O debate político na Itália vem sendo inflamado nas últimas semanas por novos depoimentos de mafiosos “arrependidos” sobre a suposta relação entre as famílias da Cosa Nostra e políticos, sobretudo o primeiro-ministro Silvio Berlusconi e seu braço-direito, o senador Marcello Dell'Utri, do Partido da Liberdade. Dell'Utri foi condenado em 2004 a nove anos em primeira instância por associação com a máfia siciliana.
Há poucos dias, em entrevista à televisão, o senador definiu o capo Salvatore Mangano (condenado por formação de quadrilha e homicídio, e que nos anos 70 morou em uma propriedade de Berlusconi) de “herói” por não ter denunciado ninguém nos julgamentos.
Outro ex-mafioso, Gaspare Spatuzza, disse em depoimento hoje (4) que Dell'Utri e Berlusconi seriam os “referenciais” políticos dos chefes da Cosa Nostra, Giuseppe e Filippo Graviano. Segundo Spatuzza, Giuseppe lhe disse que graças ao acordo entre Berlusconi e seus aliados nos anos 1990, “o país foi entregue nas mãos da máfia”.
Fotos: EFE
Spatuzza, em imagem de julho de 1997: testemunha de acusação em processo contra Dell'Utri
Berlusconi, que não é citado formalmente no processo de Dell'Utri, se defendeu: “As declarações deste assassino são pura loucura”. O porta-voz do primeiro-ministro, o senador Paolo Bonaiuti, considerou “lógico” que Spatuzza faça essas afirmações. “A máfia ataca Berlusconi porque o governo atua contra o crime organizado. A máfia quer que o governo caia”.
Mas, segundo depoimento prestado terça-feira passada por Massimo Ciancimino, o “chefe dos chefes” da Cosa Nostra, Bernardo Provenzano, estaria em contato direto com Marcello Dell'Utri para negociar um acordo entre o governo e a máfia siciliana. Massimo é filho de Vito Ciancimino, ex-prefeito de Palermo, falecido em 2002, que pertencia à família mafiosa Corleone.
Os depoimentos vêm sendo prestados diante de juízes em Palermo e Caltanissetta, na Sicília, que investigam chacinas ocorridas em 1992 nas quais morreram os juizes Giovanni Falcone e Paolo Borselino.
Condenando em primeira instância em 2004, Dell'Utri comparece a novo julgamento em Turim
Massimo Ciancimino revelou também aos juízes alguns negócios dos mafiosos com o mesmo senador do Partido da Liberdade: investimentos dos capi Salvatore Buscemi e Francesco Bonura na empreiteira Edilnord, de Berlusconi. Também declarou que Vito havia sido “consultor” em uma das primeiras empresas de Dell'Utri, a Venchi Unica.
Política
Na Itália, a polêmica vem estimulando a oposição, mas está dividindo também a base governista. O presidente da Câmara dos Deputados, Gianfranco Fini, do mesmo partido de Berlusconi, defendeu que o primeiro-ministro deveria ser levado à Justiça. “Ele confunde o apoio popular, que certamente tem, com uma imunidade total”, afirmou Fini, alegando que Berlusconi estaria tentando se esquivar de um processo.
Até agora, nenhuma acusação que ligue Silvio Berlusconi à máfia foi provada em tribunal. Mesmo assim, a oposição organizou uma manifestação nacional para amanhã (5), batizada de “No Berlusconi Day”. O protesto vai pedir que o primeiro-ministro renuncie e vá a julgamento.
Berlusconi durante encontro com o presidente russo Dimitri Medvedev, em Roma, nesta quinta-feira
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