Atualizada às 00:06 de 12/07/2016
Sei que a metáfora futebolística é uma doença grave que aflige os italianos há décadas… Mas pense: de um lado, no estádio de Saint Denis ontem à noite, estava sentado François Hollande e, do outro, António Luís Santos da Costa. De um lado, o socialista que destruiu os socialistas na França. Do outro, o socialista que desde o último dia 26 de novembro lidera um governo de minorias, socialista, com o apoio externo de partidos de esquerda, símbolo antiausteridade. Os dois se olhavam e viam jogar os seus.
Agência Efe
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Um fechou as fronteiras (inesquecíveis as imagens de homens aglomerados na praia de Ventimiglia, na Itália, à espera de uma vida, em 2015), propôs a suspensão da cidadania francesa a estrangeiros, avançou uma reforma trabalhista que desagrada população e sindicatos, e nunca colocou em discussão o eixo com Angela Merkel e Wolfgang Schauble, a chanceler e o ministro das Finanças da Alemanha; pelo contrário, está sempre sorridente na primeira fila das cúpulas europeias. O outro, Costa, como primeiro ato de seu governo de minorias, aumentou a renda mínima garantida para mais de 600 euros, reduziu a jornada de trabalho a 35 horas semanais e baixou o imposto para o setor turístico de 23% para 13%.
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Agência Efe
Jogadores comemoram vitória contra a França na final da Eurocopa neste domingo (10/07)
O primeiro, Hollande, ontem tinha a vitória no bolso e o carro aberto pronto para celebrá-la. O outro tinha o coração na garganta e a cabeça a mil. Grandiosidade francesa contra a resistência portuguesa.
Os grandes eram fortes e os pequenos, precisos. Portugal mostrou sua tenacidade em Saint Denis, a capacidade de reagir a um Payet qualquer que abate o capitão, aquele Cristiano Ronaldo antipático a tantos, mas grande herói de ontem. Um herói fora do campo que manca e orienta aos gritos os companheiros de time. Até o fim, até a vitória. Do quê? De um campeonato europeu, então ei-la, usemos a metáfora futebolística para dizer que esta é a Europa que queremos. Tenaz, forte, solidária, reativa, coesa, corajosa. Na qual qualquer pessoa, até um reserva – Éder – é igual ao campeão e pode mudar o rumo do jogo. Uma Europa que se opõe às fronteiras e à austeridade, que não se interessa pelas cúpulas, que não abandona a Grécia; que, na verdade, é a Grécia. E que pensa em todas as pessoas. Todas.
“Feliz”, escreveu Marisa Matias, líder do Bloco de Esquerda português, no fim da partida. Nós também.
Publicado originalmente no site da revista italiana Left. Tradução: Carolina de Assis