Enquanto quatro navios humanitários de resgate a migrantes no Mediterrâneo lutam para um acolhimento do governo italiano, a primeira-ministra do país, Giorgia Meloni, criticou nesta quarta-feira (09/11) a decisão de autoridades sanitárias de permitir o desembarque de centenas de migrantes forçados que estavam em duas embarcações na costa da Sicília.
Os quase 250 deslocados internacionais estavam a bordo das embarcações Geo Barents, dos Médicos Sem Fronteiras, e Humanity 1, da SOS Humanity, e haviam sido impedidos de descer pelo governo italiano. No entanto, após avaliações médicas, o órgão sanitário de Catânia ordenou o desembarque na noite da última terça-feira (08/11).
“Não foi do governo a decisão de deixar os migrantes desembarcarem, definindo-os como 'frágeis' com base em possíveis riscos psicológicos”, disse Meloni em uma assembleia com parlamentares de seu partido, o Irmãos da Itália (FdI), de extrema direita.
“Achamos bizarra essa escolha da autoridade sanitária”, acrescentou a premiê, afirmando que “o governo italiano respeita todas as convenções internacionais”, mas que os indivíduos a bordo das duas embarcações eram “migrantes, e não náufragos”.
Normas internacionais de navegação determinam que pessoas resgatadas em alto mar sejam levadas ao porto seguro mais próximo, que, no caso dos navios Geo Barents e Humanity 1, seria na Itália – mesmo com os impasses impostos pelo governo de Meloni.
Twitter/SOS Humanity
Normas internacionais de navegação determinam que pessoas resgatadas em alto mar sejam levadas ao porto seguro mais próximo
Contudo, a primeira-ministra só permitiu o desembarque das pessoas que necessitavam de atendimento médico imediato e chegou a ordenar que os outros dois navios fossem embora com os migrantes remanescentes.
Outro navio operado por uma ONG, o Ocean Viking, da SOS Méditerranée, foi impedido de atracar na Itália com 234 migrantes e forçado a pedir um porto seguro à França, a centenas de quilômetros de distância. Na ocasião, Meloni agradeceu o país vizinho por “compartilhar a responsabilidade da emergência migratória, que até hoje ficou nas costas da Itália e de poucos outros países”.
Contudo, o porta-voz do governo francês, Olivier Véran, criticou a administração do país diante da crise migratória no Mediterrâneo. “A Itália deve exercer seu papel e respeitar os compromissos europeus. O barco [Ocean Viking] se encontra em águas italianas, existem regras europeias extremamente claras e que foram aceitas pela Itália, que é a principal beneficiária de um mecanismo europeu de solidariedade financeira”.
Ele faz referência a um instrumento da União Europeia que dará quase 200 bilhões de euros à Itália até 2026, entre empréstimos subsidiados e repasses a fundo perdido. “A postura do governo italiano é inaceitável”, acrescentou.
Diante da gravidade da crise, migrantes se jogaram das embarcações na última segunda-feira (07/11). O sírio Youssuf, resgatado pelo navio Geo Barents no fim de outubro, afirmou que estava “enlouquecendo” dentro do navio.
Angustiado com a demora do governo da Itália para autorizar o desembarque, Youssuf se atirou no mar com outro homem para tentar nadar até terra firme – um terceiro migrante também pulou na água para ajudar os dois colegas.
“Após dias e dias naquele navio, estava enlouquecendo. Tinha a sensação de que meu corpo e meus sonhos estavam desmoronando. Sou grato por todo o cuidado que recebi a bordo, mas não podia mais aguentar aquela situação”, contou.
(*) Com Ansa