A queda do Muro de Berlim, um marco do fim da Guerra Fria e símbolo do desmantelamento do bloco socialista do leste europeu, aconteceu em 9 de novembro de 1989, depois de ter permanecido de pé por 28 anos. Conheça 25 fatos sobre a barreira que foi erguida no dia 13 de agosto de 1961 e dividiu a Alemanha:
1. Alemanha Oriental surgiu antes do Muro de Berlim
Ao contrário do que muitos pensam, a Alemanha Oriental (RDA, em português, ou DDR, em alemão), surgiu anos antes da construção do Muro – mais precisamente, em 7 de outubro de 1949. O novo país foi fundado nos territórios alemães sobre os quais a então União Soviética mantinha o controle após o fim da Segunda Guerra.
Era um contraponto direto a EUA, França e Reino Unido, que controlavam 3/4 do território e que, poucos meses antes, tinham ajudado a fundar a República Federal da Alemanha (RFA, em português, ou BRD, em alemão), de orientação capitalista.
No lado oriental, a capital era (a parte leste de) Berlim; no ocidental, a cidade de Bonn.
2. Mesmo com duas ‘Alemanhas’, Berlim ainda não era (fisicamente) dividida
Assim como aconteceu no país, Berlim foi ‘repartida’ em quatro partes entre EUA, Reino Unido e França a oeste, e a União Soviética, a leste. Como não havia uma barreira física, mesmo após a criação das duas ‘Alemanhas’, havia certa liberdade de movimento entre as zonas, por mais que o controle (especialmente de leste a oeste) tenha sido aumentado gradativamente. O metrô, com várias linhas que iam de um lado a outro, circulava normalmente.
Vale lembrar: Berlim ficava integralmente dentro da Alemanha Oriental, mas acordos após o fim da guerra permitiam, sob certas condições, o trânsito da Alemanha Ocidental para a cidade.
3. Stalin tentou reunificar a Alemanha
Em março de 1952, o então líder soviético, Josef Stalin, enviou uma proposta para as forças capitalistas: tratado de paz e eleições livres em uma Alemanha reunificada. A condição era que o novo país não poderia entrar em nenhuma aliança militar contra os antigos ocupantes.
As forças de ocupação ocidentais, com o apoio do então chanceler alemão ocidental Konrad Adenauer, recusaram o plano, sob a alegação de que a proposta, na verdade, só serviria para prejudicar a integração com o ocidente e dificultar o rearmamento da BRD. Até hoje, é ponto de discussão entre historiadores se essa decisão não teria sido a melhor chance de reunificar o país.
4. Antes do muro real, um muro ‘virtual’
Com a recusa, Stalin chamou Walter Ulbricht, então primeiro-secretário do Comitê Central do Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED, em alemão) para uma reunião em Moscou.
O líder soviético deu dois conselhos: “organizar o próprio Estado” e “reforçar a proteção da fronteira” entre os dois países. Pouco tempo depois, em 26 de maio de 1952, os líderes orientais fecharam a fronteira interna entre as zonas no país e estabeleceram perímetros máximos de circulação de estrangeiros dentro da área sob controle soviético – em uma espécie de “muro virtual”.
5. Soberania da Alemanha Ocidental
No mesmo 26 de maio de 1952, um tratado dava soberania (mesmo que relativa) à Alemanha Ocidental, permitindo que o país entrasse na Otan (Aliança do Tratado do Atlântico Norte) três anos depois.
6. Berlim continuava aberta
A fronteira interna entre os dois países havia sido fechada, mas ir de um lado para o outro não era muito difícil: bastava viajar a Berlim. A cidade continuava dividida, mas atravessar de uma zona a outra não era tão complicado. Isso preocupava Ulbricht.
7. Morte de Stalin atrasou construção do Muro de Berlim
Em janeiro de 1953, Stalin havia acertado com Ulbricht a colocação de guardas na divisa entre as zonas soviética e dos outros ocupantes em Berlim. Segundo a historiadora Hope M. Harrison, professora da George Washington University, no livro Driving the Soviets up the Wall, os homens seriam colocados para “acabar com o acesso descontrolado a Berlim Oriental a partir dos setores ocidentais” e, principalmente, vice-versa.
Frederick Taylor, autor de Muro de Berlim, afirma que isso era, basicamente, “a premissa de uma fronteira fortificada em Berlim”. Em 1º de março, no entanto, Stalin sofreu um derrame, vindo a falecer no dia dia 5. O novo governo soviético, então, engavetou temporariamente os planos para a capital da RDA.
