Vandalismo seria a palavra da semana se alguma instituição editorial resolvesse inventar esse certame assim como há a tradicional escolha das palavras do ano.
Apesar de provavelmente injusta, porque não há nenhuma evidência histórica de que a tribo germânica dos vândalos fosse mais cruel e violenta que seus vizinhos e rivais alanos, godos ou visigodos, a palavra está consagrada com o sentido de “ação de destruir ou danificar intencionalmente propriedade alheia, pública ou privada, sem motivo aparente ou com o propósito de causar ruína.”
Duas imagens, ambas tragicômica, a invocaram com força nesta semana: a invasão do Congresso norte-americano por imbecis fantasiados sob a inspiração de Donald Trump, no dia em que se formalizava de maneira inapelável sua derrota e o contorcionismo do capitão genocida no dia em que o Instituto Butantan divulgou o alto grau de eficácia da vacina Coronovac, produzida pelo centenário centro de pesquisa.
O episódio de Buffalo Bill sentado na cadeira presidencial da Câmara seria apenas cômico se não fossem os cinco mortos, dezenas de feridos e as sequelas ainda não mensuráveis na saúde das instituições democráticas norte-americanas, até aqui tidas por muitos como exemplares e inexpugnáveis.
O contorcionismo “eu disse, mas não disse” da marionete que generais e capitalistas colocaram no Planalto seria apenas mais um exemplo da inesgotável fonte de memes que a equipe de redatores produz, de maneira competente, há que reconhecer, para distrair a atenção das torcidas, se não fossem os 200 mil mortos.
White House
Duas imagens invocaram nesta semana: invasão do Congresso dos EUA e o contorcionismo de Bolsonaro em relação à eficácia da vacina Coronovac
200 mil mortos! De maneira totalmente estúpida e desnecessária. Porque a luta diária e incessante do desgoverno federal não melhorou a economia, com exceção da renda dos bilionários. Porque quando o mundo fala em segunda onda de contaminação mal saímos da primeira. Porque o salto nos números de contaminações e mortes decorrente das “confraternizações” de fim de ano mal começaram a se manifestar.
Agora, o capitão, seu general amestrado e seu alter ego engomado vão se embrenhar na disputa da primeira foto. E não importa se mais alguns milhares de brasileiros morrerem por isso.
Quando cada um de nós tomar a vacina deve se lembrar de que o deve exclusivamente aos técnicos, cientistas e pesquisadores do Butantan, à rede paulista de suporte ao desenvolvimento e testagem e ao SUS.
Afinal eles não sobreviveram apenas à disputa entre a versão tosca e a engomada do fascismo à brasileira. Sobreviveram historicamente, assim como as universidades estaduais, à asfixia financeira e burocrática dos sucessivos governos tucanos do estado de São Paulo, de Serra a Alckmin, de Alckmin a Dória. Como as instituições federais vem sobrevivendo aos ataques do genocida.
Se vandalismo é definido “pelo propósito de causar ruína”, então esses são os verdadeiros vândalos.
(*) Carlos Ferreira Martins ´é professor titular do IAU USP São Carlos.