O novo presidente nórdico Alexander Stubb (PCN) assumiu a Presidência da Finlândia na sexta-feira (08/03). Ele substituiu Sauli Niinistö, que ocupou o cargo por 12 anos. No seu discurso de posse, Stubb agradeceu ao seu antecessor por liderar o país em tempos turbulentos.
O ex-presidente Sauli Niinisto e o atual presidente Alexander Stubb pertencem ao conservador Partido da Coalizão Nacional. O novo mandatário Stubb enfatizou que a entrada da Finlândia na OTAN seria o “passo final” da entrada dos finlandeses na “comunidade ocidental de valores”.
Ele declarou que a política externa e de defesa do país é um “realismo baseado em valores”, o que podemos traduzir como uma afirmação retórica de que é preciso ser forte e pragmático para defender o que seriam os valores ocidentais e a “ordem internacional baseada em regras”.
Fora do aspecto de força militar, porém, o realismo a que Stubb se refere também seria o entendimento que “acordos são necessários”, mesmo com países que mantêm outras perspectivas.
Em fevereiro de 2022, após o início da guerra russa em grande escala na Ucrânia, tanto a Finlândia como a Suécia solicitaram a adesão à OTAN.
“Estamos agora enfrentando uma nova era. Ao aliar-nos militarmente e aderir à OTAN, demos o passo final na comunidade de valores ocidentais, à qual a República da Finlândia pertenceu em espírito ao longo da sua independência”, afirma o novo presidente em discurso.
Como parte da nova era, Stubb e o primeiro-ministro norueguês, Jonas Gahr Støre, visitaram Alta, no norte de Noruega, na quinta-feira (07/03), para se encontrarem com as forças que participam na Resposta Nórdica – o exercício militar aliado em grande escala que está acontecendo no norte da Noruega, Finlândia e Suécia. Os dois chefes de Estado também tiveram uma reunião bilateral.
O semipresidencialismo da Finlândia em resumo
Na Finlândia, o governo presidencial e o parlamentarismo são combinados. O presidente e o governo compartilham o poder executivo.
A escolha do presidente é por eleição direta por seis anos consecutivos e pode ser reeleito uma vez e ele lidera a política externa e de segurança doméstica em colaboração com o governo. O governo tem a sua base no Parlamento, o Eduskunta, que é eleito de quatro em quatro anos e o Parlamento aprova compromissos internacionais. Em questões de guerra e paz, o presidente, que é também o comandante máximo das Forças Armadas Finlandesas, toma decisões com o consentimento do Eduskunta.
O presidente também tem o poder de dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, rejeitar ou rever projetos de lei apresentados pelo governo e abster-se de ratificar leis que foram adotadas e exerce a maioria desses poderes em acordo com o governo.
Realismo baseado em valores
Na Finlândia, o presidente tem grande poder de definição sobre a linha e as iniciativas da política externa do país, e Stubb sinaliza continuidade nesse contexto:
“A política externa e de segurança da Finlândia está baseada em um realismo de valores. O seu ponto de partida é uma forte aliança com a União Europeia e a OTAN. Ao mesmo tempo, baseia-se na crença de que a base do novo sistema internacional e da paz reside na reforma e no fortalecimento da ONU”, afirma.
Stubb salienta que o mundo atual é caracterizado por agitação, desordem e mudanças significativas com resultados instáveis.
“Estaremos enfrentando coisas às quais não estamos acostumados. E a incerteza, que às vezes pode até nos assustar. No entanto, não devemos reagir a cada pequeno ruído. Na política externa e de segurança, é sempre aconselhável manter a calma. Mas preparemo-nos também para o fato de que, por vezes, precisamos reagir rapidamente a novas circunstâncias, como fizemos com a adesão à OTAN”, conclui.
Guerra e Paz
O novo presidente finlandês também articula o que pode ser interpretado como uma contribuição para o debate ocidental sobre o rearmamento militar e a preparação civil.
Em particular, a liderança da defesa da Suécia e o líder militar da OTAN defenderam que é preciso preparar-se para uma possível grande guerra europeia.
