Mais de 500 escritores, artistas, cineastas e trabalhadores culturais globais, incluindo a ganhadora do Prêmio Nobel Annie Ernaux e o poeta e ativista palestino Mohammed el-Kurd, estão boicotando associações financiadas pelo Estado alemão em resposta ao que chamam de “políticas macartistas da Alemanha, que suprimem a liberdade de expressão, especificamente expressões de solidariedade com a Palestina”.
Chamado Strike Germany, o boicote visa chamar a atenção para a repressão autoritária da Alemanha na defesa pró-Palestina, bem como ao ataque brutal de Israel a Gaza – que até o momento matou mais de 23 mil palestinos e pelo menos 10 mil crianças.
“Numa época em que os palestinos estão sendo massacrados por um exército apoiado pela Alemanha a um ritmo sem precedentes, e numa época de crescente totalitarismo nas instituições alemãs, é mais importante agora do que nunca que boas pessoas rejeitem o racismo anti-árabe de forma assertiva e pública, e boicotar as organizações que espalham ou dão cobertura a esse racismo”, disse el-Kurd à Al Jazeera no início desta semana.
El-Kurd – que abandonou um programa de mestrado nos Estados Unidos em 2021 para voltar para casa e protestar contra a expulsão de palestinos de suas casas na Cisjordânia ocupada por Israel – ao lado de sua irmã Muna el-Kurd, passou os últimos três anos fazendo campanha para aumentar a conscientização global sobre as políticas israelenses.
Entre os signatários do manifesto de boicote à cultura alemã está Annie Ernaux, ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura de 2022, apoiadora de longa data do movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) e crítica de Israel.
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Governo da Alemanha tem sido um dos aliados mais importantes de Israel desde a recente escalada do conflito no Oriente Médio
Outros intelectuais que também assinaram o manifesto do Strike Germany estão os vencedores do Prêmio Turner, Lawrence Abu Hamdan, Charlotte Prodger e Tai Shani; a atriz India Moore; e a acadêmica Christina Sharpe.
Postura pró-Israel do governo alemão
O governo da Alemanha tem sido um dos aliados mais importantes de Israel desde a recente escalada do conflito no Oriente Médio. Na sexta-feira (12/01), Berlim que a acusação de genocídio contra Israel na Corte Internacional de Justiça (CIJ) era completamente infundada e equivalia a uma “instrumentalização política” da convenção da ONU sobre genocídio.
Esta posição revelou-se particularmente polêmica no setor cultural da Alemanha. Os organizadores anônimos da petição Strike Germany, afirmaram nesta segunda-feira (15/01) que reuniram mais de 1.000 signatários.
Figuras importantes do governo da Alemanha, como o Chanceler Olaf Scholz e o Vice-Chanceler Robert Habeck, afirmaram que a segurança de Israel faz parte da razão de ser da República Federal. Tanto no contexto da guerra em Gaza como no discurso interno na Alemanha, o antissemitismo é equiparado à crítica a Israel.
Scholz chegou a afirmar que Israel é “guiado por princípios humanitários” e que as Forças de Defesa de Israel (IDF) certamente respeitam o direito internacional. A Ministra dos Negócios Estrangeiros Annalena Baerbock argumenta que a abstenção da Alemanha numa votação sobre o cessar-fogo proposto pela ONU foi justificada devido a uma “falta de equilíbrio” na resolução. Ela foi recebida com críticas na Alemanha por se abster, em vez de votar diretamente contra o fim da guerra.