Após polêmicas, debates acalorados nas tribunas e mobilizações contrárias de educadores nas ruas, o prefeito Bruno Covas (PSDB) conseguiu aprovar na Câmara Municipal o Projeto de Lei nº 452/2020. O enunciado versava sobre o retorno às aulas presenciais.
O seu teor, porém, não trouxe uma linha sobres as necessárias ações sanitárias e preventivas para reabrir as escolas. Numa decisão de tal envergadura, eram de se esperar protocolos para evitar que as escolas abertas se transformem em novos focos de propagação da covid-19.
Mas o projeto aprovado pela base de apoio do prefeito serviu de carona para implantar medidas que sucateiam o ensino e privatizam a educação infantil. Uma delas é a compra de vagas na rede privada com a terceirização das EMEIs (Escolas Municipais de Educação Infantil).
Com isso, através de vales fornecidos aos alunos, os chamados “vouchers”, será destinada verba pública para iniciativa privada atender uma porcentagem de crianças no teto de 5% das vagas diretas.
Especialistas já fizeram cálculos rápidos. Para o índice de 5%, que corresponde a 11.500 vagas, ao custo de R$ 900 por aluno, o montante a ser pago para a rede de ensino particular será de R$ 134 milhões anuais.
Não é um número desprezível. Com R$ 134 milhões é possível construir 30 creches com padrão para atendimento de 120 crianças em cada unidade. Esse seria o caminho para valorizar a educação pública e até mesmo o próprio patrimônio municipal.
Flickr/Governo do Estado de São Paulo
Em ano eleitoral, gestão Covas consegue aprovar compra de vagas na rede de ensino privada para alunos da educação infantil
O PL aprovado ainda afronta o direito constitucional quanto aos cargos públicos a serem preenchidos por meio de concursos de provas e títulos. Segundo o projeto, serão contratados professores e funcionários, ignorando os aprovados em concursos. Dos 5.801 professores de educação infantil foram chamados pouco mais de mil. O prazo termina em dezembro deste ano.
Em vez de aplicar os recursos na reforma das escolas para o retorno seguro em 2021, atendendo as exigências de saúde e evitar contágios, a gestão Covas prefere transferi-los para a iniciativa privada.
Mesmo que depois desista de reabrir as escolas, a gestão tucana terá avançado várias casas no jogo de xadrez. E assim como na dita “reforma previdenciária”, saiu de novo na vanguarda em relação ao governo federal e mostra inovações na política econômica de estado mínimo. A realidade é que com a aplicação dos chamados “vouchers” inaugura-se uma nova etapa nesse processo.
Os movimentos de saúde devem ficar atentos. Em Brasília já começaram. No Congresso Nacional, as especulações e balões de ensaios estão sendo lançados na mídia para o “voucher” ingressar também no Sistema Único de Saúde (SUS), outrora tão criticado, mas reconhecido hoje como estratégico nestes tempos sombrios de pandemia.
*Juliana Cardoso é vereadora (PT), vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, Adolescente e Juventude e membro das Comissões de Saúde e de Direitos Humanos da Câmara Municipal de São Paulo.