O general Eduardo Villas Bôas lançou dois tuítes propositalmente ambíguos às vésperas de um dia tenso no STF. O julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula suscita acirradas movimentações pelo país.
Villas Bôas foi nebuloso como uma profecia de Nostradamus. Não disse que sim e nem que não. Prega “repúdio à impunidade” no geral, sem que se saiba ao certo a quem se contrapõe. Nunca vi um movimento no país “a favor da impunidade”.
A expressão do alto oficial se dá no mesmo dia em que um celerado general de pijama conclama seus pares a pegar em armas pela “intervenção militar”. No contexto, a mensagem de Villas Bôas soa como pesada ameaça.
Caminhando no perigoso terreno da ambiguidade, o comandante poderia ao menos tentar evitar o ridículo. Há três semanas, a vereadora do PSOL, Marielle Franco, foi assassinada no Rio, sob as barbas de uma até agora inexplicada intervenção militar.
Tudo indica que o crime foi obra de profissionais, com conhecimento até do funcionamento das câmeras de monitoramento da prefeitura. Quem acessa tais informações não é um genérico “crime organizado”. Trata-se de um destacamento de bandidos com acesso ao poder público. É bem possível que seja gente do aparato de segurança, denunciada dias antes pela própria Marielle.
Os assassinos estão até agora completamente impunes.
É a eles que Villas Bôas se refere?
Falar nisso, os assassinos dos jovens de Maricá estão até agora impunes.
É a eles que Villas Bôas se refere?
Vale lembrar que os golpistas que atentam contra a Constituição estão até agora impunes.
É a eles que Villas Bôas se refere?
NULL
NULL
Marcos Corrêa/PR
Temer e Villas Bôas, durante cerimônia em Brasília: general brinca de Nostradamus
A linguagem sinuosa de Villas Bôas tenta passar uma imagem de militar moderado, de grande sapiência em hora grave. Talvez queira sensibilizar a direita que posa de civilizada. Mas na prática, – caso não esclareça o que quis dizer – Villas Bôas fez ameaça rasteira ao STF.
O general Braga – chefe da intervenção carioca – pediu ao governo federal a bagatela de R$ 3 bilhões para realizar suas ações até o final do ano. Conta de armazém, só pode ser. A dinheirama demandada por Braga equivale a mais de sete vezes o borderô anual do Ministério da Cultura (R$ 400 milhões).
Diante de uma intervenção de fancaria, que deixa assassinos impunes, a fala de Villas Bôas coloca a democracia na ponta da faca.
Melhor faria o general se tivesse sido mais direto. Poderia ter bradado: “Prendam o Lula amanhã ou ceis vão ver o que é bom pra tosse, porra!”
Trata-se de locução grosseira, que caberia na boca de um Odorico Paraguaçu (desculpem os mais novos). Mas teria um toque maior de sinceridade e pouparia trabalho aos intérpretes de Nostradamus.