O Tribunal de El Salvador condenou uma mulher a 50 anos de prisão após ela ter sofrido um aborto espontâneo. A emergência obstétrica foi interpretada pela Justiça salvadorenha como crime, tendo sua decisão emitida na última quarta-feira (29/06) e veiculada na segunda-feira (04/07).
Com a condenação, a mulher, cujo primeiro nome é Lesli [sobrenome não divulgado] foi atribuída à primeira pena máxima desde que o aborto foi absolutamente criminalizado em El Salvador, em 1998.
“As mães são a fonte de proteção para as crianças em qualquer circunstância da vida e você não foi”, afirmou o juiz responsável pela condenação de Lesli.
De acordo com o Grupo Cidadão para a Descriminalização do Aborto em El Salvador, Lesli tinha 19 anos quando sofreu o aborto espontâneo em 17 de junho de 2020. Na época, após sentir-se mal, entrou em trabalho de parto sem perceber. A emergência médica fez com que ela precisasse de três transfusões de sangue.
#ElSalvador condenó a 50 años de prisión a una joven que a sus 19 años enfrentó una emergencia obstétrica.
Condenamos este fallo y reiteramos: seguiremos luchando para q' ninguna mujer que enfrente emergencias de salud durante el embarazo sea condenada?https://t.co/OHlkA5xuaP pic.twitter.com/yyOsX6IKtk
— Agrupación Ciudadana #ManuelaJusticiaYEsperanza (@AbortoPORlaVIDA) July 4, 2022
A primeira audiência sobre o caso de Leslie ocorreu em 26 de junho de 2020, a qual a jovem não pode estar presente devido a complicações médicas. Segundo o Grupo Cidadão, que luta para que os direitos de Leslie e outras mulheres salvadorenhas sejam garantidos, nessa primeira audiência, o juiz ordenou uma investigação formal com prisão provisória.
O Grupo Cidadão também afirmou que o advogado da jovem apresentou o laudo de Medicina Legal, que evidenciou a violência de gênero que ela sofria, no entanto, o juiz recusou-se a incluir as provas no parecer final.
Twitter/Agrupación Ciudadana
El Salvador é um dos países latino-americanos que tem uma das legislações mais duras sobre aborto e direitos reprodutivos
A organização também disse que vai recorrer da decisão por ser um sinal de “crueldade do Ministério Público contra mulheres empobrecidas que enfrentam emergências de saúde durante a gravidez”.
Segundo o Grupo Cidadão, a sentença de Leslie “contradiz a recente decisão da Corte Interamericana, onde o Estado salvadorenho foi condenado e ordenado a não perseguir e criminalizar as mulheres que enfrentam emergências obstétricas”.
“Tentamos fechar a página da triste história de El Salvador que condena injustamente mulheres empobrecidas por emergências obstétricas, mas o Estado salvadorenho, mais uma vez, continua sendo cruel com as mulheres que não tiveram os direitos ou condições para se defender”, afirmou Morena Herrera, diretora do Grupo Cidadão.
Aborto criminalizado desde 1998
El Salvador é um dos países latino-americanos que tem uma das legislações mais duras sobre aborto e direitos reprodutivos.
Mulheres salvadorenhas podem ser presas por emergências obstétricas e abortos espontâneos acusadas de homicídio por serem suspeitas de terem induzido o aborto. Em muitos casos, como o de Leslie, as mulheres são direcionadas para o processo judicial mesmo antes de seus estados de saúde estarem estáveis – muitas vezes os próprios hospitais fazem as denúncias.
Segundo a legislação do país, desde 1998 o aborto é totalmente criminalizado no país, mesmo em casos de estupro, má-formação fetal ou risco de saúde para a mulher.
Nicarágua, Honduras e República Dominicana são outros países da América Latina que também proíbem o aborto e o constituem como crime, sem exceção.
(*) Com Telesur