O suspeito do atentado a tiros em Paris é um francês de 69 anos que já tinha atacado outros migrantes. Nesta sexta-feira (23/12), o homem matou a tiros três pessoas e deixou outras três feridas em um ataque realizado no 10° distrito da capital francesa. As vítimas eram ativistas curdos.
Era pouco antes do meio-dia quando os primeiros tiros foram ouvidos no cruzamento da rua d’Enghien com a rua d’Hauteville. Quatro estampidos primeiro, depois mais três, de acordo com vizinhos. O ataque foi realizado próximo a um centro cultural curdo.
“Estávamos na rua e ouvimos os tiros. Vimos as pessoas que corriam por todos os lados”, contou um morador do bairro.
Um homem alto e branco de 69 anos entrou atirando no centro cultural curdo Ahmet-Kaya, um local que reúne curdos da Turquia, do Iraque, do Irã e da Síria.
Os moradores do bairro descrevem que, na sequência, o agressor entrou em um salão de cabeleireiro. O suspeito foi ferido e desarmado pelos funcionários do salão, antes da chegada da polícia.
Três pessoas foram mortas, uma mulher e dois homens, todos militantes do Conselho Democrático Curdo da França, segundo informações da televisão francesa BFMtv. Outros três homens foram feridos e estão internados, um deles em estado grave.
Poucos minutos depois o homem foi preso pela polícia. O suspeito é um personagem conhecido pelas forças de segurança por seu histórico de violência.
Aposentado com histórico de ataque a imigrantes
O atirador é um condutor de trens aposentado que tinha licença como atirador em um clube esportivo. O homem, identificado como William M., já tinha atacado imigrantes em outra ocasião.
Em dezembro de 2021, com uma espada, ele investiu contra um acampamento de imigrantes no 12° distrito da capital francesa. Na ocasião, o homem rasgou diversas barracas de imigrantes com a espada e começou uma briga. Dois refugiados de origem sudanesa foram feridos, informou o jornal Le Monde.
O homem foi detido e, pouco tempo depois, condenado por um crime cometido em 2016, quando esfaqueou uma pessoa dentro de sua casa.
O aposentado estava preso até o início de dezembro, quando foi libertado à espera do recurso sobre sua condenação, conforme informações da Franceinfo.
Nos últimos dias, ele estava na casa de seus pais, a pouco mais de 1 km do local do ataque. “Meu filho é louco. Ele ficou na prisão por um ano, e mãe dele estava tentando colocá-lo de volta aos eixos”, afirmou o pai do suspeito, em entrevista à televisão francesa M6.
O presidente francês, Emmanuel Macron, lamentou o “ataque de ódio” contra os curdos “no coração de Paris”.
Les Kurdes de France ont été la cible d’une odieuse attaque au cœur de Paris. Pensées aux victimes, aux personnes qui luttent pour vivre, à leurs familles et proches. Reconnaissance à nos forces de l’ordre pour leur courage et leur sang-froid.
— Emmanuel Macron (@EmmanuelMacron) December 23, 2022
Twitter Alexandra Cordebard
Franceses e imigrantes marcham em homenagem às vítimas do ataque racista da rua d’Enghien
Crime racista?
A polícia francesa investiga o caso e considera a possibilidade de um crime com motivação racista contra a comunidade curda, dados os antecedentes do suspeito.
Segundo o jornal Le Parisien, o suspeito teria dito aos policiais no momento de sua detenção que “não gostava dos curdos”.
“As motivações racistas obviamente farão parte das investigações que acabam de começar”, afirmou à imprensa a procuradora da República do Tribunal de Paris, Laure Beccuau.
Ainda que a polícia não confirme o motivo do ataque, diversos políticos da esquerda francesa denunciam o terrorismo racista da ação e ligam o ataque à força crescente do discurso xenofóbico da extrema direita no país.
“Não foi um ataque a tiros, são assassinatos racistas. E possivelmente um atentado feito por um homem alimentado pelo discurso de ódio”, afirmou o secretário nacional do Partido Comunista, Fabien Roussel.
Nas redes sociais, o líder do partido Socialista, Olivier Faure, afirmou: “hoje o ataque foi aos curdos. O que aconteceu deve acordar cada um de nós para o perigo que a extrema direita representa. Dar legitimidade ao racismo é armar os identitários”.
Contudo, o ministro do interior, Gérald Darmanin, afirmou que ainda não há informações que liguem o suspeito à ultradireita.
O ministro indicou que haverá um reforço da segurança em torno dos locais de reunião da comunidade curda e dos órgãos diplomáticos turcos.
Protestos contra a inação policial
O ministro do interior esteve no local das investigações no final da tarde de sexta. A visita irritou a comunidade da região, que considera que a polícia francesa não dá atenção suficiente aos crimes contra migrantes.
Um protesto se formou na área e manifestantes entraram em confronto com os policiais que estavam no local. Os policiais usaram gás lacrimogêneo para dispersar a manifestação.
O movimento continuou em uma marcha pelo bairro, onde diversas lixeiras foram queimadas e ruas foram interditadas. Entre as palavras de ordem dos apoiadores da comunidade curda, frases como “os mártires não morrem”.