Muitas grandes empresas e instituições financeiras que contribuem direta ou indiretamente para o desmatamento não têm política para proteger as florestas, alertou uma ONG nesta quarta-feira (15/02), denunciando o “terrível” atraso do setor financeiro.
No total, 40% das 500 empresas denunciadas por apresentarem “maior risco de acelerar o desmatamento” não têm “nenhuma política” nessa área, explica a Global Canopy, uma organização sem fins lucrativos que tem como alvo as atividades do mercado que destroem a natureza.
O relatório anual da organização, que visa a transparência da cadeia de suprimentos e o mapeamento do comércio mundial, enfoca 350 empresas que consomem matérias-primas ligadas ao desmatamento (madeira, óleo de palma, carne bovina, couro, papel etc.) e os 150 bancos e fundos que mais as financiam.
O estudo foi publicado dois meses depois de um acordo adotado por mais de 190 países, com o respaldo da ONU, para tentar impedir a destruição da biodiversidade, essencial à humanidade.
O “pacto de paz com a natureza”, denominado “acordo de Kunming-Montreal”, visa proteger 30% do planeta até 2030 e aumentar para US$ 30 bilhões a ajuda anual para a biodiversidade nos países em desenvolvimento.
Recuperação dos ecossistemas
A Comissão Europeia propôs em junho uma lei que impõe a cada Estado-membro objetivos de recuperação dos ecossistemas (florestas, pastagens, zonas marinhas, etc.) danificados pela poluição ou exploração intensiva.
“Acabar com o desmatamento nas florestas tropical é crucial para atingir as metas globais de proteção do clima e da natureza”, disse Niki Mardas, diretor executivo da Global Canopy, em comunicado.
Entre as 200 empresas sem uma estratégia clara de desmatamento estão a montadora Volkswagen e a gigante alemã da distribuição de calçados Deichmann, além dos grupos alimentícios franceses Savencia e Fleury Michon.
Valter Campanato / Agência Brasil
40% das 500 empresas denunciadas por apresentarem maior risco de acelerar o desmatamento não têm “nenhuma política” na área, acusa ONG
Deichmann disse “não adquirir matérias-primas de países ligados ao tema do desmatamento”, alegando “não ter recebido um pedido de informação da Global Canopy”, garantindo “estar ciente da importância do assunto”.
O grupo “obviamente aplicará” as disposições legais europeias e apoia uma iniciativa industrial para “couro sem desmatamento”, detalha um porta-voz.
A Savencia, preocupada com o uso de soja e óleo de palma, explicou que só compra “óleo de palma sustentável” e “se compromete a promover uma ação coletiva contra o desmatamento ligado à produção de soja na América do Sul”. Questionada pela AFP, a Fleury Michon não quis se manifestar.
Instituições financeiras na berlinda
Quanto às instituições financeiras, 92 de 150 não têm política de contenção do desmatamento, incluindo os maiores fundos de investimento do mundo. Na França, a Global Canopy destaca principalmente o Crédit Mutuel e o grupo BPCE.
O Crédit Mutuel anunciou em dezembro que iria “adotar uma política setorial de combate ao desmatamento” com regras de financiamento publicadas no final do primeiro semestre de 2023.
O banco, que reúne 14 das 18 federações regionais do grupo Crédit Mutuel e da rede CIC, garante que “todos os financiamentos que possam participar, direta ou indiretamente, na destruição de florestas, em particular florestas tropicais insubstituíveis”, serão excluídos.
No total, as instituições financeiras examinadas pela Global Canopy deram financiamento de até US$ 527 bilhões a empresas sem qualquer política contra o desmatamento.
Cerca de 100 grupos, incluindo Danone, LVMH e Unilever, definiram políticas para conter o desmatamento no que se refere ao uso de matérias-primas, de acordo com a Global Canopy. Mas “só metade monitora ativamente” os fornecedores e as regiões em causa, observa a ONG, cujo relatório assinala, no entanto, “a esperança de progresso”.
“As empresas nunca tiveram melhores dados, ferramentas e diretrizes para ajudá-las a eliminar o desmatamento”, observa a Global Canopy.
“2023 é realmente o melhor ano para agir contra o desmatamento”, disse Emma Thomson, principal autora do estudo. “Se as empresas e instituições financeiras agirem, isso pode ter um grande impacto na crise climática”.