Em 1º de setembro de 1991, o Uzbequistão declarou sua independência da União Soviética, acelerando o processo de dissolução da superpotência comunista. No entanto, esse fato histórico em nada contribuiu para a liberdade do povo deste país da Ásia Central, que passou a se submeter a um regime de mão de ferro e centralizado na figura do presidente Islam Karimov.
Ao contrário do que as potências ocidentais esperavam, os ventos da democracia liberal não sopraram na maioria das ex-repúblicas após o desmantelamento da União Soviética.Karimov recebeu severas críticas da comunidade internacional por supostas restrições à liberdade de imprensa e por cometer fraudes eleitorais e violações aos direitos humanos.
A ONU criticou o país por encontrar a tortura como um método “institucionalizado, sistemático e rompante”. Karimov tomava medidas autoritárias para evitar qualquer oposição política, incluindo contra seu próprio sobrinho, o jornalista investigativo Jamshid Karimov. Ele deixou o governo somente em 2016 quando morreu.
O Uzbequistão tem uma área de 447.4100 quilômetros quadrados com uma população aproximada de 33 milhões de habitantes. Seu processo de independência tem como característica ter sido conduzido mais pelas circunstâncias que levaram ao desmantelamento da União Soviética do que por um sentimento nacionalista popularmente forte, mas que, no fim, acabou prevalecendo.
Qual a história do Uzbequistão
No início do século XIX, as dinastias que controlavam o atual território do Uzbequistão perdiam tempo em disputas internas e se viram muito tarde no meio de uma disputa expansionista de duas potências: os russos, que avançaram pelas estepes cazaques ao norte e os britânicos que tomaram controle do Afeganistão pelo sul. Cada um tentava obter a supremacia na Ásia Central em uma disputa que ficou conhecida como “O Grande Jogo”.
A Rússia, além de uma necessidade de controlar uma nova e segura fonte de algodão, também iniciou essa campanha para libertar o grande número de seus cidadãos que eram mantidos escravos na região.
Em 1876, quase todo o território atual uzbeque caiu nas mãos do Império russo. Mas, durante décadas, não houve interferência direta russa na população nativa. Havia contato apenas no comércio do algodão. Em cidades criadas para serem postos avançados russos, como a atual capital Tashkent, os russos não se misturavam.
Até a revolução bolchevique, a situação mudou com a chegada de estradas, o desenvolvimento industrial e o estabelecimento de uma classe média nas principais cidades. O único movimento contrário era o Jadidismo, que pregava o pan-turquismo e a preservação dos costumes e do islamismo na população. No entanto, após a revolução bolchevique, muitos líderes desse movimento acabaram se aliando aos comunistas.
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Islam Karimov, presidente depois da independência, promoveu ‘regime mão de ferro’
A guerra civil na Rússia acabou, e os comunistas conseguiram grande apoio popular na Ásia Central com promessas de autonomia política e econômica, seguindo as orientações da Nova Política Econômica de Lênin. Com cooperação da população nativa, foi criado a República Socialista Soviética Uzbeque (que incluía o atual Tadjiquistão, separadas em 1929) e iniciada campanhas de emancipação da mulher, redistribuição de terras e combate ao analfabetismo.
Muitas dessas iniciativas caíram por terra na era stalinista. Quase todo os líderes políticos da Ásia Central foram executados na fase dos expurgos e substituídos por russos leais ao dirigente. O país voltou a ser uma monocultura, centrada no algodão. Isso contribuiu para que reemergisse o sentimento nacionalista. Os uzbeques poderiam voltar a participar do Partido Comunista e, consequentemente, ter um papel maior na sociedade.
Ao final da década de 1980, a influência de Moscou já tinha decrescido. Um novo expurgo de dirigentes locais em razão de descobertas de corrupção, a ênfase na produção de algodão e as tentativas de enfraquecer o islã geraram um descontentamento crescente na sociedade local. Contribuíram para esse sentimento a discriminação dos uzbeques no exército, a degradação ambiental (especialmente no Mar Aral) e a falta de investimento em indústria.
Sentimento antirusso no Uzbequistão
Em 1989, ocorreram as primeiras tensões étnicas entre uzbeques e russos lá estabelecidos há gerações. A escolha de Islam Karimov como primeiro-secretário foi uma tentativa de refrescar os ânimos dos dois lados e reduzir a repressão causada pelos novos expurgos políticos.
Em agosto de 1991, a tentativa de golpe de estado contra Mikhail Gorbachev foi o golpe final para a União Soviética, com várias de suas repúblicas integrantes declarando independência. O Uzbequistão relutou no início em se opor ao golpe, mas declarou independência no dia 31 daquele mês. Um referendo realizado em dezembro contou com o apoio de 98,2% da população. No mesmo mês, um parlamento foi escolhido e Karimov eleito novo presidente.
Após a independência, uma série de tensões étnicas levou perto de dois milhões de russos a abandonarem o país para a Rússia. Como consequência, atualmente, os uzbeques de etnia russa não têm qualquer estatuto legal na Rússia nem em qualquer outro país e encontram-se, portanto, espalhados pelo mundo, particularmente na Europa e Estados Unidos. Karimov estimulou o sentimento antirrusso, fazendo com que 80% dos russos étnicos deixassem o país – quase 2 milhões de pessoas.