“Quase todas as favelas do Rio têm uma área que os moradores chamam de Gaza”. Esta frase dita pelo pastor e guia turístico Cosme Felippsen, morador do Morro da Providência, no Rio de Janeiro, se refere ao lugar “onde se concentra a maior parte dos tiros quando a polícia ataca um determinado lugar”.
Esse relato é apenas um dos apresentados em uma reportagem do portal Al Jazeera, assinada pela jornalista Eleonore Hughes, sobre como uma grande parte da população carioca se identifica com o drama vivido pelos palestinos, especialmente na comparação da ação da Polícia Militar (PM) em suas comunidades e a do exército israelense no Oriente Médio.
Na matéria, Felippsen conta que tinha um sobrinho que foi morto pela PM do Rio aos 17 anos, quando estava em um beco da sua comunidade, no Morro da Providência, um dos locais que recebem o apelido de “Faixa de Gaza”.
“Há pelo menos 15 anos se usa essa expressão, muitas coisas que acontecem na Palestina também acontecem nas favelas do Rio de Janeiro”, acrescentou o pastor.
Outra moradora apresentada pela reportagem é Adriana Odara Martins, que vive na Baixada Fluminense, na região metropolitana do Rio. Ela esteve presente em um protesto realizado em outubro em frente ao consulado dos Estados Unidos na cidade, no qual manifestantes que pediram um cessar-fogo em Gaza.
Melissa Cannabrava / Voz das Comunidades
Moradores das favelas do Rio se identificam com dramas vividos pelos palestinos em Gaza
“Estamos aqui em solidariedade porque temos empatia. Sabemos o que é viver sob violência”, disse Odara, que faz parte do grupo feminista Articulação de Mulheres Brasileiras e é coordenadora do Movimento Negro Unificado.
A ativista visitou a Cisjordânia em 2017 e comenta que “eu achava que éramos os únicos a sofrer nas favelas, mas assim que cheguei lá vi que tudo era muito parecido, e muito mais tenso”.
Uma das semelhanças apontadas por Odara na reportagem é entre o muro de segurança que Israel construiu através das comunidades palestinas na Cisjordânia e o muro que foi inaugurado em agosto passado pelo governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, que também serve para bloquear o acesso dos moradores da favela ao resto da cidade, medida que também foi justificada como uma política “em nome da segurança”.
“Existe um muro do apartheid no Rio, o nosso muro da vergonha! Como eles (palestinos) também têm lá (na Cisjordânia)”, contou a ativista.
A reportagem utiliza números do Fórum Brasileiro de Segurança Pública para mostrar que 6,4 mil pessoas foram mortas por ação da polícia no Brasil durante o ano de 2022, entre as quais 83% eram pessoas negras, e comparar com a situação do enclave palestino, onde mais de 12 mil pessoas foram mortas em pouco mais de um mês (desde 7 de outubro, quando teve início a ofensiva israelense a Gaza).