A vitória de Luis Arce nas eleições presidenciais da Bolívia, neste último domingo (18/10), ocorrem após um ano exato da última eleição presidencial no país, em outubro de 2019, quando o então presidente Evo Morales foi reeleito para um quarto mandato, em pleito que acabou sendo contestado pela OEA (Organização dos Estados Americanos), em um informe que serviu de base para o golpe de Estado que se concretizou no mês seguinte.
Devido a esta situação, o Celag (Centro Estratégico Latino-Americano de Geopolítica) decidiu fazer uma análise comparativa entre o relatório da OEA de 2019, que foi usado para justificar a campanha que levou ao golpe, e os resultados oficiais emitidos até o momento pelo TSE (Tribunal Supremo Eleitoral da Bolívia).
O resultado é desse exercício foi que a observação da Celag desmentiu os dois principais argumentos com os quais a OEA alegou que houve fraude em 2019.
Um dos aspectos da suposta fraude foi o suposto atraso na chamada “contagem rápida”. A Bolívia é um país onde mais de 60% das suas zonas eleitorais são consideradas setores rurais ou selváticos. Nesses lugares, a contagem dos votos é muito mais lenta, pois se trata de locais de onde a transmissão dos dados é mais difícil. Por isso, as eleições no país costumam ter uma primeira parcial que não é oficial, mas indicam uma tendência, na qual a grande maioria dos votos é proveniente de zonas urbanas.
Em 2019, essa contagem rápida demorou em ser entregue, em comparações com pleitos anteriores, mas foi anunciada por volta das 21h daquele dia 10 de outubro. Segundo a OEA, esse atraso seria “um indício de fraude”.
Porém, em 2020, a contagem rápida oficial, divulgada pelo órgão eleitoral, foi suspensa. A OEA não viu nenhuma irregularidade no cancelamento.
Ainda assim, depois da 0h em La Paz, pesquisas de boca de urna foram divulgadas apontando a vitória de Arce. Estas pesquisas, na Bolívia, são feitas normalmente a partir de boletins de urnas e costumam antecipar, com bastante precisão, o resultado da eleição.
Vantagem de 10%
O outro “problema” apontado pelo organismo regional foi o fato de que, na contagem rápida de 2019, Morales não tinha a vantagem de 10% sobre o segundo colocado, que é necessária para poder confirmar a vitória no primeiro turno, caso o líder também tenha alcançado mais de 40% dos votos válidos. Porém, após a contagem total, Evo já havia superado seu adversário, Carlos Mesa, por mais de 11 pontos de diferença.
Esse aumento na quantidade de votos de Evo foi considerado pela OEA como “uma diferença inexplicável”, que destacou 86 zonas eleitorais onde a tendência teria sido “anômala”. Porém, se comparado com eleições anteriores, percebe-se que Morales sempre demonstrou aumentar sua quantidade de votos no final da apuração. A maior parte das regiões rurais do país é composta de redutos eleitorais do seu partido, o MAS (Movimento Ao Socialismo), por serem locais com população indígena predominante.
E segundo a análise comparativa feita pela Celag, esse fenômeno voltou a se repetir em 2020, com a vantagem percentual a favor de Luis Arce crescendo nesta reta final da apuração, na medida que os votos de zonas eleitorais mais remotas vão chegando. E o mais importante, nas 86 zonas “anômalas” destacadas pela OEA em 2019, Arce ganhou com vantagem igual ou superior à de Morales.
O sociólogo Alfredo Serrano, diretor da Celag, afirmou que “a análise comprova que nunca houve fraude. Nós revisamos o resultado em 86 recintos que foram objetados pela OEA em Bolívia 2019, e comprovamos que o MAS efetivamente tem a mesma votação (ou até mais)”.