Com muito pouco você
apoia a mídia independente
Opera Mundi
Opera Mundi APOIE
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Podcasts
Opinião

As razões da Venezuela em deixar a CIDH

Encaminhar Enviar por e-mail

Desde a chegada de Chávez à Presidência, condenações à Venezuela foram constantes; no entanto, houve apoio ao golpe de Estado

Salim Lamrani

2012-08-15T20:43:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!


Em 28 de julho de 2012, o presidente Hugo Chávez anunciou ua decisão de tirar a Venezuela da Comissão Interamericana de Direitos Humanos por conta da sentença contra o país por maus tratos a um preso condenado por terrorismo, e que se refugiou nos EUA. Caracas denuncia um veredicto político.

Quatro dias antes dessa decisão, a CIDH (Corte Interamericana de Direitos Humanos) anunciou sua decisão de condenar o Estado venezuelano por ser “internacionalmente responsável pela violação do direito à integridade pessoal e pelo tratamento desumano e degradante contra o senhor Raúl José Díaz Peña”. A instância julgou que “sua prisão havia sido ilegal e arbitrária e [ele] esteve submetido a um regime de prisão preventiva que teria ultrapassado os limites estabelecidos na lei penal, amparando-se em uma presunção de perigo de fuga”. A CIDH também condenou o Estado venezuelano a indenizar Díaz Peña com 15 mil dólares. [1]

O condenado

Raúl José Díaz Peña é um venezuelano foragido da justiça, condenado pelos tribunais por terrorismo, e refugiado nos Estados Unidos. Em 2003, a Venezuela enfrentava uma situação de extrema polarização política por conta do golpe de Estado abortado contra o presidente democraticamente eleito Hugo Chávez, e da sabotagem petrolífera que custou dez bilhões de dólares à economia venezuelana. Ambos foram organizados pela oposição com apoio explícito dos Estados Unidos, que reconheceu a junta golpista de Pedro Carmona Estanga, então presidente da Fedecámaras (Federação de Câmaras e Associações de Comércio e Produção da Venezuela) – organização que agrupa os interesses econômicos do país – que atualmente se encontra refugiado na Colômbia.

Em 25 de fevereiro de 2003, uma facção radical da oposição composta por Felipe Rodríguez, José Colina Pulido, Germán Varela López, Silvio Mérida e Raúl José Díaz Peña, decidida a derrubar Hugo Chávez, colocou várias bombas no Consulado-Geral da República da Colômbia e na Embaixada da Espanha. O objetivo era acusar os partidários do presidente venezuelano pelos ataques, em suposta represália às decisões de Bogotá e de Madri em reconhecer a efêmera junta golpista de abril de 2002. [2]

Com o fracasso do plano, as autoridades do país prenderam Díaz Peña e seus cúmplices naquele mesmo dia. Depois do julgamento, em 29 de abril de 2008, a Justiça venezuelana o condenou em primeira instância a nove anos e quatro meses de prisão por terrorismo. Em maio de 2012, um juiz decidiu conceder um regime semi-aberto a Díaz Peña, permitindo que passasse os finais de semana com sua família e exercesse uma atividade profissional. Em setembro de 2010, Díaz Peña fugiu e se refugiou nos Estados Unidos. [3]

A CIDH é independente?

A CIDH é um órgão jurídico da OEA (Organização dos Estados Americanos), entidade sob forte influência dos Estados Unidos – a tal ponto que os países da América Latina e do Caribe decidiram criar a Celac (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e do Caribe), em dezembro de 2011, com a finalidade de se emancipar da sombra tutelar de Washington e de seu fiel aliado canadense. A corte é suspeita de parcialidade em relação aos governos de esquerda da América Latina.
 


Assim, contra todas as possibilidades, a partir de 2005, a CIDH aceitou estudar o caso de Díaz Peña a pedido da Venezuela Awareness Foundation, organização da oposição a Chávez. Por fim, para poder analisar o assunto, os estatutos da entidade interamericana estipulam que se deve primeiro esgotar todos os recursos jurídicos do país de origem, o que não é o caso de Díaz Peña. É a primeira vez na história da justiça interamericana que a CIDH aceita estudar o caso de um indivíduo condenado por terrorismo em seu próprio país, fugitivo da justiça e cujo julgamento continua aberto, em violação de sua própria Convenção. Até hoje, a CIDH não deu explicações a respeito. [4]

Nicolás Maduro, chanceler venezuelano, expressou seu descontentamento e anunciou que seu país se retiraria da organização. “É lamentável ter tido que dar esse passo, mas a Venezuela se viu obrigada, dadas as deciões aberrantes e abusivas tomadas contra nosso país durante dez anos. Nenhum país da Europa, nem os Estados Unidos aceitariam que a CIDH protegesse um terrorista”, declarou. [5] A diplomacia venezuelana acusa a entidade de “cumplicidade com a política de Washington de proteção aos terroristas” e exigiu “que apliquem os princípios de universalidade, imparcialidade, objetividade, e não de seletividade na análise das questões de direitos humanos”. [6]

