Há apenas alguns dias da posse do presidente Lula, dois episódios marcaram a agenda nacional e internacional para dois grandes problemas que o Brasil vive hoje. Um deles, os constantes ataques à democracia, tendo culminado no mais grave, com o ataque aos prédios dos Três Poderes em Brasília no último dia 8 de janeiro. O outro, as terríveis imagens da calamidade que vive hoje o povo Yanomami, vítima tanto da exploração mineradora da área onde vivem quanto do descanso do governo Bolsonaro.
Dois problemas que foram centrais e deram o tom da conversa no encontro entre o presidente norte-americano Joe Biden e Lula ocorrido na última sexta-feira (10/02) em atenção a um convite feito pelo chefe de Estados dos EUA no alvorecer da terceira gestão do petista.
O clima em Washington estava ameno para essa época do ano, quando o termômetro costuma marcar temperaturas negativas e a neve faz suas últimas aparições no hemisfério norte. Dessa vez, o sol resolveu brilhar e os abrigos pesados deram lugar a roupas mais leves. O encontro entre o mandatário democrata e o presidente brasileiro também poderia ser descrito como um raio de sol que tenta quebrar o gelo que se formou na relação entre os dois países desde a posse de Biden, em janeiro de 2021.
A recepção se deu em tom de amizade, com Biden quebrando protocolos e conduzindo Janja da Silva, primeira-dama brasileira, em uma espécie de abraço ao coração da Casa Branca, Lula ao lado, sorridente, relaxado. Nem o idioma foi capaz de quebrar o “clima” que havia entre os dois, algo muito diferente do que aconteceu na Cúpula das Américas em junho de 2022, quando Biden e Jair Bolsonaro mal trocaram olhares.
Uma reunião bilateral que era para ter durado 15 minutos e durou 50, seguida de uma reunião de trabalho conjunta que também excedeu o tempo previsto, deixando os mais de 40 jornalistas que cobriam a ocasião esperando ao relento de uma tarde que já aos poucos foi se fazendo fria. O clima era parecido no interior da Casa Branca, já não tão ensolarado como nos primeiros anúncios da visita em que as duas maiores democracias do mundo, em termos de população, renovaram seus votos de lutar juntas contra os mais importantes ataques sofridos ultimamente: invasão do Capitólio e vandalização dos prédios institucionais em Brasília.
Um sorriso amarelo, que fez com o presidente Lula confirmasse a participação dos Estados Unidos no Fundo Amazônia na coletiva após a conversa que selou a negociação. “O que posso dizer é que ele [Biden] vai participar do Fundo Amazônico”, disse o petista, sem especificar o valor que acabou ficando bem abaixo do esperado, mas que foi tomado como um acesso de parceria na luta para que os países desenvolvidos também contribuam com o fundo.
O presidente brasileiro pediu ainda para que os países ricos ajudem aqueles “países que têm floresta”, como os demais latino-americanos possuidores de território amazônico, possam trabalhar no combate ao desmatamento. Lula reiterou seu objetivo de chegar a 2030 com desmatamento zero na Amazônia.
Ricardo Stuckert/PR
Lula visitou Washington neste final de semana e se encontrou com Joe Biden na Casa Branca
Além dos U$50 milhões destinados ao fundo, do qual Alemanha e Noruega fazem parte com doações muito mais generosas, mas que foram feridas desde seu congelamento durante a gestão Bolsonaro, o Brasil espera com ansiedade outro gesto surja da visita do enviado especial para o clima do presidente Biden a acontecer no final deste mês.
Falando de outros membros do governo que já tentaram ocupar a ala oeste da Casa Branca, o senador democrata Bernie Sanders fez uma demorada visita a Lula na residência diplomática conhecida como Blair House. Acompanhado por outros legisladores progressistas, como Alexandria Ocasio-Cortez, Sanders aproveitou o encontro para reforçar seus laços com este bastião da esquerda democrática como Lula é considerado pelos liberais do norte.
Na saída da Blair House, Sanders, além de ter que pedir silêncio a manifestantes bolsonaristas para poder falar aos jornalistas, pediu também que não só Brasil e Estados Unidos sigam lutando por mais justiça social, combatendo o discurso de ódio e defendendo a democracia, mas que isso possa ser uma tarefa de todo o mundo.
“O presidente e eu falamos sobre a necessidade de fortalecer os fundamentos democráticos não apenas no Brasil, não apenas nos Estados Unidos, mas ao longo de todo o mundo porque há uma ameaça massiva de extrema direita autoritária como [Donald] Trump ou Bolsonaro que tentam minar a democracia. E o nosso trabalho é fortalecer a democracia no Brasil, fortalecer a democracia nos Estados Unidos e em todo mundo”, disse o Senador.
Como não poderia deixar de ser, no menu do dia também esteve a postura do Brasil com relação à Ucrânia, que, seguiu reiterando que advoga pela paz, Lula até propôs a criação de um clube da paz, formado por países como Brasil, China e Índia, para negociar o fim do conflito em Kiev, e da negação em colaborar com munição e armamento.
Mas, não teve jeito, e o governo brasileiro acabou cedendo à pressão norte-americana e tomando um tom alguns decibéis acima em sua postura com relação à ofensiva russa.
A relação diplomática entre Estados Unidos e Brasil completa 200 anos em 2024, ano eleitoral para os norte-americanos e parece não haver um presente mais almejado por ambos para coroar a data do que a possibilidade de que este pleito ocorra sob a mais amena tranquilidade.