8. O que levou à decisão de construção do Muro de Berlim?
Mesmo com controles cada vez mais rígidos, o número de pessoas que atravessavam da zona soviética para a controlada pelos capitalistas só aumentava. Em maio de 1961 (ano da construção do Muro), 17.791 haviam ido para o oeste; em junho, 19.198. Só nas duas primeiras semanas de julho, 12.578. Até o fechamento da fronteira, o número total superava 870 mil.
9. “Ninguém pretende erguer um Muro”
Walter Ulbricht ficou famoso por essa frase, dita durante uma entrevista coletiva à imprensa em 15 de junho de 1961. Na conversa com os jornalistas, ele havia deixado claro que, caso se e assim que Berlim saísse do controle das forças de ocupação, o SED assumiria o controle de todas as rotas aéreas e terrestres que tivessem como origem ou destino a capital oriental.
Na entrevista, uma repórter do jornal Frankfurter Rundschau, da Alemanha Ocidental, perguntou a UIbricht: “Em sua opinião, a criação de uma cidade livre [no caso, Berlim sem ocupação] significa que a fronteira do Estado ficará no Portão de Brandemburgo?” O líder alemão oriental respondeu:
“Depreendo de sua pergunta que existem na Alemanha Ocidental pessoas que gostariam que mobilizássemos operários da RDA para construir um muro. Não tenho conhecimento de qualquer intenção neste sentido. Os operários da construção civil em nosso país estão ocupados principalmente na construção de casas, e suas forças são completamente consumidas nesta tarefa. Ninguém pretende erguer um muro.”
10. Muro de Berlim foi erguido na madrugada, de surpresa
1 hora da manhã, 13 de agosto de 1961, domingo: sob o comando do então secretário de Segurança do Comitê Central do SED e futuro líder da Alemanha Oriental, Erich Honecker, soldados foram posicionados a cada dois metros ao longo de toda a fronteira interna de Berlim. Enquanto isso, outras tropas cercavam a parte ocidental com arame farpado e mais bloqueios. A iluminação nas ruas próximas foi desligada enquanto o trabalho era feito.
Segundo o historiador Frederick Taylor, 68 dos 81 pontos de cruzamento entre as zonas soviética e as outras foram fechados, além das 193 ruas que atravessavam as fronteiras. Linhas de metrô (U-Bahn) e de trem (S-Bahn) foram interrompidas.
Às 6h, Berlim já amanhecia fisicamente dividida.
11. Prefeito de Berlim foi pego de surpresa com início da construção do Muro…
A construção da barreira física pegou todo mundo de surpresa: Washington, Londres, Paris, Bonn e até o então prefeito de Berlim, Willy Brandt. Ele não estava nem na cidade no dia.
No dia anterior, Brandt havia feito um discurso em Nuremberg, ao sul da Alemanha Ocidental. Ele era candidato ao cargo de chanceler. O político disse:
“Eles temem que as malhas da cortina de ferro se fechem definitivamente. Pois receiam ser encarcerados numa enorme prisão. Pois sentem a terrível angústia de que venham a ser esquecidos, descartados, sacrificados no altar da indiferença e das oportunidades perdidas…”
Após o discurso, Brandt pegou um trem noturno para a cidade de Kiel, ao norte. Às 5h da manhã, foi acordado com uma mensagem urgente do chefe de Gabinete: o Leste estava fechando a fronteira. O prefeito estava de volta a Berlim já para o café da manhã.
12. Qual foi a reação de EUA, França e Reino Unido à construção do Muro?
Recebida até com certo alívio pelos Estados Unidos, a notícia da divisão da cidade provocou menos reações das forças dos países capitalistas do que esperava o prefeito Brandt. A cidade tinha um mandatário, mas eram os comandantes militares das potências de ocupação que ditavam os rumos. Brandt foi ao encontro da Kommandatura (como era chamado o grupo, sem representante soviético desde 1948) para discutir a situação e saiu decepcionado: por mais que eles estivessem solidários, só decidiram mandar patrulhas adicionais para as fronteiras após a reunião.
Além disso, forças de segurança dos três países afastaram berlinenses ocidentais que tentavam ajudar orientais a ultrapassar a recém-construída barreira. Até chegou a haver um reforço na presença de tropas em Berlim, mas não passou disso.
13. Muro de Berlim dividiu ruas ao meio
Por conta da divisão estabelecida após a Segunda Guerra Mundial, alguns limites das zonas de ocupação terminavam literalmente no meio da rua. Ou seja: um lado da calçada era ocupado por uma força; o outro, por outra.
