O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (UNOCHA) disse nesta terça-feira (19/12) que, desde abril de 2023, 6,7 milhões de pessoas já deixaram o Sudão, país palco de uma crise política e social.
De acordo com a ONU, dentro do número total de pessoas deslocadas, as crianças são a metade, sendo o Sudão até o momento, o país que tem o maior número de pessoas deslocadas no mundo.
Desde abril, o debate público sobre a atual situação do Sudão continua a se desenvolver, bem como as consequências humanitárias. Atualmente, há uma disputa por poder no país, entre dois militares rivais, Abdel Fattah al-Burhan e Mohamed Hamdan Dagalo, e que se transformou numa guerra. Com o conflito, somente neste ano, mais de 12 mil pessoas foram mortas, de acordo com uma estimativa do Armed Conflict and Event Data Project (Projeto de dados sobre conflitos armados e incidentes), enquanto as Nações Unidas estimam essas milhares de pessoas que foram forçados a fugir de suas casas.
No domingo (17/12), a ONU disse que 14 mil pessoas fugiram de Wad Madani, uma cidade sob controle do Exército nacional. Outras 500 mil procuraram refúgio em Al-Jazirah, principalmente de Cartum, capital do Sudão. Segundo a ONU, somente nessa região, mais de 270 mil dos 700 mil residentes dependiam de ajuda humanitária.
A UNOCHA observou ainda que as crianças representam metade do número total de deslocados. A entidade, que cita a Matriz de Monitorização dos Deslocamentos Migratórios (IOM DTM), analisou que mais de 5,4 milhões de pessoas foram deslocadas no Sudão desde abril deste ano.
After 8 months of conflict in Sudan:
? 6.7+ million people have been #ForcedToFlee.
? 17.7 million people are going hungry due to conflict & economic decline.
? 700,000 suspected cases of cholera have been reported.More from @UNOCHA: https://t.co/peeLJRBNcM pic.twitter.com/oQ3YKovOJC
— United Nations (@UN) December 19, 2023
ACNUR/Ala Kheir
Pessoas deslocadas chegam ao Sudão do Sul vindas do Sudão através da passagem de fronteira de Joda.
Sudão na linha do tempo
Na história recente, o Sudão passou por diversos conflitos que afastam a ideia de um Estado unificado. Desde a independência, em 1956, o país passou por guerras civis intercaladas por eleições e ditaduras militares. As eleições que ocorreram foram acompanhadas de inúmeros conflitos, como, por exemplo, a dos anos 1970 em que Jaafar Numeiri sofreu um golpe militar e líderes do Partido Comunista Sudanês foram executados após o golpe.
Nos anos 1980, veio uma nova junta militar que colocou Omar Al-Bashir no poder, uma guerra civil no oeste do país, em Darfur, e depois a separação do sul, quando surge o Sudão do Sul.
Já em 2019, uma série de manifestações massivas pediram a saída de Al-Bashir do poder, o que de fato ocorreu. Contudo, em 2021, aconteceu um novo golpe militar e são os vencedores desse golpe que constituem o exército nacional.
Os grupos rivais do atual conflito vêm sendo identificados como, de um lado, o exército do general Abdel Fattah al-Burhan e, do outro, paramilitares das Forças de Apoio Rápido (conhecidas pela sigla em inglês RSF), liderados por Mohamed Hamdam Dagalo (conhecido como “Hemetti”). As informações são que as RSF começaram um ataque surpresa simultâneo contra bases do exército no dia 15 de abril de 2023.
A SAF, Forças Armadas do Sudão, tem cerca de 200.000 soldados e é chefiada por Abdel Fattah al-Burhan; funciona mais como um exército regular. Do outro lado, entretanto, estima-se que a RSF tenha entre 70.000 e 100.000 e é chefiada por Hemetti. A RSF funciona mais como uma força de guerrilha.
Os dois militares já tinham unido forças em outubro de 2021 para organizar um golpe militar. Agora eles apontaram as armas um para o outro.
Perspectivas da guerra sudanesa
De acordo com dados oficiais, cerca de 17,7 milhões de pessoas em todo o Sudão sofrem de insegurança alimentar aguda, incluindo 4,9 milhões em situação de fome de emergência.
O jornal Al Jazeera, afirma que após os oito meses de guerra, a RSF está prestes a capturar Wad Madani, a segunda maior cidade do país, o que marcará um grande ponto de virada no conflito. Na semana passada, o líder da RSF, Mohamad Hamdan “Hemedti” Dagalo, concordou em se encontrar com o general al-Burhan no final deste mês, sob os auspícios do bloco da África Oriental, IGAD (Conselho de Ministros da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento da África Oriental).
Ainda segundo o periódico catari, mesmo quando os comandantes das RSF apelam por um cessar-fogo e o fim da guerra, os seus combatentes estão instigando uma nova catástrofe humanitária na região com incursões militares incessantes.