O ministro Sebastião Reis Júnior é o novo relator do caso do torturador uruguaio-brasileiro Antonio Mato Narbondo, que é julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O ministro assumiu a Presidência da Sexta Turma do STJ, especializada em matéria penal, no final de outubro após a então relatora do caso, ministra Laurita Vaz, se aposentar. Ele conduzirá o caso até o julgamento, que será colocado em pauta na Corte Especial, um colégio formado por 15 ministros.
Ao dar as boas-vindas ao novo presidente, o ministro Antonio Saldanha Palheiro disse que “antes de ser um jurista – na mais verdadeira acepção da palavra –, Sebastião é um humanista”. Antes de entrar para o STJ, em 2011 por indicação da ex-presidente Dilma Rousseff, Sebastião foi advogado da Eletronorte e consultor jurídico do Ministério da Integração Nacional.
O STJ está analisando o pedido feito pela Itália para que Narbondo cumpra sua pena de prisão no Brasil. O ex-coronel do Exército do Uruguai foi condenado pela justiça do país europeu a prisão perpétua em julho de 2021, por participar do assassinato e desaparecimento de quatro cidadãos italianos na Argentina nos anos 1970 e 1980, no âmbito da Operação Condor.
Desde a condenação, a Itália trava uma batalha para que Narbondo cumpra a pena. O país chegou a pedir que ele fosse extraditado, mas a Constituição brasileira proíbe a extradição de seus próprios cidadãos.
O pedido de homologação da sentença italiana para transferência da condenação ao Brasil foi realizado em dezembro do ano passado, como divulgou Opera Mundi com exclusividade. Inicialmente, o processo estava com a ministra Maria Thereza de Assis Moura, a presidente do Tribunal, que deu parecer favorável ao prosseguimento do caso, que foi distribuído por sorteio à ex-ministra Vaz.
O caso estava parado desde 5 de maio, pois Vaz tinha remetido os autos com vista para parecer do Ministério Público Federal (MPF), pois a defesa de Narbondo havia apresentado contestação no começo de abril. Os familiares italianos das vítimas esperam que, com a chegada do ministro Sebastião no caso, o julgamento volte a correr sem tantas pausas.
Arquivo pessoal
Ex-coronel do Exército do Uruguai, Narbondo foi condenado pela justiça do país europeu a prisão perpétua em julho de 2021
Em setembro passado, o ministro participou do “V Encontro do Sistema de Justiça Criminal de Mato Grosso – Efetividade da jurisdição penal”, em Chapada dos Guimarães, e durante a palestra de encerramento falou sobre os advogados que abusam do uso do habeas corpus. “Muitas vezes o advogado usa três HCs contra a mesma questão, e em cada um deles discute uma questão específica. Isso é o caos”, disse.
Coincidência ou não, os advogados de Narbondo antes mesmo de ser condenado em via definitiva na Itália, entraram com dois pedidos de habeas corpus para suspender uma suposta prisão preventiva para fins de extradição, ambos foram negados pelo Supremo Tribunal Federal.
Atualmente o ex-coronel mora em Santana do Livramento, cidade de fronteira com o Uruguai, de onde fugiu após ter sido convocado para depor em um processo no qual é investigado pela morte de um operário em 1972. Narbondo adquiriu, em 2003, a nacionalidade brasileira herdada da mãe, a gaúcha Argélia Narbondo Diaz.
As vítimas de Narbondo
Conhecido como “el Burro” no Uruguai, pela forma brutal em que conduzia seus interrogatórios, o coronel é um dos 14 torturadores (11 uruguaios e três chilenos) condenados pelo tribunal de Roma à prisão perpétua no processo que julgou os crimes contra cidadãos italianos ocorridos durante o período da Operação condor.
A Condor foi uma rede de perseguição, tortura e assassinato de opositores políticos implementada pelas ditaduras do Cone Sul. As vítimas de Narbondo, além de Bernardo Arnone, são Gerardo Gatti, Juan Pablo Recagno Ibarburu e María Emilia Islas Gatti de Zaffaroni.
Os quatro faziam parte de um grupo de 27 uruguaios que militavam no Partido por la Victoria del Pueblo (PVP) e foram sequestrados em Buenos Aires entre o final de setembro e início de outubro de 1976. Assim como Bernardo, os corpos de Gatti, Ibarburu e Zaffaroni nunca foram encontrados.
Narbondo foi reconhecido por ex-presos políticos como um dos algozes que torturavam durante os interrogatórios, mas também por um ex-militar uruguaio que testemunhou que ele integrou parte do Departamento 3, um órgão ligado ao Serviço de Informação de Defesa (SID), do Uruguai. O órgão em questão operava com as inteligências dos países onde atuava a Operação Condor, no Cone Sul.