Com a construção do Muro, vizinhos foram, de repente, separados e impedidos de atravessar de um lado para outro.
O caso da rua Bernau, no bairro de Prenzlauer Berg, foi um dos mais notáveis: ela foi simplesmente partida ao meio. Em resumo: não era possível nem atravessar a rua.
Atualmente, no local, há um memorial do Muro.
14. Como ficou o metrô com o Muro de Berlim?
Além de todos os problemas inerentes à divisão repentina de uma cidade, situações curiosas acabaram sendo criadas. Como dividir o metrô, por exemplo? Havia linhas que saíam de Berlim Ocidental, entravam na RDA e voltavam para o setor dos outros aliados.
A solução foi fechar as estações de Berlim Oriental sem interromper o tráfego de trens, o que provocou o surgimento de “estações fantasma” (Geisterbanhöfe). O trem vinha de Berlim Ocidental, entrava na parte oriental pelo túnel e era proibido de parar nas estações, voltando a desembarcar passageiros somente quando estivesse de novo do lado ocidental.
As Geisterbanhöfe eram fortemente vigiadas com armas e protegidas até quanto a uma possível fuga dos guardas que cuidavam do local.
Algumas estações foram simplesmente muradas por dentro.
15. Muro cercou bairros e criou “ilhas” capitalistas na Alemanha Oriental
A divisão entre as potências ocidentais e os soviéticos não se restringiu ao meio da cidade. Bairros mais afastados sob domínio dos países capitalistas foram praticamente cercados pelo Muro e viraram ilhas dentro do território oriental. No total, foram criados 12 exclaves.
Um desses lugares é um pacato bairro chamado Steinstücken (do alemão “pedaços de pedra”), onde hoje não moram mais do que 300 pessoas. Após uma troca de terras entre as duas Alemanhas, foi aberta uma estradinha que ligava a região a Berlim Ocidental – devidamente margeada pelo Muro.
16. Número de mortos tentando atravessar o Muro até hoje é incerto
Até hoje, pesquisadores não conseguem fechar um número preciso de quantas pessoas tentaram atravessar o Muro e morreram. Esse índice costumava causar constrangimento para a RDA no mundo.
Uma pesquisa da Universidade de Potsdam, em 2011, fala, no entanto, em 136 mortes causadas por tiros disparados por guardas da fronteira. Só que esse total já foi revisto: dois anos depois, o número subiu para 138.
O caso mais famoso é o do jovem Peter Fechter, que tentou atravessar o Muro aos 18 anos, em agosto de 1962, junto a um amigo. Na hora em que os dois subiam a primeira barreira de arame farpado, os guardas começaram a atirar. Fechter foi baleado em uma artéria da perna e ficou sangrando e pedindo por ajuda até morrer. Ninguém, nem do lado ocidental, nem do oriental, foi ajudá-lo. Uma hora depois, o jovem faleceu e foi “recolhido”.
O constrangimento provocado pelo caso – fartamente fotografado – fez com que a RDA enfrentasse protestos e mudasse as regras, autorizando “atendimento imediato” em casos semelhantes.
17. Como se chamava o Muro de Berlim na Alemanha Oriental?
O nome usado na Alemanha Oriental para o Muro de Berlim era Barreira de Proteção Antifascista (sim, em alemão fica bem grande também: Antifaschistischer Schutzwall).
18. O Muro não era só um muro, mas pelo menos dois
Com o passar dos anos, o Muro foi se sofisticando. Quando ele caiu, havia, pelo menos:
– um muro de contenção
– duas cercas
– uma barreira antiveículos
– arames farpados
– torres de observação.
Essa área entre os muros ficou conhecida como “faixa da morte”: o objetivo era dificultar ao máximo a passagem para o outro lado. Hoje, uma boa parte dessa faixa é um parque – o parque do Muro (Mauerpark), cujo mercado de pulgas e caraoquês de domingo são famosos entre os turistas.
19. O que explica a queda do Muro de Berlim?
A Alemanha Oriental entrou nos anos 1980 ainda como grande potência do bloco socialista, mas com a economia desandando. Junte-se a isso uma onda de desmantelamento promovida por outros governos do bloco – notadamente na Polônia e na Hungria – e podem-se ter algumas razões para o fim da RDA.
Autoridades econômicas da própria Alemanha Oriental afirmavam que, em 1989, se não houvesse uma mudança econômica no país, a RDA talvez não conseguisse fechar as contas do ano.
