Nova geração africana está na base de mudanças na ordem geopolítica
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Segundo o OIA (Instituto Oxford de Envelhecimento), que em 2008 publicou a Pesquisa sobre o Envelhecimento Global, mudanças fundamentais nas estruturas demográficas da sociedade irão afetar a ordem geopolítica no século 21. O OIA apresenta outros pontos – como o de que o envelhecimento geral da população mundial irá mudar o modo como vivemos e trabalhamos, nossos planos de saúde e sistemas educacionais, padrões de economia e consumo e transporte —, mas, de alguma forma, é a parte sobre a nova ordem geopolítica que se sobressai. Mudanças estruturais em um país já serão suficientemente difíceis de enfrentar. Mas uma mudança na ordem geopolítica? Isto é completamente diferente.
Na superfície, as forças que irão direcionar esta mudança geopolítica à medida que avançamos no século 21 são suficientemente simples de se compreender. Para que os países envelheçam, as pessoas precisam ter menos filhos; no mundo desenvolvido, as pessoas não têm tido filhos o suficiente para repor a população que morre ou morrerá. Isto significa que o mundo em desenvolvimento, em breve, terá muito mais gente jovem compondo sua força de trabalho, e esta será uma força de trabalho mais enérgica, o que lhe dará uma vantagem inerente sobre o mundo desenvolvido.
É claro, a realidade é um pouco mais complicada. Um artigo publicado na revista New York Times, em 17 de outubro de 2010, explica o motivo: “Hoje, muitos dos países que mais envelhecem estão no mundo em desenvolvimento, principalmente porque é ali que a urbanização ocorre em maior velocidade. É difícil conceber uma situação em que as pessoas voltem para o campo e tenham famílias grandes novamente. Em vez disso, os países jovens de hoje, como a China, serão aqueles que em um futuro não muito distante procurarão por trabalhadores mais jovens em outros lugares. Estes lugares serão completamente transformados à medida em que satisfaçam as necessidades da China mais velha, e o ciclo se repetirá: quando o mundo encontrar sua próxima terra de jovens, este país poderá envelhecer ainda mais rápido do que aqueles que o precederam”.
Pelo menos no que tange à África, isto pode ou não ser boa notícia a médio prazo. De acordo com o Departamento de Referência Populacional (Population Reference Bureau), um órgão de análise de dados e pesquisa dos Estados Unidos, a Etiópia e a República Democrática do Congo substituirão a Rússia e o Japão na lista dos 10 países mais populosos do mundo até 2050. Até lá, espera-se que a população da África seja mais do que o dobro da atual – de acordo com o departamento, o continente abrigará 2,1 bilhões de pessoas, em oposição aos 1,48 bilhões da China (ligeiramente mais do que seus 1,3 bilhões atuais). A implicação desta previsão é a de que a China está envelhecendo muito mais rápido do que a África, e pode muito bem sair “em busca de novos trabalhadores” no continente, o que pode, por sua vez, beneficiar as economias dos países de origem dos trabalhadores africanos. O outro lado da moeda é que se a China e outros centros econômicos levarem uma parte muito grande dos jovens africanos, os países do continente podem sofrer.
Oportunidade para o continente
Novamente, não importa o que ocorra, a realidade será muito mais complexa do que as opiniões apresentadas acima. Para início de conversa, a África, até o momento, viu pouco ou nenhum benefício direto da ida de centenas de milhares de seus jovens para a Europa em busca de uma vida melhor. A Europa Ocidental pode ter porcentagens expressivas entre os países do mundo com as mais velhas populações, mas esses países não estão contando com a África para incrementar sua força de trabalho – na verdade, estão colocando mais barreiras para conter o fluxo de imigrantes africanos. Será que o quadro vai mudar à medida que nos aproximamos de 2050, quando a idade média do europeu ocidental terá passado de pouco mais de 40 anos para 50? Talvez. Mas até lá os avanços nas ciências médicas e na nanotecnologia poderiam fazer com que as próprias forças de trabalho europeias possam continuar em atividade, mesmo depois da atual idade de aposentadoria.
As variáveis desconhecidas são numerosas demais para que consigam tornar significativas as previsões com base no panorama atual. O que está fora de questão, no entanto, é que há uma oportunidade sem precedentes para o continente africano no fato de que apenas 5% de sua população terá 65 anos ou mais até 2050. Comparativamente, 16% da população mundial terá 65 anos ou mais até o meio do século, com a Europa como o mais grisalho dos continentes, com 29%.
Enquanto a geração de baby boomers, no Ocidente, e a da “Guarda Vermelha”, na China, envelhecem sem que seus filhos possam fornecer apoio, a tensão sobre as nações mais poderosas começa a ser sentida. Em grande medida, a Europa Ocidental, a América e a China construíram e sustentaram suas economias sobre o vigor jovem de sua população. Se uma jovem África mostrar a mesma capacidade de previsão que a jovem China mostrou nos últimos 30 anos – e não há razão para acreditar que isso não acontecerá, levando-se em conta os estreitos vínculos estabelecidos entre os dois desde a virada do milênio –, as vantagens para as nações africanas poderão ser enormes.
Tradução por Henrique Mendes
* Texto publicado originalmente no site sulafricano Daily Maverick
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