No programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta quarta-feira (04/05), o jornalista Breno Altman entrevistou a cientista política Isabel Mansur, autora do livro Corda bamba: o lulismo como metamorfose e realização da estratégia democrático-popular (Editora Lutas Anticapital), sobre o surgimento e as transformações do Partido dos Trabalhadores.
Para ela, a legenda nasceu com uma natureza marxista e revolucionária, ainda que não se reivindicasse socialista: “acho que era inclusive um partido que nascia com reflexões no sentido de superar as estratégias anteriores da esquerda socialista”.
Aliás, o rótulo de socialista não foi adotado justamente porque “o PT tinha uma preocupação mais voltada para críticas às estratégias anteriores a sua própria fundação”.
Mansur contou que as experiências da revolução cubana, nicaraguense e o próprio governo de Salvador Allende, no Chile, influenciaram a formulação do PT, que acabou amadurecendo para se tornar um partido também anti-imperialista.
Assim, a legenda adotou uma posição chamada de democrática-popular, em contraponto à estratégia democrática-nacional desenvolvida pelo PCB.
“As duas se aproximam muito, na verdade. Mas o elemento central da estratégia democrática-nacional era de fazer uma aliança com a burguesia nacional para suprir as incompletudes que o capitalismo brasileiro apresentava. A estratégia democrática-popular entendia que a burguesia não foi capaz de levar a cabo esse objetivo, então era a classe trabalhadora e o PT quem deveriam realizá-lo”, explicou.
Naquela época, década de 80, o projeto petista supunha uma ruptura. Entretanto, o partido sofreu uma metamorfose, que, para a cientista política, foi fruto do entendimento de o capitalismo brasileiro estava incompleto. De modo que a estratégia democrático-popular acabou dando continuidade à democrática-nacional.
Metamorfose
Esse chamado giro estratégico a partir dos anos 90, de caráter reformista, se deu, de acordo com Mansur, por causa da queda do muro de Berlim e o avanço do capitalismo, assim como as críticas que foram incorporadas sobre a falta de democracia e de liberdade de mercado que se dizia haver na União Soviética.
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Cientista política explica mudança estratégica do Partido dos Trabalhadores
“Acho que a partir daí podemos falar em um social-liberalismo, com particulares evidentemente. Sem o elemento de ruptura revolucionária, mas ainda com governabilidade popular”, ponderou.
Mesmo assim, para ela, “o PT mudou de natureza”. Não deixava de ser um partido de massas, popular, da classe trabalhadora, “mas virou um partido da ordem”, que aposta na institucionalidade e no desenvolvimento de sua estratégia democrático-popular com alianças com frações da burguesia.
“O lulismo tem um lugar específico na possibilidade de equilíbrio dessa estratégia e dessas alianças. Por isso chamei meu livro de ‘corda bamba’, porque isso não se produziu com outras figuras. Tanto que ele não sofreu um golpe, quem o sofreu foi Dilma Rousseff”, reiterou.
Segundo a cientista política, o partido acreditou que a metamorfose da estratégia, materializada no lulismo, poderia equilibrar a correlação de forças, evitar uma contrarreforma, mas não foi o que aconteceu. A conciliação funcionou apenas sob Lula.
“E agora o PT apresenta hoje um novo governo Lula calcado nessa mesma estratégia: um lulismo talvez até mais rebaixado, sofrendo pressões do centro e da extrema direita”, lamentou.
Mansur alertou que isso pode acarretar no mesmo impasse que levou à derrota de 2016 e de forma mais acelerada, “é a corda bamba sobre a qual está colocada a esquerda brasileira”.
O desafio, portanto, em sua opinião, será conseguir construir força social, se reorganizar para enfrentar um período de um novo governo popular com ainda menos sustentação. Ela descartou uma guinada à esquerda, “porque o novo governo Lula vai sofrer muito mais pressão da direita. Acho que o que cabe à nós é se organizar socialmente para disputar os rumos desse novo momento”.