Domingo, 15 de junho de 2025
APOIE
Menu

Agência Efe

A ginasta Lilin Deng, medalha de ouro na trave, faz parte de uma geração que viu a China se transformar em superpotência olímpica e econômica

A consolidação da China, ao lado dos EUA, no topo do quadro de medalhas em mais uma Olimpíada confirma a importância histórica do esporte nas disputas pelo controle da hegemonia regional e mundial entre os países. De fato, uma rápida análise do ranking das nações mais bem classificadas nos últimos jogos mostra uma correspondência com a ascensão econômica e política recente dos novos atores globais.

A poucos dias do encerramento das Olimpíadas de Londres, o quadro provisório de medalhas indica um desempenho bastante estável dos países centrais. Na realidade, raros são os países periféricos que conseguiram, entre Atlanta-1996 e Pequim-2008, quebrar a dominação das grandes potências e alcançar as quinze primeiras colocações. As exceções são, de um lado, os países do antigo bloco comunista (a Hungria, e a nova potência energética da Ásia Central, o Cazaquistão, que consolida sua ascensão em 2012) e aqueles que ainda preservam um regime socialista, como Cuba e Coréia do Norte; e, de outro lado, fenômenos em esportes localizados – no caso, o atletismo – como Quênia e Jamaica.

Receba em primeira mão as notícias e análises de Opera Mundi no seu WhatsApp!
Inscreva-se

Os fatores que determinam o ranqueamento dos países no quadro de medalhas, não são, portanto, tão óbvios assim, e têm intrigado economistas em busca de um modelo que explique o fenômeno. O Financial Times realizou em seu site (leia aqui – inscrição gratuita) uma previsão da quantidade total de medalhas em Londres-2012, utilizando os parâmetros dos principais modelos disponíveis, cujas variáveis vão desde o PIB per capita, passando pela população, até o desempenho médio em Olimpíadas dos países.

Agência Efe
O persa Omid Haji Noroozi, ouro na luta greco-romana: Irã é subestimado tanto esportivamente quanto como potência emergente

O resultado obtido é bastante próximo à realidade, apesar da margem de erro muitas vezes elevada, levando a uma subestimação do total de medalhas japonesas, iranianas, húngaras e colombianas, cujos desempenhos estão realmente muito acima de sua média histórica. Os modelos também superestimaram, visivelmente, o potencial de Cuba, Bulgária e Ucrânia, antigos centros de excelência esportiva socialista, agora em plena decadência.

No esporte, como na economia, a capacidade de previsão dos economistas convencionais tem, no entanto, deixado muito a desejar. Isto se deve, segundo os críticos da matematização e da modelagem na ciência econômica, ao fato que a complexidade da ação humana e dos fenômenos sociais não pode ser reduzida a um número finito de parâmetros e variáveis contidos em uma equação. A superação dos esportistas em uma competição está evidentemente relacionada com o potencial econômico de seu país.

Porém, como quantificar por exemplo variáveis determinantes de seu desempenho como o sentimento nacional (que parece contaminar como nunca antes os atletas do Reino Unido agora), ou a pressão exercida por lideranças políticas instáveis, que sabem do potencial legitimador dos investimentos no esporte (a ditadura cazaque, em primeiro lugar)?
 

Fatores não esportivos tem impacto direto, mas não decisivo no desempenho das nações

NULL

NULL


Portanto, se é verdade que o desempenho das nações nas Olimpíadas guarda uma relação com fatores econômicos e demográficos, outros, de natureza principalmente geopolítica, não podem ser diretamente estimados em modelos matemáticos ou econométricos. Pesa certamente para isso, o esforço para se obter reconhecimento local e regional e, alguns casos, global, como nos casos dos países que têm assistido uma rápida ascensão e ameaçam a hegemonia esportiva estabelecida no quadro de medalhas.

Leia outros artigos da coluna Outra Economia:
A mensagem sombria, mas de esperança, da Rio+20
Educação superior, a chave do desenvolvimento dos emergentes
No Irã, nem tudo é o que parece
A era dos indignados
Sucessão no Banco Mundial divide o planeta

Dentre eles, os casos mais emblemáticos dos últimos jogos são o Irã (43º colocado em Atlanta-1996, com uma medalha de ouro, e que deve ficar no top 15 no ranking de Londres-2012); a Coréia do Sul (que desde 1996 se posiciona entre os 15 melhores, mas que pela primeira vez briga para estar entre os cinco em 2012); e, definitivamente superpotência, a China (“apenas” 11.ª em Seul-1988 e entre os três melhores desde Sidney-2000).

Agência Efe

Os próximos jogos no Rio em 2016 poderão, a se manter esta tendência, ser a oportunidade de confirmação da liderança regional que o Brasil pretende exercer no subcontinente latino-americano.

Uma liderança econômica e geopolítica que tem enfrentado resistências localizadas, tanto internas, quanto externas, mas que contará com o poder legitimador de um evento esportivo global e com o prestígio praticamente unânime que ele exerce sobre a população.

Resta saber se os investimentos programados pelo Estado nas diferentes categorias esportivas se materializam a tempo. Ou se, como em outras áreas do governo, a pressão dos interesses conservadores terá também neste caso força para abortar os gastos públicos fundamentais para o salto estratégico que o país gostaria de dar.

Pois, se é verdade que as medalhas trazem um retorno político incomensurável e garantido, elas também cobram da sociedade um custo elevado, considerado, porém, excessivo pela mentalidade atrasada, e ainda dominante, das elites que comandam o país.

(Foto acima: a goleira Shana, da equipe brasileira de handebol chora após ser eliminada pela Noruega, campeão olímpica de 2008; após uma série de investimentos a longo prazo, a modalidade saiu de um estágio amador para se confrontar de igual para igual com as potências europeias)

Pedro Chadarevian é doutor em Economia pela Universidade de Paris, professor de Economia na Universidade Federal de São Carlos e editor do blog Outra Economia. Escreve quinzenalmente ao Opera Mundi.