“A mão não pode tremer diante do neofascismo”, afirmou o historiador Valério Arcary ao defender a união das esquerdas brasileiras em torno da coalizão liderada por Luiz Inácio da Silva para as eleições de 2022.
Em conversa com o jornalista Breno Altman no programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta quarta-feira (13/07), ele defendeu prioridade total à reconquista de hegemonia nas ruas contra a extrema direita liderada por Jair Bolsonaro.
Lançando o livro Ninguém Disse Que Seria Fácil (Editora Boitempo), de ensaios escritos ao longo dos anos de derrotas da esquerda a partir do golpe de 2016, Arcary afirma que o resultado da campanha eleitoral dependerá diretamente da mobilização de milhões de brasileiros.
“Será um movimento de luta de classes, e o lugar do PSOL [Partido Socialismo e Liberdade] é cerrando fileiras com os mais moderados da esquerda, os reformistas incorrigíveis, mesmo com Geraldo Alckmin”, admite.
Para o historiador, Lula é o “instrumento eleitoral para a derrota de Bolsonaro”, declarando que “nada é mais importante que a derrota de Bolsonaro”. Arcary justifica seu “giro político” inspirado pela convicção de que a esquerda precisa “levar a sério o combate contra a ameaça aniquiladora que representaria um segundo mandato para Bolsonaro”.
Arcary reconhece que a ideia da revolução socialista é minoritária hoje na esquerda brasileira e mundial e defende o caminho eleitoral e o acúmulo de forças pelas esquerdas revolucionárias diante da sucessão de derrotas recentes. “Nós tentamos em 2021, fomos sete vezes às ruas em grandes mobilizações nacionais, em 400 cidades. No ponto mais alto, em São Paulo, foram cerca de 100 mil pessoas, o que é claramente insuficiente para derrotar Bolsonaro”, disse.
Militante de esquerda desde que começou a ser formado pela Revolução dos Cravos em Portugal, em 1974, que acompanhou pessoalmente aos 22 anos, Arcary fez uma inflexão em 2018 ao deixar o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) rumo ao PSOL, onde integra a direção nacional.
Reprodução
Historiador Valério Arcary é o convidado de Breno Altman no programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta quarta-feira (13/07)
Hoje, defende não apenas o apoio a Lula na eleição presidencial, mas também a Fernando Haddad na disputa estadual pelo governo de São Paulo. “O PSTU mudou, eu também amadureci e fiz um balanço autocrítico. Mas o que mais mudou foi a realidade. A burguesia afirmou que não tolera mais nem sequer os governos moderados e reformistas do PT”, explica.
Cenário eleitoral 2022
A campanha de 2022 será quente porque o bolsonarismo não disputará com argumentos civilizados, e sim ao contrário: “Bolsonaro é a fúria do rancor histórico, a ira dos setores privilegiados que se sentem ameaçados por um movimento incontível. Só agora, depois de três anos e meio de flagelo, estamos vendo um movimento que tem paixão para derrotar Bolsonaro”.
O assassinato do militante petista Marcelo Arruda pelo bolsonarista Jorge José da Rocha Guaranho, em Foz do Iguaçu, no dia 9 de julho, marca para ele um novo ponto de inflexão e pode funcionar como um elemento de convocação para a volta da militância progressista às ruas.
“Temos fenômenos contraditórios. Há medo, como não poderia deixar de ser, mas paradoxalmente vemos ativistas dando um passo em frente e ocupando as primeiras trincheiras, onde a luta é mais difícil”, afirmou.
Citando a manifestação gigante em favor de Lula na Candelária, no Rio de Janeiro, dois dias antes do episódio de Foz do Iguaçu, Arcary afirma o papel crucial dos dirigentes partidários em garantir segurança nas próximas manifestações e difundir a consciência de que, riscos à parte, é hora de avançar.
Classificando-se como “otimista realista”, o historiador firmou convicção sobre o impacto que a crise do capitalismo terá sobre a consciência das massas, hoje acossadas pelos “quatro cavaleiros do apocalipse” capitalistas já em campo: “temos a peste, com a pandemia, a fome, o embrião de guerra mundial na Ucrânia e a catástrofe ambiental. A humanidade não caminha para o abismo sem resistir. Individualmente as pessoas cansam, quebram, ficam desanimadas, desistem. Mas as massas, não”, constata.