O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, durante a entrevista coletiva a 40 veículos independentes e influenciadores digitais, nesta terça-feira (07/02), que a privatização da Eletrobras foi “lesa-pátria”.
“Uma privatização lesa-pátria, a começar pelos salários dos diretores, dos conselheiros e pelo fato de que o governo só tem 10% de participação (na direção da empresa) quanto ele tem 40% das ações”, afirmou Lula, respondendo a uma questão da jornalista Eleonora de Lucena, do site e canal no Youtube Tutameia.
A pergunta de Lucena veio na sequência do presidente ter apontado o aumento de salário dos executivos da empresa após a privatização. Até a privatização, o presidente da empresa ganhava R$ 52.300 por mês; após a perda do controle pelo Estado, o executivo passou a ganhar R$ 300 mil por mês. Já os conselheiros da empresa recebiam R$ 5.440 por mês e tiveram seus ganhos aumentados para R$ 200 mil.
“Eu não posso e eu não disse durante a campanha e não vou dizer agora que eu vou votar pela compra das empresas de volta, até por que o pouco dinheiro que a gente tiver vamos ter que cuidar dos benefícios, que o povo está precisando que a gente faça”, ponderou Lula.
O presidente, no entanto, apontou o que chamou de “resultado da privatização” da empresa: “o governo tem 40% das ações da Eletrobras e o governo só participa da direção como se tivesse 10%. Se amanhã o governo tiver interesse de comprar as ações, essas ações para o governo valem três vezes mais do que o valor normal para outro candidato”, afirmou. “Ou seja, foi feito quase que uma bandidagem para que o governo não volte a adquirir maioria na Eletrobras”.
Segundo Lula, “possivelmente” a Advocacia Geral da União questionará pontos do contrato, chamado de “leonino contra o governo” por Lula. “Isso é uma coisa irracional e maquiavélica, que nós não podemos aceitar. Agora, se a gente conseguir fazer a economia crescer e as coisas forem bem, e a gente puder comprar mais ações, faremos isso”, declarou.
O caso Vale
Lula comparou o caso Eletrobras com o privatização da Vale do Rio Doce, herança do governo Fernando Henrique Cardoso para o seu primeiro mandato. “O governo, se tem 40%, ele tem que ter maioria na direção dessa empresa. A minha briga com a Vale foi por conta disso: o Bradesco tinha só 15% e o Roger Agnelli era presidente. Eu me matando para fazer navio aqui no Brasil, e ele foi comprar navio da China”, disse.
Lula afirma que, naquela ocasião, a saída foi buscar um novo presidente. “Então, fomos obrigados a tirar ele e colocar outro. Eu não sei o que vai acontecer”. O mandatário complementou que ainda não conversou com ninguém da Eletrobras ou com o ministro das Minas e Energia sobre o assunto.
“O que eu posso dizer é que foi um processo errático e leonino contra os interesses do povo brasileiro. Uma privatização lesa-pátria, a começar pelo salários dos diretores, dos conselheiros e pelo fato de que o governo só tem 10% de participação quanto ele tem 40% das ações”, afirmou.
Ricardo Stuckert
Lula questionou a privatização da Eletrobras, realizada no último ano do governo de Jair Bolsonaro
Petrobras
Ainda com relação às empresas estatais, Lula falou que nos últimos anos teve “muita coisa mal feita”. Citou, especialmente, o que chamou de desmonte da Petrobras e o fato de o país estar exportando óleo cru enquanto importa 25% da gasolina que consome. “O Brasil vende óleo cru e fica importando derivado quando, na verdade, o Brasil deveria estar exportando derivados. Era por isso que a gente queria criar as cinco refinarias, para que o Brasil aproveitasse o pré-sal e passasse a exportar derivados e não comprar derivados e vender óleo cru”, disse.
Lula voltou ainda a repetir que a recompra de estatais não é prioridade do governo. “A minha prioridade, nesse momento, é acabar com a fome nesse país. Eu vou repetir o que eu disse em 2003: é minha meta principal acabar com a fome nesse país, alfabetizar as crianças na idade certa, e cuidar da saúde”.
Cuba e Venezuela
Durante a coletiva, Lula também tratou das relações entre o Brasil, Venezuela e Cuba, prejudicadas depois do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em 2016. “O Brasil vai reatar suas relações com a Venezuela com a maior tranquilidade. Com Cuba nós vamos manter as relações que nós sempre tivemos. E será assim com qualquer outro país”, disse ainda Lula. “Nós vamos ter um embaixador do Brasil na Venezuela. Logo logo nós vamos ter um embaixador em Cuba, e Cuba vai trazer o seu embaixador ao Brasil, e tudo voltará à normalidade”.
Lula lembrou também a importância desses países no comércio exterior brasileiro. Cuba sempre foi boa pagadora, disse Lula, e só deixou de honrar com os pagamentos dos empréstimos brasileiros ao país durante os anos Bolsonaro, que não queria conversa como os cubanos. “Não queriam conversar, aí não tinha nem que fosse cobrar”, afirmou.
A entrevista nesta manhã, ocorrida no Palácio do Planalto, durante um café da manhã, durou aproximadamente uma hora e meia. A íntegra da conversa será publicada no Youtube de Opera Mundi às 16h30. O presidente também respondeu a questões sobre a pauta da viagem no fim desta semana aos Estados Unidos, o papel dos militares no país, a tentativa de golpe de 8 de janeiro, taxa de juros e relação com o Banco Central, a privatização da Eletrobras e o papel do governo no fomento à imprensa independente.