O professor de escola rural Pedro Castillo Terrones liderou uma histórica campanha eleitoral no Peru com um lápis na mão. Depois de ser um dos retardatários nas pesquisas de primeiro turno em abril, surpreendeu ao obter a maioria dos votos em relação aos demais candidatos.
Sob a bandeira do esquerdista Peru Libre, Castillo, de 52 anos, conseguiu consolidar o apoio popular nos territórios mais pobres do Peru graças à promessa de combater a corrupção, a pobreza, garantir a nacionalização dos recursos naturais e uma nova Constituição.
Se confirmadas as projeções, Castillo será o primeiro presidente socialista do país. E isso depois de derrotar Keiko Fujimori, da Força Popular, de direita, que usou um discurso anticomunista para atacar as propostas econômicas do candidato do Peru Libre.
Com 95,71% das atas processados na votação de domingo, os resultados dão a Castillo uma ligeira vantagem com 50,23% sobre Fujimori com 49,77%. Em caso de vitória, ele será responsável por consolidar a chamada ‘Revolução do Lápis’ – o objeto escolar era seu símbolo de campanha.
A economia do país andino, que atravessa uma grave contração causada pela crise da covid-19, sofreu em 2020 uma queda de 11,2%, uma das piores dos últimos trinta anos.
O Peru é o segundo exportador de cobre do mundo e a exportação do metal representa 60% das exportações totais do país. No primeiro trimestre de 2021, elas chegaram a chegaram a US$ 8,2 bilhões, segundo a Sociedade Nacional de Mineração, Petróleo e Energia (SNMPE).
“É preciso que o Estado recupere as riquezas que o país tem. Vamos recuperar as riquezas com a renegociação dos contratos com as grandes mineradoras que tiram as riquezas do país”, disse Castillo, durante o segundo debate presidencial.
“Nunca mais pobres em um país rico”
Castillo, que prometeu em sua campanha “nunca mais pobres em um país rico”, é originário de Puña, uma pequena cidade rural de mineração localizada em Tacamba, no norte do país. Ele cresceu no campo, seus pais que tiveram que alugar a terra por muitos anos para semear.
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística e Informática (INEI), a pobreza aumentou no último trimestre de 2020 em 10%, por conta da redução de empregos devido ao confinamento obrigatório para controlar as infecções por covid-19.
Castillo também prometeu que obrigará os que enriqueceram às custas do Estado a devolver o dinheiro para investir na construção de escolas, universidades, em empréstimos para mulheres e pequenos negócios.
Mauricio Leandro Osorio/Opera Mundi
Lápis foi o símbolo da campanha do professor Pedro Castillo, virtual presidente do Peru
Nos últimos anos, quatro ex-presidentes foram indiciados e processados por vários casos de corrupção. Além disso, Keiko Fujimori, filha do ex-presidente preso Alberto Fujimori, é processada por lavagem de dinheiro.
Castillo declarou que lutará contra a impunidade e anunciou a criação de um conselho nacional anticorrupção com representantes do Judiciário, do ombudsman do governo, do Ministério Público e da Igreja.
Justiça para vítimas da violência de Estado
Yaqueline Yauri marchou nas ruas de Lima junto a centenas de parentes de vítimas da ditadura de Alberto Fujimori (1990 – 2000). Com uma fotografia de seu pai, Pedro Yauri, pendurada no peito, ela pediu aos peruanos que votassem contra Keiko e contra a impunidade dos assassinatos e desaparecimentos cometidos no governo do pai da candidata.
“Ele denunciou a ditadura do senhor Alberto Fujimori e é por isso que decidiram matá-lo e fazê-lo desaparecer”, disse Yaqueline a Opera Mundi. Pedro Yauri era um jornalista peruano que foi sequestrado e assassinado pelo grupo paramilitar Colima em 1992.
O Peru viveu nas últimas décadas uma guerra civil onde se enfrentaram o grupo insurgente Sendero Luminoso, o Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA) e as Forças Armadas. Estima-se que 69.000 pessoas tenham desaparecido ou morrido, segundo dados oficiais.
“Eles querem apagar nossa memória. Keiko não tem conhecimento do terrorismo de Estado que vivemos. Não queremos reivindicar os algozes de nossa família. Pedimos justiça, e isso não acontecerá se a sra. Fujimori vencer, porque sabemos que seu pai está atrás dela”, disse.
“Nunca mais desaparecimentos. Nossa solidariedade com as famílias das pessoas que desapareceram nos tempos sombrios de Fujimori. Nosso compromisso é fazer justiça a cada caso”, postou Castillo em sua conta pessoal no Twitter após uma reunião com as famílias das vítimas.
Também durante a ditadura de Alberto Fujimori, foi implementada uma política estatal de controle de natalidade na qual cerca de 300.000 mulheres foram submetidas a esterilizações forçadas.
“A dor das vítimas de esterilizações forçadas é minha. Minha família sofreu durante o governo de Fujimori. Prometo fazer justiça, fazer reparações integrais, que o Estado reconheça sua responsabilidade e peça perdão por esta grande violação aos direitos humanos”, finalizou o candidato.