A reforma da previdência apresentada pelo presidente francês Emmanuel Macron já era polêmica por si só, com um texto que era rechaçado por grande parte da cidadania, como foi visto nos frequentes protestos massivos no país nos últimos dias, e se tornou ainda mais controversa com sua aprovação nesta quinta-feira (16/03), já que o governo decidiu fazê-lo através da aplicação do artigo 49.3 da Constituição francesa, que permite sancionar um projeto de lei sem que ele seja votado no parlamento.
Para aumentar ainda mais a crise política no país, a decisão foi anunciada pela primeira-ministra Élisabeth Borne, principal funcionária do gabinete de Macron já que também preside o Conselho de Ministros, que se reuniu horas antes daquela que seria a votação decisiva do projeto na Assembleia Nacional francesa.
Os rumores que circulavam na imprensa francesa até o dia anterior apontavam a que não haveria votos suficientes para a aprovação do projeto nesta quinta, situação que alguns analistas consideram que foi confirmada pela decisão abrupta do governo, já que a utilização do artigo 49.3 só se justifica como forma de impedir um possível fracasso legislativo.
A reforma das aposentadorias foi apresentada por Macron em janeiro deste ano, junto com a própria primeira-ministra Borne, encarregada de liderar o trabalho junto ao Legislativo para aprovar o projeto.
O principal aspecto da proposta governista, e que tem gerado maior repúdio por parte da opinião pública, é o aumento gradual da idade de aposentadoria: segundo o texto, a partir de setembro de 2023, a idade mínima passará de 60 anos para 60,5 anos, em 2024 passará a 61 anos, e assim seguirá crescendo até chegar a 64 anos em 2030.
Twitter / Macron
Governo de Macron usou polêmico artigo para garantir aprovação da reforma sem precisar de votação na Assembleia Nacional
Moção de censura e novos protestos
Os membros da Assembleia Nacional francesa vaiaram a primeira-ministra Borne quando esta anunciou a utilização do artigo 49.3 e a suspensão da votação desta quinta.
Mas as vaias são o pior dos problemas para o governo depois da inesperada medida. O ex-deputado Jean-Luc Mélenchon, líder do partido França Insubmissa, disse ao jornal Le Monde que a bancada dos partidos de esquerda vão apresentar uma moção de censura contra a primeira-ministra, instrumento que, se aprovado, pode significar a destituição de Borne, além de tornar sem efeito a utilização do artigo 49.3 e a consequente aprovação do projeto sem aval parlamentar.
Minutos depois, foi a vez de Marine Le Pen, líder da extrema direita francesa, anunciar, também ao Le Monde, que seu grupo político também apresentaria uma moção de censura. Segundo a imprensa francesa, diferentes setores da Assembleia Nacional, desde a esquerda até a extrema direita, estariam negociando para que a moção seja apresentada em conjunto.
Enquanto isso, centenas de milhares de pessoas se reuniram em Paris e outras cidades do país para realizar protestos contra a manobra constitucional do governo de Macron, reforçando um movimento que já se via massivo há vários dias, mostrando a rejeição da população francesa ao projeto.