A advogada criminalista Valeska Teixeira Martins criticou, em conversa no mês de outubro com estudantes de jornalismo do curso “Repórter do Futuro” da Oboré, em São Paulo, os abusos de direitos humanos envolvendo muitos dos processos da Operação Lava Jato. Ela condenou a maneira pela qual as conduções coercitivas e prisões preventivas temporárias são executadas, assim como o uso excessivo de delações premiadas.
“A lei, quando mal utilizada, mata reputações, retira bens. Esta má utilização para fins políticos tem que acabar”, afirmou Valeska, que considera que “o Brasil voltou a virar um estado violador dos direitos humanos”.
“Tem presos sem julgamento há mais de dois anos, o que é um escândalo numa sociedade democrática, é uma tortura. Prender para obter confissão é tortura”, afirmou . “Agora nós observamos essa ‘indústria de delação premiada’ que não é somente a delação, mas uma ‘mentira premiada’, já que se dá fora dos ditames da lei”, afirmou Valeska. “Na cadeia, na prisão preventiva você só consegue sair se delatar. Mas delatar o quê?” Para ela, “a delação premiada não é base para condenação de ninguém, ela é um indício que tem que ser corroborado por documentos, então não é a palavra do procurador que vai valer para a condenação”.
Valeska também criticou as conduções coercitivas. Para ela, o que se viu foi a Lava Jato “matando reputações”. Ela explica que a medida só pode ser tomada em casos onde o investigado tenha se negado a comparecer à Justiça após intimação, procedimento que não tem sido respeitado em muito dos casos que envolvem a operação.
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O ministro Gilmar Mendes, em entrevista à rádio Zero Hora, também criticou o uso excepcional de medidas da Lava Jato. Mendes afirmou que a prisão preventiva “não é para que a pessoa delate ou faça a confissão de crimes (…) Não me parece que nós devamos admitir um estado excepcional apenas por conta da Lava Jato. O combate da corrupção não é mérito da Lava Jato”.
Segundo matéria do jornal O Estado de São Paulo, o número de conduções coercitivas cresceu 304% após a criação da Lava Jato. A partir de 2014, quando teve início, a Polícia Federal registrou 2.278 casos deste procedimento. A medida é contestada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Caso do reitor da UFSC
Em setembro deste ano, o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) foi preso em uma operação da Polícia Federal, suspeito de participação no desvio de recursos que deveriam ser investidos em programas de educação a distância. Luiz Carlos Cancellier foi liberado no dia seguinte, mas continuou afastado da Universidade por decisão judicial.
Eleito reitor no ano passado, após o processo, Cancelier foi proibido pela Justiça de entrar na UFSC e foi vítima de uma série de especulações que culminaram em seu suicídio, em outubro.
Para ela, os métodos adotados na Lava Jato abriram precedentes para que outros juízes do Brasil passassem a deixar de seguir a lei. “Este tipo de comportamento está criando franquia. Hoje em dia, juízes do Brasil inteiro estão seguindo o mesmo modus operandi da Operação Lava Jato.”
Sobre o caso do reitor, a advogada afirmou que “houve uma condução coercitiva e uma prisão preventiva fora da lei. Isso está matando reputações e está matando pessoas. Nós não podemos deixar que isso continue acontecendo.”
(*) Tiago Angelo participa do Projeto Repórter do Futuro, que tem o objetivo de oferecer alternativas de autodesenvolvimento e incentivar as carreiras dos futuros repórteres. Saiba mais sobre o projeto aqui.