No final do viaduto Maria Paula, está localizado um imponente edifício construído nos anos 1950 e que já abrigou o Instituto de Engenharia e a Fiesp. Nos anos 1980, ele assumiu a função de abrigar vários órgãos jurídicos e, em 2003, recebeu a configuração que tem hoje, com 14 varas da Fazenda Pública e seis de Acidentes de Trabalho. Chegaram também duas varas do Juizado Especial da Fazenda Pública, o Setor de Cartas Precatórias e o Setor de Execuções contra as Fazendas Públicas. O prédio então ganhou um nome estranho para quem se autoproclama o lugar do direito público da cidade. O edifício, com elegante arquitetura clássica, passou a se chamar Fórum Hely Lopes Meirelles (1917-1990).
Marcelo Camargo/ ABr
Dedicado ao Direito Público, prédio do TJ paulista homenageia idealizador de aparelhos da repressão durante a ditadura
Hely Lopes Meirelles ficou conhecido como um grande doutrinador do Direito Administrativo. Apesar de sua página na Wikipedia não mencionar o fato, foi secretário de Estado dos Negócios da Segurança Pública do Estado de S. Paulo entre os anos de 1968 e 1969, quando Roberto de Abreu Sodré governava o estado. Na presidência da república, estava o marechal Arthur da Costa e Silva. Esses foram os dois dos anos mais duros da repressão militar. Foi exatamente durante esse período que a gestão de Hely Lopes Meirelles ajudou a idealizar o papel repressivo das forças de Segurança Pública.
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Depois do AI-5, a secretaria de Segurança Pública de São Paulo começou a pensar num plano para debelar os que resistiam à Ditadura Militar. O projeto, proposto pela pasta de Meirelles e publicado no Diário Oficial da cidade, era aumentar o orçamento para a SSP (para a montagem da Oban), passando por reuniões com empresários de fora do estado de São Paulo e do país, e culminando na resolução que porteiros e zeladores de prédios deveriam auxiliar a segurança pública, num esdrúxulo decreto intitulado “Regimento Especial de Zeladores e Porteiros de Edifícios de Apartamentos”, datado de 19 de setembro de 1969.
Reprodução/ YouTube
Hely Lopes Meirelles, idealizador da Operação Bandeirantes na ditadura militar
Hely Lopes Meirelles deixou o cargo no dia 29 de agosto de 1969. Foi substituído pelo general Olavo Viana Moog, que intensificou o plano de Meirelles e também as relações com o Exército. Mas não deixou governo. No dia 3 de setembro de 1969, ele assumiu como Secretário de Estado dos Negócios da Justiça, onde ficou até 15 de março de 1971.
Escrevi tudo isso porque sempre ao passar pelo bonito prédio no centro da cidade, eu me lembro de quem foi Hely Lopes Meirelles. Jurista renomado nos dias de hoje, estudado nas faculdades de Direito de todo o país, quem pensou o plano de segurança pública que incluiu a terrível e sanguinária Operação Bandeirantes. Foi também na sua época que toda a polícia foi restruturada – a Polícia Militar unificou a antiga Força Pública com a Guarda Metropolitana e, também nessa época, é criada a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar). Ele, justamente Hely, foi ganhar o nome do prédio de Direito Público em São Paulo.
É um escárnio.
Ontem, ao assistir à sessão do STF e pensar nos longos meses de desmandos do juiz Moro, chego à conclusão de que ainda vivemos sob o judiciário da Ditadura. A Justiça de hoje é a mesma que deu aval para se prender e torturar os que lutavam contra o regime militar. É a mesma Justiça da Ditadura, com pequenas ilhas de lucidez. Pois é claro que é essa Justiça, com a ajuda de congressistas venais, que coloca a democracia em xeque. Talvez xeque-mate.
À Espera da Verdade – Empresários, juristas e elite transnacional – histórias de civis que fizeram a ditadura militar
Autores: Joana Monteleone, Haroldo Ceravolo, Vitor Sion, Felipe Amorim, Rodolfo Machado.
Preço: R$ 49.
Páginas: 302.
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(*) Joana de Moraes Monteleone é historiadora e uma das autoras do livro “À espera da verdade – Empresários, juristas e elite transnacional – civis que fizeram a ditadura militar”.
Texto publicado originalmente no Painel Acadêmico