20. Um piquenique na Hungria tirou o primeiro tijolo do Muro de Berlim
Em agosto de 1989, Áustria e Hungria fizeram um piquenique exatamente na fronteira entre os dois países. Foi a oportunidade para que vários alemães orientais passassem para o lado ocidental. Conheça mais sobre essa história aqui.
21. Queda do Muro começou com um anúncio errado
Em 9 de novembro de 1989, o governo da RDA recém empossado (com Egon Krenz no lugar de Erich Honecker no comando do país) tentava controlar seguidas manifestações populares. Em uma coletiva de imprensa, o então porta-voz do governo, Günter Schabowski, começou a ler um pedaço de papel que havia recebido pouco antes, com uma nova regra de viagens que havia sido decidida pelas autoridades do país pouco antes: qualquer cidadão poderia pedir autorização para atravessar a fronteira no posto de controle, e ela seria concedida ali mesmo.
Até então, era necessária uma longa burocracia para ir à Alemanha Ocidental, o que também despertava muita desconfiança da Stasi, a polícia secreta alemã-oriental.
O anúncio, até aí, estava correto. Ato contínuo, os jornalistas, confusos e surpresos com a declaração, pressionaram o porta-voz, questionando “a partir de quando” a medida valeria.
Schabowski olha para o papel, frente e verso. Nenhuma instrução. Ele baixa os óculos e diz uma frase que entrou para a história: “De acordo com minhas informações, agora, de imediato” („Das trifft nach meiner Kenntnis ist das sofort, unverzüglich“).
A questão é que a medida só valeria a partir do dia seguinte — o que Schabowski não sabia. Mas o que o levou a dizer que ela estaria em vigor a partir daquele instante? Segundo pesquisadores, a força do hábito: era comum que anúncios entrassem em vigência da RDA no momento do anúncio. Ou seja: Schabowski só seguiu o que fazia de costume.
O historiador Frederick Taylor conta que o anúncio foi tão chocante que os jornalistas precisaram até fazer uma pausa para um café a fim de tentar entender o que estava acontecendo.
Os jornalistas até não sabiam o que fazer, mas a população entendeu bem o que estava acontecendo. Uma multidão se dirigiu aos postos de controle de Berlim antes mesmo do fim da entrevista coletiva, solicitando passagem.
Sem conseguir segurar o público, os guardas liberaram a passagem. Era o fim do Muro.
22. A queda pegou todo mundo de surpresa
Por mais que uma série de protestos já tomasse a Alemanha Oriental (em especial nas cidades de Berlim Oriental e Leipzig), não se acreditava que a RDA fosse abrir suas fronteiras.
No dia da queda, o chanceler da Alemanha Ocidental, Helmut Kohl, nem em Bonn estava: o político participava de um jantar com o novo governo da Polônia em Varsóvia. Informado da situação, interrompeu o banquete e correu para a Alemanha.
Nos EUA, o então presidente George Bush também foi surpreendido pela notícia.
23. Muro dos anos 2000 teria barreiras de micro-ondas e sensores sísmicos
O governo da Alemanha Oriental acreditava que o Muro iria durar ainda muito tempo. Por isso, sempre tentava melhorá-lo. No começo de 1989, Berlim Oriental começou a estudar avanços tecnológicos para a construção, como barreiras de micro-ondas e sensores sísmicos que detectariam movimentos. A ideia era tornar o Muro mais “humano” e diminuir os casos fatais entre os que tentavam atravessar o obstáculo.
24. O Muro ainda existe – mas na cabeça das pessoas
A Alemanha virou um só país em 1990, mas, até hoje, sente os efeitos da reunificação, em um processo que envolveu a transferência da capital de Berlim pra Bonn. O que foi então comemorado, hoje, provoca sentimentos de nostalgia entre os antigos moradores de cada um dos lados, criando uma espécie de “muro virtual”: seja nos estilos de construção dos bairros (o modelo socialista domina a paisagem das cidades a leste), seja nos hábitos das pessoas. Isso abriu margem para um preconceito de ambos os lados: os “Ossis” (ao alemão Ost, “leste”) reclamam dos “Wessis” (de West, “oeste”), que reclamam dos “Ossis”.
25. Nas comemorações dos 25 anos da querda, Muro foi “reerguido”
Em 2014, a Alemanha lembrou os 25 anos do fim do Muro com diversos eventos, mas o ápice foi no dia 7 de novembro: a barreira foi “reconstruída” com balões de luz. A instalação percorreu 15 km do trajeto onde ficava o Muro. Veja aqui como ficou.