Vamos nos colocar de acordo sobre a terminologia, antes de mais nada.
Tática diz respeito à orientação política em determinada conjuntura, com objetivos circunscritos naquele momento.
Estratégia remete ao longo prazo, a um objetivo estruturante, cujo centro é sempre a questão do poder político, que somente pode ser alcançado através de sucessivos movimentos táticos, nas mais variadas conjunturas, que permitam às forças populares construírem hegemonia sobre o Estado e a sociedade.
Quando a esquerda tem apenas estratégia e é incapaz de compreender realidades concretas, formulando as táticas correspondentes, normalmente tende a substituir o acionar político, a construção de força real, por um vago discurso acerca de ideais revolucionários, descolado do povo por incapaz de apresentar caminhos que possam ser viáveis e compreendidos pelas massas como a solução de seus problemas reais.
Mas quando a tática não está inserida e centralizada por uma estratégia de poder, até quando dá certo pode dar tudo errado.
Um exemplo? A conquista do governo nacional, com um programa que enfrente a miséria, mas não é acompanhada por um esforço concentrado de politização e organização – cuja necessidade não provém de demandas da realidade, mas de um imperativo da estratégia -, pode levar à ascensão social de milhões e jogá-los diretamente ao domínio de valores e concepções que correspondem à reprodução da ordem capitalista.
O objetivo tático, nesse caso, é alcançado, mas provoca regressão estratégica e sua valia na acumulação de forças é nula, ou até negativa.
O caso histórico mais notório de sucesso tático e fracasso estratégico, na esquerda brasileira, é o velho PCB durante a luta contra a ditadura.
Os comunistas tinham razão na política de frente democrática – isso é, da união de todas as forças que estavam contra o regime militar -, mas ao concebê-la sem ter como princípio reitor a hegemonia e a independência da classe trabalhadora, com seu próprio programa, a vitória dessa tática reforçou o acaso do próprio partido, por colocá-lo em um papel subalterno à oposição liberal-burguesa e desidratar completamente sua identidade de classe.
Esse descolamento da tática em relação à estratégia tem sido, nos últimos anos, o desvio mais nefasto às forças progressistas.
A história é farta de casos nos quais, quando a necessária flexibilidade tática não está acompanhada por rigor estratégico, os partidos populares acabam por se transformar em apêndice de alguma fração das classes dominantes, satisfazendo-se com pequenos avanços e abdicando de sua missão histórica.
(*) Texto publicado originalmente no Facebook do autor.