A expectativa para o 8M este ano era alta: em 2021, a tradicional marcha das mulheres havia sido barrada pelo governo de Madri sob o pretexto da pandemia — o mesmo governo, porém, permitiu, um dia antes, a realização do protesto do grupo fascista La Falange. Na ocasião, mesmo de forma não autorizada, cerca de 120 mil mulheres foram às ruas da capital espanhola. Ainda assim, tratava-se da menor participação em anos.
Por isso, esperava-se que em 2022 o cenário fosse diferente. Dois dias antes desta terça-feira (08/02), contudo, os dois principais movimentos responsáveis pela convocação e organização da manifestação, o Movimento Feminista de Madri e a Comissão do 8M, anunciaram que marchariam separados, devido a discordâncias ideológicas.
O Movimento Feminista de Madri convocou uma manifestação com o lema “O feminismo é abolicionista”. As reivindicações passavam pela abolição da prostituição e das “barrigas de aluguel”, indo até a abolição da recém-aprovada Lei Trans e a demissão da ministra da Igualdade, Irene Montero — estes últimos, os ponto de divergência com a Comissão 8M.
A Lei Trans, considerada uma vitória para a população LGBTQIA+, permite a livre autodeterminação de gênero a partir dos 14 anos, inclusive em documentos de identificação, dispensando a necessidade de laudos médicos ou comprovação de tratamento hormonal, como era o caso até então.
Um setor do movimento feminista, porém, alega que a lei seria misógina e enfraqueceria as políticas públicas de combate à discriminação de gênero. A comunidade LGBTQIA+ aponta transfobia no argumento deste setor.
De acordo com o governo de Madri, a manifestação “O feminismo é abolicionista”, organizada pelo Movimento, reuniu aproximadamente 3.000 mulheres. As organizadoras, porém, falam em 5.000.
Direitos para todas, todos os dias
Já a manifestação convocada pela Comissão do 8M reuniu cerca de 50 mil pessoas, segundo os dados oficiais, ainda que a organização tenha contabilizado pelo menos 100 mil. O lema era “Direitos para todas, todos os dias” e o clima, mesmo que de luta, era de festa, com a presença de diferentes organizações LGBT, feministas, sindicatos, partidos políticos da esquerda espanhola, entre outras.
Camila Alvarenga/Opera Mundi
Manifestações pelo 8M em Madri racharam movimento feminista
“Irmã, eu sim acredito em você”, “Sozinha, bêbada, quero chegar em casa” e “[Santiago] Abascal [presidente do partido de extrema-direita Vox] é um criminoso” eram algumas das frases cantadas pelas manifestantes, que reivindicavam pautas mais amplas, abarcando desde o assédio e o estupro, até pautas anticapitalistas, anticoloniais, antirracistas abolicionistas e mesmo anti-imperialistas.
A manifestação também incluía um chamamento pelo fim do conflito na Ucrânia. Não houve, porém, nenhuma orientação ou consenso sobre como esse protesto em concreto deveria ocorrer. Via-se, praticamente lado a lado, e espalhados pela marcha, cartazes com frases do tipo “Stop Putin” (Pare Putin) e cartazes de cunho anti-imperialista, pelo fim da interferência da OTAN na Europa.
8M na Europa
Madri não foi a única cidade a registrar manifestações a favor da igualdade de gênero e pelo fim da violência machista. Outras cidades espanholas, como Santiago de Compostela e Barcelona, assim como importantes capitais europeias, também viram suas ruas tingidas de roxo — e de amarelo e azul, já que quase todos os protestos da noite fizeram referências ao conflito na Ucrânia.
Na Itália, a principal organização feminista “Non una di meno” voltou a convocar a marcha depois de dois anos de suspensão devido à pandemia do coronavírus. Respaldada por diversos sindicatos, passeatas ocorreram em Roma e várias outras localidades, como Milão e Florença.
Em Paris, mais de 30 mil pessoas ocuparam as ruas, também para protestar contra o presidente Emmanuel Macron, pela falta de políticas públicas contra a desigualdade de gênero. Além disso, manifestações alternativas, como uma motociata de mulheres que atravessou 14 cidades francesas, também aconteceram.
Já em Bruxelas, a polícia registrou cerca de 4.800 pessoas que saíram para se manifestar pela igualdade de gênero, fim da violência doméstica e abuso sexual ao som dos gritos de “Meu corpo, minha escolha”, “Chega dessa sociedade”.
No Reino Unido, manifestações pelos direitos das mulheres vêm ocorrendo desde o fim de semana, como foi o caso da marcha em Manchester, no domingo (06/03), que contou até com a participação do prefeito. Nesta terça-feira, os protestos foram convocadas principalmente por sindicatos, que reclamavam contra a diferença salarial e de aposentadorias, além da violência contra a mulher. Em Londres, também ocorreram vários eventos de homenagem às mulheres. Já em Edimburgo, capital da Escócia, ativistas do grupo ecofeminista Women's Climate Strike realizaram uma vigília de 24h para denunciar o impacto que as mudanças climáticas têm sobre as vidas das mulheres.