“Ultimamente, o debate público e a retórica têm sido beligerantes. Estamos falando muito sobre armas, munições e exércitos. Isto, claro, vem do fato de vivermos num mundo onde há guerras na Europa, no Oriente Médio e em África”, diz Stubb e continua:
“Devemos trabalhar pela paz também. O Presidente Martti Ahtisaari foi um dos mediadores de paz mais importantes da história mundial. Devemos valorizar e continuar seu legado. Sempre que tivermos a oportunidade de mediar a paz, estaremos prontos para isso. Juntamente com a diplomacia, outro elemento crítico para a manutenção da paz é a prontidão e as capacidades das Forças de Defesa Finlandesas.”
Sauli Niinistö também fez o seu discurso final na sexta-feira (08/03), refletindo em particular sobre os últimos dois anos.
“Tudo mudou e nada mudou”, começa Niinistö.
Este paradoxo serve de enquadramento para todo o discurso, no qual ele, entre outras coisas, aponta o seguinte:
“A cruel invasão da Ucrânia pela Rússia nos primeiros anos desta década mudou dramaticamente a situação de segurança em toda a Europa. A Finlândia respondeu aderindo à OTAN e continuou a negociar o acordo de cooperação em defesa com os Estados Unidos. Embora o acordo seja bilateral, tem interações claras com outros acordos semelhantes”.
Dezembro passado, a Finlândia e a Suécia assinaram acordos bilaterais de cooperação em defesa (ACD) com os EUA. A Noruega e os EUA têm acordos de cooperação em defesa que remontam a 1950 e 2022, respectivamente. Em fevereiro deste ano, os dois países também assinaram um acordo de defesa suplementar renegociado.
Por conseguinte, o antigo presidente salienta que muitos acreditam que a Finlândia deveria ter solicitado a adesão à OTAN há muito tempo.
“Esse tipo de pensamento foi valioso. No entanto, não teria havido consenso por trás dessa visão, dificilmente mesmo uma maioria, antes da primavera de 2022. Em retrospectiva, poderíamos dizer que colocamos a candidatura quando se revelou necessário. Além disso, parece também que não perdemos nada insubstituível antes disso”, diz Niinistö
Niinistö também deixa a presidência com algumas reflexões sobre a situação atual da política externa e de segurança.
A referência principal são as recentes declarações de Donald Trump sobre a OTAN nas eleições presidenciais norte-americanas – como encorajar a Rússia a atacar os Estados-membros que não contribuem financeiramente o suficiente para a aliança.
“Neste momento, devido às eleições nos EUA, há preocupação com o futuro da OTAN. O comentário “eles têm de pagar as suas contas” foi provavelmente redigido para uso interno, mas há muitas razões pelas quais os parceiros europeus também o deveriam ouvir. Já é tempo de despertarmos para garantir o estado de paz, ou seja, de nos fortalecermos”, afirma Niinistö.
A posição anterior do governo de centro-esquerda, partilhada pelos seus principais partidos, era de que o país não deveria aderir à OTAN. Em 2022, a ex-primeira-ministra da Finlândia, Sanna Marin — uma social-democrata de esquerda — deu uma entrevista confirmando que a adesão da Finlândia à OTAN era improvável.
Um novo status quo
A guerra contra a Ucrânia alterou completamente o status quo finlandês. Enquanto a adesão à OTAN era uma perspectiva remota antes da invasão, esta mudança radical começou já durante os meses em que a Rússia reuniu as suas tropas perto da Ucrânia e fez os seus ultimatos. A decisão formal de solicitar a adesão ocorreu em seguida.
Uma pesquisa iniciada em 23 de fevereiro de 2022, um dia antes da guerra russo-ucraniana eclodir, revelou que o apoio à adesão à OTAN era de pouco mais de 53%, e os números só cresceram desde então. O então secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg, antigo primeiro-ministro da Noruega, indicou que a Finlândia receberia garantias de segurança durante o processo, que foi acelerado.
A esquerda finlandesa está dividida. Mesmo na Aliança de Esquerda, o maior partido à esquerda dos Social-democratas, a mudança de opinião levou o líder do partido a anunciar que a adesão à OTAN deixaria de ser uma questão decisiva para a participação governamental.
Existem também alguns opositores à adesão à OTAN do outro lado do espectro, tanto entre os populistas de direita como entre os conservadores mais tradicionais, que preferem conservar a neutralidade tradicional da Finlândia. Por exemplo, o ex-ministro das Relações Exteriores Paavo Väyrynen, do Partido do Centro (a segunda maior força no país), é um opositor de longa data da OTAN e não tem medo dessa opinião – embora seja atualmente uma minoria entre seu partido.