Um dos países mais atingidos pelo surto de ebola, a Libéria pôs em prática nesta quarta-feira (20/08) uma série de drásticas medidas para tentar impedir o vírus de se espalhar ainda mais. Após o anúncio das ações — que incluem toque de recolher noturno e o isolamento de um bairro inteiro na capital Monróvia —, foram registrados confrontos violentos entre a população e as forças policiais na maior cidade do país.
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Forças policiais da Libéria cercaram, isolaram e colocaram em quarentena o populoso e pobre bairro de West Point, na capital do país
O último cálculo da OMS (Organização Mundial da Saúde) contabiliza 1.350 vítimas fatais, o que representa o mais grave surto já registrado — o total de casos identificados supera todos os outros surtos somados desde que o vírus foi descoberto, em 1976. Apenas nos últimos dois dias, 106 pessoas morreram pela doença; 95 delas, na Libéria.
A instituição de saúde ligada à ONU (Organização das Nações Unidas) considera a situação no país a mais grave entre os países da África Ocidental, determinando ser vital frear a propagação do vírus para conter o surto, que também afeta Guiné, Serra Leoa e, em menor grau, Nigéria.
De repente, ilhados
Na Libéria, os esforços para conter o surto já se transformaram em violentos confrontos hoje no bairro de West Point, na capital Monróvia, região que foi posta em quarentena e isolada pela polícia local. As forças de segurança usaram munição real e bombas de gás lacrimogêneo para conter a multidão, que tentava abandonar o bairro pobre.
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“Isso aqui está uma bagunça”, disse ao jornal The New York Times o coronel Abraham Kromah, chefe de operações policias na Monróvia, enquanto reclamava da multidão. “Eles machucaram um dos meus policiais”, disse, justificando-se ao repórter diante de um jovem de 15 anos estirado no chão por conta da perna machucada, aparentemente atingida por uma bala.
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Garoto liberiano de 15 anos sofreu ferimento em meio a confrontos de população com a polícia no bairro de West Point, posto em isolamento
“Os soldados estão usando munição real”, alertou à agência Reuters Dessaline Alisson, porta-voz do Exército. O oficial ressaltou, entretanto, que os militares seguem estritamente a legislação, e “não dispararam contra cidadãos pacíficos”.
Os moradores de West Point, por sua vez, reclamam que não foram previamente informados da medida. “Vimos o bloqueio esta manhã”, diz Alpha Barry, também à Reuters. Além de extrema por conta do surto do vírus, a situação fica ainda mais grave pois muitos residentes locais não têm provisões necessárias para aguentar o período de quarentena. “Não temos comida, estamos assustados”, completa Barry.
Toque de recolher
“Desde esta quarta-feira, 20 de agosto, haverá um toque de recolher de 21h às 6h”, disse a presidente da Libéria, Ellen Johnson-Sirleaf, em discurso à nação. Desde o início do surto, já são 466 pessoas mortas no país.
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Segundo a presidente liberiana, que pediu a colaboração dos cidadãos, as medidas “buscam salvar vidas e tornar os esforços do governo para combater a doença mais efetivos e rápidos”. Também foi decretado o fechamento de todos os centros de lazer, incluídos os vídeo clubes, a partir das 18h.
A presidente elogiou “alguns sucessos” na luta contra o surto, mas reconheceu, visivelmente contrariada, que o país está longe de ter controlado a extensão do vírus devido à negação do problema, a resistência de abandonar os enterros tradicionais e a seguir os conselhos dos médicos e do governo.
Foi justamente na Libéria que, nesta semana, um centro médico de quarentena foi invadido por um grupo de pessoas, permitindo a fuga de pacientes infectados e levando colchões, lençóis e outros objetos manchados de sangue e contaminados pelo vírus. No fim, os 20 pacientes que haviam fugido do local já foram localizados pelas autoridades da Libéria.
Agência Efe
Corpo de uma vítima do vírus ebola em Monróvia, capital da Libéria, cujo centro de quarentena foi atacado ontem
Os jovens que invadiram o centro de quarentena estavam armados com porretes e gritavam “não há ebola na Libéria”. A descrença na doença e a resistência em acatar as recomendações das autoridades de saúde com relação ao tratamento que deve ser dispensado aos corpos têm agravado a situação na Libéria.
Isso porque a tradição no país impede que o caixão seja lacrado. Além disso, os corpos são lavados, fazendo com que as pessoas tenham contato com sangue e secreções corporais das vítimas e também contraiam o vírus.
O ebola, transmitido por contato direto com sangue ou fluidos corporais de pessoas ou animais infectados, causa hemorragias graves e tem uma taxa de mortalidade que chega aos 90%.
(*) Com informações da Agência Efe