onde você está.
Quando as autoridades do meu país tomaram consciência da gravidade do coronavírus, eu já encontrava-me “confinado” em casa, por conta de um trabalho que venho fazendo desde dezembro passado. Mas uma coisa é isolar-se de forma natural, outra bem diferente é em função da nova realidade. Mas julgo que não foi difícil adaptar-se.
2. Quando começou sua quarentena?
Em rigor, começou no dia 27 de março, altura em que foi decretado o estado de emergência.
3. Quem está com você?
Os meus filhos e esposa.
4. É fácil conviver assim?
Estar confinado e não poder usufruir de um momento de lazer e ficar no nosso cantinho, em silêncio, é difícil pra todos nós. Aliás, deixem-me contar-vos algo: como vivo num apartamento, muitas vezes até os miúdos pedem para irem passar alguns dias em casa dos avós. Lá a casa é maior e com muito espaço para correr e brincar.
5. Quando você sai de casa?
Num país onde há carência de tudo, será quase impossível ficar 24 horas sem sair de casa. Como sou pai de três meninos, o menor com menos de um ano de idade, normalmente, eu saio pra ir jogar o lixo ou para ir às compras no supermercado.
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6. Teve ou conhece alguém no país em que está que teve covid-19?
Não.
7. Como viu a ação do governo do país em que está em relação ao coronavírus?
O governo começou bem. Mas depois, assistiu-se a chegada de dois voos provenientes de Portugal, quando havia suspendido todos os comerciais, por 15 dias.
8. Ela mudou muito com o tempo?
As medidas eram de que aqueles passageiros deveriam ser encaminhados para quarentena institucional, mas o ministro do Interior não permitiu que a sua filha fosse sujeita àquela medida.
9. Você está neste país por que motivo?
É meu país natal.
10. Acompanhou a situação brasileira?
Acompanho atentamente a situação brasileira, desde o coronavírus à política. Aliás, a seguir de Portugal, o Brasil é, provavelmente, o segundo país falante da língua portuguesa mais próximo de Angola. Tenho família, amigos e colegas neste país.
11. A embaixada brasileira se comunicou com você ou com pessoas que você conheça?
Não, nunca fui contatado. Quanto a pessoas que eu conheça, não faço a mínima ideia.
12. O governo brasileiro ofereceu algum tipo de ajuda?
Seria bem-vinda, mas não. Sobre se ofereceu algum tipo de ajuda ao Governo angolano ou a pessoas que eu conheça, não sei responder.
13. Como você acompanha as notícias do Brasil?
Através de canais televisivos e de jornais. É duro ver o que está acontecendo no Brasil. Li, na Folha de São Paulo, que já ultrapassou um milhão de casos confirmados, número que corresponde a 10% da população portuguesa. Mas acho que o novo coronavírus só tem causado estragos, por causa de um outro, e mais letal, que se chama Bolsonaro
14. Gostaria de voltar ao Brasil? Por quê?
Nunca visitei o Brasil.
15. Sua vida profissional mudou durante a pandemia? Como?
Mudou, e muito. Passei exclusivamente a regime de teletrabalho (home office), o que, na verdade, torna as coisas mais difíceis e cansativas. Como jornalista freelancer, trabalho para uma rádio alemã, a Deutsche Welle, e escrevo para um jornal português, o Expresso, e nas condições atuais não é fácil contatar as fontes e apurar as informações.
16. Sua vida afetiva (inclusive sexual, se quiser tratar disso) mudou durante a pandemia? Como?
Claro, mudou. Estar confinado a tendência é de aumentar o stress e ter a mente ocupada com interrogações sobre quando é que isto vai terminar… além de fazer a gestão das birras dos filhos, que também sofrem com o confinamento e a falta de liberdade.
17. Você engordou, emagreceu ou manteve o peso?
Está tudo na mesma.
18. Você bebe mais ou menos durante a pandemia?
Continuo a não consumir álcool, como sempre.
19. O que tem feito para ocupar o tempo durante a quarentena?
Escrever.
20. Desenvolveu, voltou a praticar ou abandonou algum hobby durante a pandemia?
Voltei a praticar exercícios físicos. De segunda à sexta-feira, caminho durante uma hora e meia com o meu primogênito, de 9 anos.
21. Desenvolveu, voltou a praticar ou abandonou algum vício durante a pandemia?
Não.
22. Tem realizado atividades para cuidar da saúde mental durante a pandemia?
Exercícios físicos.
23. A pandemia fez com que você mudasse seu posicionamento político?
Não. Para cada situação, tenho sempre um posicionamento de acordo com as circunstâncias que ela merecer.
24. Se pudesse dar um conselho a você mesmo antes de entrar em quarentena, qual seria?
Isolamento social e confinamento não nos deve afastar afetivamente dos amigos, colegas e familiares. Hoje em dia existem variadíssimas formas de entrar em contato. Pode não ser a mesma coisa, mas com certeza é uma forma de dizer as pessoas que são muito importantes pra nós.
25. Você tem lido mais ou menos notícias durante a pandemia? Como é sua relação com o noticiário?
A princípio, não sou de acompanhar com frequência as notícias sobre o novo coronavírus. Quanto mais acompanharmos as notícias sobre a covid-19, estaremos prejudicando a nossa saúde mental.
26. Como está a questão do abastecimento de insumos no país em que você está?
Não sei responder.
27. Como está o relacionamento com sua família? Melhorou? Piorou?
Apesar de ter abrandado os encontros presenciais, por conta atual contexto, continuamos a nos comunicar.