Apesar da série de protestos que agitam Israel há várias semanas, o Parlamento do país aprovou na manhã desta quinta-feira (23/03) a primeira lei da reforma judicial desejada por Benjamin Netanyahu. O texto é considerado pela oposição como sendo “sob medida” para o premiê evitar ser considerado inapto para exercer o cargo.
Milhares de pessoas voltaram às ruas nesta quinta, em uma mobilização marcada por confrontos entre manifestantes e policiais. Dezenas de manifestantes foram presos por “perturbar a ordem pública” em Tel Aviv, segundo a polícia. As forças de ordem usaram canhões de água para dispersar a multidão que havia bloqueado o anel viário da cidade, segundo um jornalista da AFP no local.
Vários milhares de pessoas também se reuniram em Jerusalém, em frente à residência do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, de acordo com a imprensa israelense. A polícia não forneceu uma estimativa do número de manifestantes.
A quinta-feira havia sido batizada de “Dia da Paralisia Nacional” pelos organizadores das manifestações, que se sucederam todas as semanas desde a apresentação pelo ministro da Justiça, Yariv Levin, de um projeto de reforma que divide o país. O projeto visa aumentar o poder dos políticos eleitos sobre os magistrados. Segundo seus detratores, ele põe em risco o caráter democrático do Estado de Israel.
Outros protestos menores foram realizados em Haifa, no norte do país, e em Beer Sheva (sul).
Menos poder para a Suprema Corte
Benjamin Netanyahu e seus aliados de extrema direita e ultraortodoxos argumentam que a reforma é necessária para restaurar um equilíbrio de poder entre os eleitos e a Suprema Corte, que consideram politizada.
A primeira lei desta reforma foi aprovada pelo Knesset na manhã de quinta-feira. O texto reduz as possibilidades de declarar um primeiro-ministro inapto. A Justiça não poderá mais ordenar o afastamento do líder do Governo.
World Economic Forum/Valeriano Di Domenico
A partir de agora, o chefe do Executivo só pode ser declarado inapto em caso de incapacidade física ou mental
A partir de agora, o chefe do Executivo só pode ser declarado inapto em caso de incapacidade física ou mental, e isto apenas em dois casos: se ele próprio fizer um pedido ou no final de um processo instaurado pelo governo, com a aprovação de uma maioria de três quartos dos ministros.
A oposição denunciou uma nova lei feita “sob medida” para Benjamin Netanyahu. “A coalizão aprovou agora uma lei pessoal, obscena e corrupta contra um boato infundado de impeachment”, disse o líder da oposição Yair Lapid, referindo-se a um recente rumor de que a Procuradoria-Geral de Israel teria cogitado forçar a renúncia de Benjamin Netanyahu. Para Lapid, “mais uma vez, Netanyahu só se preocupa consigo mesmo”.
A nova lei “limita efetivamente as possibilidades de declarar um primeiro-ministro inapto para o cargo”, disse à AFP Guy Lurie, pesquisador do Instituto Democrático de Israel, um centro de pesquisa em Jerusalém “Razões diferentes das especificadas na emenda não serão mais admissíveis”, complementou.
Histórico
Lurie lembra que a questão da incapacidade do primeiro-ministro surgiu quando Ehud Olmert, chefe do governo de 2006 a 2009, foi “interrogado pela polícia” por um caso de corrupção, antes de renunciar ao cargo. Era, então, uma questão “de saber se podia continuar a exercer o posto”.
“O Supremo Tribunal tinha, na época, rejeitado uma petição que pedia a declaração de Olmert inapto, mas deu a entender que um conflito de interesses poderia ser considerado um [motivo de] incapacidade”, relembra o pesquisador.
No início de fevereiro, uma ONG anticorrupção entrou com uma petição na Suprema Corte para que Benjamin Netanyahu fosse destituído do cargo. Em sua denúncia, a ONG afirmou que a sua função como primeiro-ministro o coloca numa situação de conflito de interesses devido ao processo que enfrenta por diferentes suspeitas de corrupção.