Opera Mundi publica, nesta quarta-feira (13/11), o último da série de três artigos sobre os Brics, cuja reunião de cúpula se inicia hoje em Brasília. Neste texto, o cônsul-geral da Rússia em São Paulo, Yury Lezgintsev, fala sobre os interesses do bloco perante o resto do mundo. Na terça (12/11), tratou-se do Banco dos Brics; na segunda (11/11), sobre a prioridade econômica dos cinco países integrantes (Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul).
Os Brics são um exemplo brilhante de fortalecimento de ações conjuntas nos assuntos internacionais. Os cinco países, diferentes um do outro em termos da sua cultura e história, constroem as suas relações com base em igualdade, consideração inalienável pelos interesses dos seus parceiros, respeito mútuo e abertura ao mundo.
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Nas atividades dos Brics, não há nada que possa ser interpretado como ação contra alguém ou algo. Os Brics não visam desempenhar um papel de contrapeso geopolítico, mas sempre advogam uma agenda positiva e construtiva. A parceria no âmbito dos Brics se desenvolve no interesse da estabilidade e segurança global, do aumento de investimentos. É essa parceria que permite, por meio de ações conjuntas, encontrar as maneiras de promover a ordem mundial mais segura e justa, avançar uma agenda unificadora, baseada na Carta da ONU. Em relativamente curto tempo (passaram-se 10 anos desde a data da fundação do agrupamento) os Brics conseguiram se tornar um fator influente na vida política e econômica global, o que reflete a tendência objetiva para formação do sistema multipolar em relações internacionais, fortalecimento da interdependência e complementaridade econômica.
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A ideia para criação da associação foi a parte russa. A primeira reunião ministerial do então Bric foi realizada sob proposta do presidente Vladmir Putin em 20 de setembro de 2006, às margens da sessão da Assembleia Geral da ONU em Nova York. Estiveram presentes os ministros das Relações Exteriores da Rússia, Brasil, China e o ministro da Defesa da Índia, que concordaram em desenvolver uma cooperação multifacetada em formato de quatro partes.
A primeira cúpula do Bric em formato integral foi realizada em 16 de junho de 2009 em Yekaterimburgo. Como resultado da reunião, foi adotada uma Declaração Conjunta dos Líderes, que fixou o foco no desenvolvimento entre os estados associados, “diálogo e cooperação consistente, ativo, pragmático, aberto e transparente”, que não servem apenas aos “interesses comuns dos países com economias de mercado em formação e países em desenvolvimento, mas também para a construção de um mundo no qual sejam asseguradas a paz duradoura e prosperidade comum”. O documento delineou a visão comum dos parceiros do Bric sobre maneiras de tirar a economia mundial da crise financeira e econômica.
Com o ingresso da República da África do Sul como membro, a abreviação Brics foi estabelecida (a primeira cúpula com a participação da África do Sul foi realizada em 14 de abril de 2011 em Sanya, China). A influência dos Brics no cenário internacional baseia-se no crescente poder econômico dos Estados participantes, em sua importância como uma das principais forças motrizes para o desenvolvimento da economia global, uma população significativa e a disponibilidade de ricos recursos naturais.
As relações entre os parceiros dos Brics são construídas com base na Carta das Nações Unidas, no direito internacional e em princípios como abertura, pragmatismo, solidariedade. Não há um caráter de bloco ou orientação contra terceiros. Nos últimos anos, os Brics se estabeleceram como uma parceria estratégica multidisciplinar que se desenvolve em três áreas principais: de política e segurança; economia, finanças e cultura; e relações humanitárias. A associação realiza uma rotação anual de sua presidência.
O funcionamento dos Brics é baseado nos Planos de Ação adotados nas cúpulas anuais planejadas (a ultima aconteceu em 2018 na África do Sul). As principais decisões são registradas nas declarações dos líderes e adotadas por consenso.
Divulgação/Brics
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A influência política dos Brics é determinada pelo fato de os Estados-membros serem participantes nas principais estruturas internacionais (ONU, G20, OMC, Movimento Não-Alinhado, G77), além de associações regionais (Organização do Tratado de Segurança Coletiva, União Econômica da Eurásia, Organização de Cooperação de Xangai, Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, Associação de Cooperação Regional do Sul da Ásia, Iniciativa dos Países do Golfo de Bengala para Cooperação Técnico-Econômica Diversificada, Mercosul, União Africana, Sociedade para o Desenvolvimento do Sul da África etc.).
Na parte econômica, os Cinco representam cerca de 27% do PIB global (em termos de paridade do poder de compra das moedas nacionais; em 2018, o Brics superou o G7 em termos de valor – US$ 44 trilhões). A população combinada é de 2,88 bilhões de pessoas – 42% da população mundial, com territórios que abrangem 26% da superfície do planeta. O formato de interação entre os estados-membros dos Brics também inclui reuniões anuais de líderes às margens das cúpulas do G20 (a ultima foi em Osaka, neste ano), uma reunião de altos representantes encarregados de questões de segurança (pela Rússia, participa o Secretario do Conselho de Segurança da Federação Russa, N. P. Patrushev), reuniões de ministros das Relações Exteriores (em formato integral e às margens da sessão da Assembleia Geral da ONU), ministros das Finanças e líderes dos Bancos Centrais, chefes de outros ministérios e departamentos da indústria, reuniões de grupos de trabalho sobre cooperação em vários campos.
A última reunião dos ministros de Relações Exteriores se realizou em julho deste ano no Rio de Janeiro. A interação está se desenvolvendo também entre as administrações das cidades, empresas, círculos acadêmicos, científicos e sociedade civil.
Uma prioridade importante das atividades dos Brics é a promoção da segurança e estabilidade no mundo. Os estados-membros dos Brics, cujas abordagens para os principais problemas globais e regionais são próximos ou coincidem, partem do fato de que a estabilidade deve ser forte, e a segurança, indivisível, com base em garantias firmes. Os cinco países prestam muita atenção às tarefas de combater conjuntamente os desafios e ameaças globais. Eles estão unidos por um entendimento comum de que só é possível lidar efetivamente com a ameaça terrorista baseando-se nos princípios e normas do direito internacional e combinando os esforços de toda a comunidade mundial. A mesma abordagem requer a luta contra o crime organizado transnacional, tráfico de drogas, corrupção, a busca de soluções para muitos outros problemas agudos e crises, incluindo resolução de conflitos e segurança internacional da informação (a Rússia está buscando um acordo intergovernamental de cinco lados nessa área).
Os Cinco sempre se opuseram fortemente a padrões duplos, intervenções militares, interferência em assuntos internos, medidas coercitivas econômicas unilaterais e protecionismo. Em meio à crescente instabilidade nos assuntos mundiais e à imprevisibilidade do comportamento de líderes de certos países ocidentais, que, recorrendo a métodos inescrupulosos de competição e, buscando objetivos imediatos, métodos geopolíticos ilegítimos, incluindo sanções unilaterais e intervenções militares, tentam fortalecer sua liderança global e impedir o crescimento da influência de novos centros da política internacional e economia, os Cinco defendem consistentemente a necessidade de cumprir normas uniformes e compreensíveis para todas as regras do jogo, baseadas no direito internacional e na Carta das Nações Unidas.
(*) Yury Lezgintsev é doutor em ciências econômicas pela Academia de Economia e Serviço Público da Rússia e atual cônsul-geral da Rússia em São Paulo. Já serviu no Peru, nos Estados Unidos, na Venezuela e no Chile. Apoio: Sputnik Cultural