A justiça britânica declarou, nesta quinta-feira (29/06), que o projeto do governo que prevê o envio a Ruanda dos requerentes de asilo que chegam ao país sem documentos é ilegal. O premiê britânico, Rishi Sunak, disse que vai pedir permissão para recorrer à Corte Suprema.
Três juízes do Tribunal de Apelação de Londres revogaram uma decisão de dezembro, que autorizou a execução do projeto. Eles alegaram que Ruanda não pode ser considerado como um “país seguro”, como defende o governo. “Respeito o tribunal, mas não concordo com suas conclusões. Ruanda é sim um país seguro”, contestou o premiê Rishi Sunak.
“A política do nosso governo é muito simples. É nosso país e o governo que devem decidir quem vem para cá, e não as gangues criminosas”, escreveu em um comunicado. Ele afirmou que faria “tudo o que fosse necessário para aplicar o projeto”.
De acordo com os juízes, o sistema de asilo de Ruanda é deficiente e isso gera um “risco real” de que os refugiados sejam devolvidos ao país de origem e sofram perseguição ou maus-tratos.
“A menos e até que as deficiências de seus procedimentos de asilo sejam corrigidas, a expulsão de solicitantes de asilo para Ruanda será ilegal”, destacou a Corte em um resumo do julgamento. “Qualquer expulsão para Ruanda poderia ser considerada como uma violação do artigo 3 da Convenção Europeia de Direitos Humanos”.
De acordo com os juízes, a decisão “não implica qualquer opinião sobre os méritos políticos ou de outro tipo a respeito desta política”. Eles consideram que “esta é uma questão que cabe exclusivamente ao governo e sobre a qual o tribunal não tem nada a dizer”.
O governo de Ruanda afirmou que discorda da sentença e destacou que, apesar da decisão, “segue comprometido na aplicação do acordo”.
Acordo milionário
No ano passado, o Reino Unido fechou um acordo com o governo ruandês orçado em cerca de € 162,25 milhões. Ele prevê o envio de dezenas de milhares de requerentes de asilo que chegam ao país a Ruanda, a 6.400 km de distância.
A ideia do governo é tornar ilegal os pedidos de asilo das pessoas que chegam sem documentos ao país e enviá-las para países “seguros”.
Wikicommons
Premiê britânico, Rishi Sunak, disse que vai pedir permissão para recorrer à Corte Suprema
O objetivo do premiê britânico é diminuir o fluxo e os custos que envolvem os migrantes que embarcam em direção ao país. Em 2022, mais de 45 mil migrantes atravessaram o canal da Mancha, vindos da França. Em 2023, até agora, mais de 11 mil fizeram a mesma travessia.
A oposição exigiu o fim da política de contenção migratória, que é, segundo os liberais-democratas, “imoral, pouco eficaz e cara para os contribuintes.”
Projeto de lei
O projeto de lei sobre o tema está sendo debatido atualmente no Parlamento. Para convencer os deputados, o governo publicou na terça-feira uma avaliação de seu impacto financeiro que contesta o argumento da oposição.
O custo inicial de transferência de uma pessoa para um terceiro país seria 169.000 libras (R$ 1,02 milhão), mas que seriam economizados entre 106.000 e 165.000 libras (entre R$ 644 mil e R$ 1 milhão) durante quatro anos para cada refugiado que não chega ao território britânico ou é expulso.
O documento admite, no entanto, que estes são números “muito incertos” e que o plano deveria dissuadir 37% do total de migrantes em condição irregular hoje para ser considerado rentável.
Repressão
O projeto, anunciado em 2022 pelo então primeiro-ministro Boris Johnson, foi inicialmente bloqueado pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), o que obrigou o governo a abortar a decolagem do primeiro avião em junho do ano passado.
Desde então, o plano é alvo de uma batalha de recursos judiciais no Reino Unido e, até o momento, nenhum migrante foi deportado.
A Alta Corte de Londres declarou o projeto legal em dezembro, mas o Tribunal de Apelação aceitou um recurso apresentado por 10 solicitantes de asilo – procedentes da Síria, Iraque, Vietnã, Sudão e Albânia – e pela ONG de ajuda aos refugiados Asylum Aid.
Defensores dos direitos humanos acusam Ruanda de reprimir a liberdade de expressão e a oposição.O país é governado com mão de ferro pelo presidente Paul Kagame desde o fim do genocídio de 1994, quando 800.000 pessoas morreram.
Os advogados do ministério do Interior britânico alegaram que o governo confia nas garantias apresentadas por Ruanda, que mostrou o desejo de “cooperar com os mecanismos internacionais de controle”.