Em busca de uma agenda ambiental para chamar de sua, o governo Bolsonaro deu destaque durante a COP27 a um programa criado em 2003, na gestão de Lula. Trata-se do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que promove a compra de produtos da agricultura familiar por todo o país e foi peça chave para retirar o Brasil do Mapa da Fome.
Rebatizado de “Alimenta Brasil” sob Bolsonaro, o programa agora está esvaziado e teve o orçamento de 2023 cortado em até 97%. Sobraram apenas R$ 2,6 milhões para fazer a compra dos alimentos produzidos por pequenos agricultores também de comunidades indígenas e quilombolas na Amazônia, reforçando a economia sustentável. Na prática, o corte impossibilita a execução da política pública para o ano que vem.
Segundo dados do ministério da Cidadania compilados em agosto deste ano, o número de agricultores beneficiados caiu de aproximadamente 77 mil em 2016 para 16 mil em 2022. Neste ano, o programa só funcionou por causa do aporte de recursos feito pela emenda constitucional que garantiu uma série de benefícios às vésperas da eleição, a chamada PEC dos Auxílios.
“Reduziu e muito, muito mesmo”, relata Zelandes Alberto Oliveira, indígena do povo Patamona, secretário de Saúde em Uiramutã (RR). Localizado dentro dos limites da TI Raposa Serra do Sol, o município de cerca de 11 mil habitantes tem a maior proporção de população indígena do país.
“Para você ter uma ideia, no ano passado, 2021, o recurso que foi disponibilizado para agricultura familiar veio num montante para atender apenas 16 famílias no município de Uiramutã”, conta ele.
Mesmo assim, esse foi um dos exemplos positivos apresentados pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, na primeira semana da COP27, realizada no Egito. No evento, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é um dos convidados mais aguardados pelas delegações presentes. Bolsonaro não compareceu nessa e em nenhuma edição do encontro.
No Twitter, Joaquim Leite publicou: “Recebemos também durante a COP27 o ministro Ronaldo Bento, da Cidadania, para falar sobre o Programa Alimenta Brasil, que tem como objetivo garantir alimentação de qualidade a famílias vulneráveis e incentivar a agricultura familiar”.
Divulgação/Twitter/Joaquim Leite
Joaquim Leite, do Meio Ambiente, e Ronaldo Bento, da Cidadania: ministros de Bolsonaro na COP27
Produtores de alimentos passam fome na Amazônia
Dados recentes mostram que a população do campo é proporcionalmente mais atingida por formas severas de insegurança alimentar, em comparação com a urbana. Isso significa que aqueles que plantam alimentos para abastecer as cidades brasileiras – os pequenos agricultores – estão comendo menos do que precisam.
O quadro mais grave entre as zonas rurais é o do Norte brasileiro. Na macrorregião que abriga 80% da Amazônia, a insegurança alimentar grave e a moderada estão presentes em 54,6% dos lares de agricultores familiares. Na sequência vêm Nordeste (43,6%), Centro-Oeste (38,6%), Sudeste (22,1%) e Sul (13,8%). Os dados são da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan).
O Brasil de Fato já reportou os desafios enfrentados por produtores rurais do município de Lábrea, no sul do Amazonas. “É muito difícil até comer feijão, porque ninguém aguenta comprar”, diz Manoel Souza da Silva, presidente da associação do assentamento São Francisco. “Quando você compra dois ou três quilos de feijão no mês, é uma fortuna para nós. Tem que regrar aquele feijão para comer. Porque nós não temos como comprar”, relata o agricultor.