Atualizada em 10/06/2020 às 13h25
O ex-presidente da Bolívia, Evo Morales, afirmou que o governo brasileiro participou do golpe de Estado que forçou sua renúncia à presidência em 10 de novembro de 2019.
Em entrevista ao jornal argentino Página/12 publicada nesta segunda-feira (08/06), Morales afirmou que possui uma “informação oficial, confirmada e reconfirmada”, de que o embaixador brasileiro em La Paz, Otavio Côrtes, se reuniu horas depois de sua renúncia com os líderes opositores Carlos Mesa e Fernando Camacho, e com o embaixador da União Europeia, León de la Torre Krais, quando foi definido que a então senadora Jeanine Áñez ocuparia a presidência.
“Minha informação oficial, confirmada e reconfirmada, é de que às 18h30 se reuniram Waldo Albarracín, ativista da direita, com Carlos Mesa, Fernando Camacho, Tuto Quiroga, a Igreja Católica, o embaixador do Brasil e também o da União Europeia. Isso foi no domingo e ali disseram que Áñez ia ser presidente”, disse Evo.
Opera Mundi entrou em contato com o Itamaraty na tarde desta terça-feira (09/06) para pedir a posição do órgão em relações às afirmações do ex-presidente boliviano. O pedido de posicionamento foi reiterado por telefone por duas vezes, mas, até a publicação deste texto, o MRE não havia se pronunciado. Caso o faça, atualizaremos a reportagem.
O ex-mandatário boliviano ainda afirmou que os encontros das forças golpistas com o representante diplomático brasileiro seguiram após o dia 10 de novembro.
“A mesma coisa no dia seguinte, houve participação da embaixada do Brasil em uma reunião com Mesa, com Quiroga, com Camacho, não sei mais quem, mas esses personagens junto com alguns hierarcas da Igreja Católica foram atores do golpe de Estado”, afirmou.
Para Morales, “Jair Bolsonaro e companhia trabalham para os Estados Unidos”. “Essa é a direita americana que se expressa através do Grupo de Lima e da Aliança do Pacífico, que obedece os mandamentos dos EUA”, disse.
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"Jair Bolsonaro e companhia trabalham para os Estados Unidos", disse Evo Morales
No dia 10 de novembro, Morales renunciou ao cargo de presidente após perder o apoio da cúpula militar. O país enfrentava uma série de protestos por conta de acusações de fraude eleitoral no pleito realizado semanas antes – no qual o mandatário havia sido reeleito em primeiro turno.
Apoiado pela maioria dos países da América Latina governado por partidos de direita, o golpe contou com um relatório da OEA que supostamente indicava que as eleições haviam sido fraudadas, fato que estudos publicados desde então descartam completamente.
Voos ao Brasil
O periódico argentino ainda publicou uma matéria no domingo (07/06) alegando que o avião presidencial da Bolívia, o FAB-001, esteve no Brasil um dia depois do golpe, quando começou uma série de viagens por cidades brasileiras como Brasília, São Paulo, Manaus e Rio de Janeiro.
Segundo Morales, “alguns oficiais das Forças Armadas bolivianas me disseram que nesses voos levaram dinheiro”. Questionado se o objetivo era tirar dinheiro da Bolívia, Evo respondeu que “é assim, assim se entende”. “Pois eu imagino, e talvez imagine mal, que seguramente alguém ia trazer dinheiro, muito dinheiro para as Forças Armadas ou para a polícia. Precisavam de dinheiro disponível e meter bala, como fizeram nos dias seguintes”, disse o ex-presidente.
Entretanto, a Força Aérea Boliviana negou que o avião presidencial com matrícula FAB-001 tenha viajado ao Brasil nos dias subsequentes aos golpe de Estado do dia 10 de novembro de 2019.
Em nota emitida na última segunda-feira (08/06), os militares bolivianos rechaçam as informações publicadas pelo Página12 e afirmam que “o sistema FlightAware, com o qual se pode realizar o acompanhamento de todas as aeronaves, emitiu um sinal de deslocamento de uma “First Air” (FA-01); todas as aeronaves presidenciais a nível mundial, não só na Bolívia, levam esta identificação”.
De fato, é de praxe que, quando uma aeronave transporta um presidente, ela seja denominada pela matrícula 001 e, no caso dos registros de voos publicados pelo Página/12, as viagens foram feitas na verdade pelo avião presidencial do Brasil. Em outras palavras, todo avião em que o presidente brasileiro, por exemplo, estiver viajando, carrega o call sign FAB1 (Força Aérea Brasileira 1) – e é assim que a aeronave aparece nas telas dos controladores de voo e no FlightAware.
Além disso, todas as viagens que o periódico argentino atribuiu ao avião presidencial da Bolívia entre 11 de novembro de 2019 a 7 de dezembro de 2019 no território brasileiro batem com realizadas pelo presidente Jair Bolsonaro, o que pode ser comprovado pela agenda oficial do mandatário.