Diário, ontem, aqui no hospital, vi uma cópia pirata do filme Bacurau.
Eu pensava que ia odiar, mas odiei mais do que eu pensava.
É tudo errado nesse filme. Pra começar, o povo trata mal o prefeito, o Tony Junior, que é um político muito bom. Ele leva umas comidas, uns remédios, uns caixões e até uns livros lá para Bacurau. Pô, o que mais que aquele povo quer?
Outra coisa que eu achei ruim é que o filme fala mal de turista americano. Se é americano é bom, pô! É dólar, é civilizado, é top, é gold. Tá certo que os caras vieram pra matar. Mas pra aquele povo lá de Bacurau, ser alvo de Glock devia ser uma honra, talkei?
E aquele personagem, o Lunga. O que é aquilo? Um cangaceiro de unha pintada, cabelo comprido e colar de ouro? Não pode, pô! Cangaceiro tem que ser macho!
O personagem que eu mais gostei foi o alemão americano. Com aquele rifle e com aquele chapéu, até me lembrou o Olavo.
No tocante ao estilo, o filme é meio faroeste e isso eu achei bom. Mas os mocinhos têm que ganhar sempre. Nessa porcaria de filme, quem ganha é o índio, pô. Quer dizer, o índio, não, o nordestino. Bah, tanto faz, índio e nordestino é tudo a mesma coisa!
Outro defeito: cadê a milícia nesse filme? São os americanos? São os cangaceiros? Os cangaceiros não são, porque miliciano é tudo rico, mora em condomínio fechado, e os cangaceiros desse filme são pobretões.
Mas, de tudo, o que eu menos gostei foi do povo. Povo como personagem principal não dá. É que nem eu disse outro dia: “Quem gosta de pobre é o PT”. Eu quero ver é super-herói, não aquela gente de bermuda e chinelo. E mais: povo tem que ser bonzinho e coitado. Tem que ser magro, olhar pro chão, ter cara de almoço de urubu. Mas nesse filme, não. Nesse filme o povo é quem resolve as coisas. Aí não dá, pô!
Olha, Diário, eu gosto é de Vingadores, não de Vingativos!
(*) José Roberto Torero é escritor e jornalista, autor de livros como Papis et Circensis e O Chalaça. O Diário do Bolso é uma obra ficcional de caráter humorístico.
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