Na manhã do sábado (07/03), numa base aérea em Boa Vista, a caminho de Miami, Jair Bolsonaro fez a mais arriscada aposta e o maior ataque à democracia dentre todos os impropérios lançados em seus 15 meses de governo. Num discurso canhestro – repita-se, a caminho dos Estados Unidos -, incentivou seus apoiadores a engrossarem as marchas golpistas convocadas para o 15 de março. Sublinhe-se: a caminho de um jantar horas depois com Donald Trump, no qual trataria de três coisas: aumentar a pressão sobre a Venezuela, vergar-se à negativa estadunidense para a entrada da China na concorrência do 5G e subordinar toda a área de Defesa do Brasil aos desígnios do Departamento de Defesa do Império.
Sublinhe-se. Destaque-se. Aponte-se. Alerte-se.
O QUE TERIA FEITO o presidente brasileiro mudar subitamente de ideia sobre a intentona golpista? Nos dias anteriores, ele negou repetidas vezes estar convocando alguma coisa.
Apesar das más notícias no front interno, a começar pelo piblinho de 2019 e da saída de recorde de US$ 44 bilhões de dólares do país desde o início do ano, Bolsonaro foi à Fiesp na quinta (05/03) para um encontro especial. Lá obteve apoio de 38 dirigentes de grandes empresas, 19 estrangeiras e nenhuma de mídia. Em live realizada na mesma noite, garantiu que “Paulo Guedes explicou tudo sobre o bom momento da economia brasileira”. Pode-se inferir daí que o capital está com Bolsonaro.
Alan Santos/PR
Bolsonaro com a primeira-dama Michele e o pintor Romero Brito: presidente dobrou a aposta do golpe
Novamente, sublinhe-se a última frase.
BOLSONARO É APOIADO por cerca de 30% do eleitorado, conforme atestam pesquisas recentes. Não mentiu para essa gente em campanha e não cometeu estelionato eleitoral. Aqui na terra estão jogando futebol, tem muito choro, muito samba e roquenról. Mas a economia derrete, os serviços públicos se sucateiam e ninguém sabe o dia de amanhã.
Refaçamos a pergunta: o que levou Bolsonaro a mudar de ideia sobre a marcha? É bem possível que esses dois fatores – Trump e empresariado – o tenham animado a chutar o balde para ver no que dá. Se as marchas forem fracas, sempre se poderá voltar atrás, mandar bananas para a mídia e perguntar “Golpe? O que é golpe?”, como fez às portas do Palácio ao comentar o PIB.
A GRANDE MÍDIA até a tarde de domingo (08/03) estava pasmada. A Folha de S. Paulo foi desconvidada para o ágape em Miami e lançou nota chorosa e reclamona. O Estadão chegou ao cúmulo de encomendar nota de apoio à senda golpista a um de seus colunistas amestrados. O Jornal Nacional mal tocou no assunto.
Depois de incentivar abertamente o motim policial no Ceará, Bolsonaro quer um motim nacional. Seus cães hidrófobos estão à solta, a começar por Augusto Heleno, o carrasco de Porto Príncipe, e Aginaldo Zambelli, comandante da Força Nacional.
UMA SEMANA INTEIRA nos separa do dia 15. Espera-se da oposição carga pesada contra a convocação oficial do caos. Tenho sérias dúvidas se competir com o fascismo para ver quem coloca mais gente nas ruas é um bom caminho. Mais do que nunca, uma coisa deve ser uma coisa e outra coisa deve ser outra coisa.
P. S. Um golpe com fechamento do Congresso e do STF – um novo AI-5 – tem poucas chances de dar certo. Mas na nova maneira de exercer o poder – com sua governabilidade de choque -, Bolsonaro pode acelerar e muito o desmonte do Estado.