A América do Sul continua sendo a região mais afetada pela pandemia, com a maior taxa de mortalidade por covid-19 durante o mês de junho: uma média de 2.207 falecidos a cada milhão de habitantes, de acordo com o site Our World in Data.
A região reúne cerca de 8% da população mundial e 1/3 do total de óbitos por covid-19 do globo.
segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), desde o início da pandemia, 1,16 milhão de pessoas morreram pela doença no continente americano. Somente na última semana houve 1,1 milhão de novos casos e 31 mil novas mortes.
O subcontinente latino-americano nunca saiu do ranking dos dez mais afetados pela pandemia, tanto em número de casos, como em número de mortos. Analisando a taxa de letalidade em comparação com a população, o Peru lidera com 5.740 falecidos pelo novo coronavírus a cada grupo de milhão de habitantes.
Nesse índice, o Brasil é o 9º da lista, com 2.308 mortos por milhão de habitantes, mas o segundo em números absolutos, somando 493.693 falecidos por covid-19, atrás somente dos Estados Unidos.
“Não é uma surpresa que a América Latina seja a região mais afetada, porque somos o continente mais desigual do mundo e as comunidades mais afetadas pela covid-19 são as comunidades mais vulneráveis: com menos acesso à saúde, com mais comorbidades, com menos possibilidades de estar ao ar livre, com mais superlotação nas residências e com menores salários. Você não pode se auto isolar se depende do trabalho informal, que é a modalidade predominante na região”, analisa Gonzalo Bacigalupe, psicólogo e pesquisador da Escola de Educação e Desenvolvimento Humano da Universidade de Massachusetts.
O agravamento da pandemia acompanha dados que evidenciam a concentração de vacinas. De acordo com a OMS, foram aplicadas 2,3 bilhões de doses em todo o planeta, uma média de 33 milhões aplicadas diariamente.
Isso significa que cerca de 20% da população mundial recebeu a primeira dose do imunizante, mas apenas 0,8% estão em países pobres.
A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) reconhece que a falta de imunizantes na região é o principal fator para que a América Latina continue sendo o epicentro da pandemia.
“Em toda a região a vacinação é mais lenta que o necessário. Isso acontece principalmente pela reserva de mercado das vacinas, como todos nós já sabemos. Precisamos avançar na vacinação dos mais vulneráveis, mas para isso faltam doses”, afirmou o assistente diretor da Opas, Jarbas Barbosa.
Alta vacinação e alta taxa de contágios
Com o surgimento de novas cepas e escassas medidas de isolamento social, o avanço da vacinação, na maioria dos países, não foi suficiente para conter o avanço do vírus.
A Organização Mundial da Saúde alerta para a letalidade da variante c-37, presente em 80% dos casos no Peru, 37% dos contaminados na Argentina, e presente em 29 países do mundo. Assim como a P1, conhecida como cepa brasileira, responsável por desatar uma segunda onda de contágios na América Latina.
O Chile é o país que mais vacinou na região, com 20 milhões de doses aplicadas. Porém, no dia 16 de junho, o país bateu um recorde de pacientes com mais de 70 anos internados em unidades de tratamento intensivo (UTIs).
O Ministro de Saúde chileno, Enrique Paris, afirmou em março que em 30 de junho o país sentiria o efeito da imunização de rebanho, alcançada através da vacinação. No entanto, faltando duas semanas para a data prevista, o país atravessa uma terceira onda de contágios e registra 1,4 milhão de casos e 30.865 falecidos pela covid-19.
Valdo Leão / Semcom
América do Sul reúne cerca de 8% da população mundial e 1/3 do total de óbitos por covid-19 do globo
“Assim que iniciou a vacinação também suspenderam as medidas sanitárias de maneira muito drástica. Foram distribuídos cartões de circulação. Então as pessoas entenderam que todos os vacinados já estavam livres”, afirma a enfermeira e fundadora da Sociedade Chilena de Saúde Familiar e Comunitária (Sochienfa), Dennisse Brito.
Além da volta às aulas, determinadas atividades econômicas vinculadas ao extrativismo e à pesca, motores da economia chilena, nunca foram suspensas, mantendo altas taxas de mobilidade nacional.
“A vacina num lugar que não faz prevenção estará destinada a falhar, porque surgem as variantes e sequer conseguirá ter o efeito de evitar mortes”, alerta Bacigalupe.
O segundo do ranking de imunização é o Uruguai, que já vacinou 3.428.143 milhão com pelo menos uma dose, equivalente a 97% da população, continua com as internações e letalidade em ascensão. O país acumula 343 mil infectados e 5.089 falecidos pelo vírus sars-cov2, de acordo com dados da OMS.
No último mês dobrou a letalidade da doença entre os uruguaios de 18 a 49 anos, mantendo uma média de 200 óbitos diários.
O governo uruguaio, assim como o chileno, retomou as aulas presenciais assim que iniciou a vacinação entre os professores, e suspendeu a quarentena a nível nacional. A ciência mostra que o problema certamente não é a efetividade das vacinas, mas a falta de outras medidas de prevenção.
“Todos os estudos mostram que as pessoas que estão vacinadas têm menos riscos de ter um quadro grave ou até mesmo morrer”, ressalta Dennisse Brito.
A procura por mais vacinas
Na última cúpula do G7, as maiores potências econômicas ocidentais prometeram a doação de 1 bilhão de doses às nações mais vulneráveis. A diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Carissa Etienne, pediu ao grupo dos sete que acelerem as doações à América Latina.
“Precisamos das vacinas. Hoje menos de uma a cada dez pessoas da América Latina e Caribe foram imunizadas contra a covid-19. No entanto, somos uma região com mais de 600 milhões de pessoas com casos que seguem aumentando, hospitais lotados e variantes circulando rapidamente. Por isso, também necessitamos aumentar nossa capacidade de produção”, afirmou a diretora da Opas, em conferência de imprensa na última quarta-feira (16/06).
Entre junho e julho, os países latino-americanos devem receber um novo carregamento do consórcio Covax. O fundo recebeu mais US$ 2,4 bilhões para adquirir 1800 doses. Até o final de maio o programa da OMS havia distribuído 77 milhões de doses a 127 nações. O maior beneficiário foi o Brasil com 5 milhões de doses, seguido do México com 3,3 milhões e Colômbia com 1,8 milhão de imunizantes.
O país é o 4º no ranking mundial com 81,5 milhões de doses administradas, o que representa 11% da população nacional, mas apenas 23,9 milhões receberam as duas doses.
Por outro lado, ainda está em discussão se a Venezuela conseguirá receber seu primeiro lote, já que parte do pagamento foi bloqueado pelo banco suíço UBS.
Enquanto isso, os Estados Unidos tiveram que descartar 60 milhões de doses da fórmula da Pfizer que iriam perder a validade e não haviam sido aplicadas. Porém isso não impediu Washington de manter sua política de reserva de mercado e já comprou mais 200 milhões de doses da Astrazeneca / Moderna para abastecera demanda nacional em 2022.
Apesar do discurso, a conta não fecha. Os Estados Unidos possuem 328,2 milhões de habitantes, dos quais pouco mais de 312 milhões foram vacinados, faltando imunizar cerca de 15,3 milhões.
(*) Com reportagem de Michele de Mello, no Brasil de Fato.