De fato, desde a chegada de Hugo Chávez ao poder em 1999, a CIDH multiplicou as decisões e relatórios desfavoráveis à Venezuela, em proporções amplamente superiores ao resto da América Latina. Assim, desde sua criação, em 1959, e até a chegada de Hugo Chávez ao poder, em 1999, a CIDH só emitiu cinco decisões condenando as violações de direitos humanos na Venezuela. Em contrapartida, entre 2000 e 2012, a CIDH condenou Caracas 36 vezes. Assim, no espaço de 12 anos, a CIDH condenou a Venezuela sete vezes mais do que durante os 40 anos anteriores. Este período foi marcado por impostos abusivos de todo tipo e, particularmente, o “Caracazo” de 27 e 28 de fevereiro de 1989, um levante popular contra o alto custo de vida reprimido com sangue pelo exército e pela política que deixou um saldo de três mil civis assassinados. [7]

Por outro lado, durante o golpe de Estado de 2002, a CIDH, bem como os Estados Unidos, reconheceram abertamente a ditadura de Pedro Carmona em uma carta que Santiago Antón, então secretário da CIDH, endereçou ao empresário. [8] Maduro não deixou de lembrar este episódio, que faz uma sombra sobre a credibilidade e a fama da entidade interamericana: “A Comissão reconheceu os golpistas e negou apoio ao presidente Hugo Chávez”. [9]

O presidente Chávez confirmou que seu país se retiraria da CIDH. [10] “Venezuela se retira da Corte Interamericana de Direitos Humanos por dignidade, e a acusamos diante do mundo de ser indigna de levar esse nome de direitos humanos apoiando o terrorismo”, ressaltou. [11] A CIDH “nem sequer nos chamou para nos consultar. Aqui houve um julgamento, uma condenação, há testemunhas de que esse terrorista colocou bombas nas embaixadas da Espanha e da Colômbia, isso se comprovou”, acrescentou. [12]

A reação dos EUA

Por sua vez, Washington fustigou a decisão de Caracas. Victoria Nuland, porta-voz do  Departamento de Estado, declarou que a “Venezuela estaria enviando uma mensagem profundamente lamentável acerca de seus compromissos com os direitos humanos e a democracia” ao resto do continente, caso se retirasse da jurisdição da CIDH. Nuland elogiou a entidade interamericana afirmando seu respeito por ela. [13]

No entanto, a posição dos Estados Unidos não está isenta de contradições. Contrariamente a todos os países da América Latina, os EUA, assim como o Canadá, sempre se negaram a se submeter à jurisdição da CIDH e não reconhecem sua autoridade, pois julgam que ela viola sua soberania nacional.

A recente decisão da CIDH relacionada à Venezuela suscita várias questões. Por quê a CIDH aceitou estudar o caso Ruiz Peña antes que se esgotassem todos os recursos na Venezuela, violando assim sua própria Convenção? Quais foram os motivos que levaram os magistrados a emitir uma decisão favorável a um indivíduo que os tribunais venezuelanos condenaram por terrorismo e que é fugitivo da justiça refugiado nos EUA? Por acaso são políticas ou jurídicas? Por acaso ela teria estudado o caso se Ruiz Peña fosse colombiano, mexicano ou chileno? Qual foi o papel da CIDH no golpe de Estado contra Hugo Chávez e a democracia venezuelana em abril de 2002? Em uma palavra, a CIDH é imparcial em relação à Venezuela?

*Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos da Universidade Paris Sorbonne-Paris IV, Salim Lamrani é professor responsável por cursos na Universidade Paris-Sorbonne-Paris IV e na Universidade Paris-Est Marne-la-Valée e jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu último livro se intitula Etat de siège. Les sanctions économiques des Etats-Unis contre Cuba, Paris, Edições Estrella, 2011, com prólogo de Wayne S. Smith e prefácio de Paul Estrade. Contato: Salim.Lamrani@univ-mlv.fr. Página no Facebook: https://www.facebook.com/SalimLamraniOfficiel 

Referências bibliográficas:

[1] Corte Interamericana de Direitos Humanos, «Caso Díaz Peña vs. Venezuela», 26 de junho de 2012 (site acessado em 31 de julho de 2012).
[2] Agência Venezolana de Noticias, «Venezuela rejeita sentença da CIDH a favor do terrorista Díaz Peña», 24 de julho de 2012.
[3] Ibid.
[4] Ibid.
[5] Agência France-Presse, "Venezuela denunciará CIDH ‘nas próximas horas’", 26 de julho de 2012.
[6] Ministerio do Poder Popular para Exteriores, «Comunicado», República Bolivariana da Venezuela, 24 de julho de 2012.  (site acessado em 31 de julho de 2012). 
[7] Telesur, «Venezuela afirma ter provas suficientes da dupla moral da CIDH», 2 de maio de 2012.  (site acessado em 31 de julho de 2012).
[8] Ibid
[9] Agência France-Presse, «Venezuela denunciará a CIDH nas próximas horas’», op.cit.
[10] Agência France-Presse, «Chávez disse que já deu 'as instruções' para que a Venezuela saia da CIDH», 28 de julho de 2012.
[11] Agência Efe, «Insulza acredita que Venezuela não deixou a Corte IDH», 27 de julho de 2012.
[12] Alejandro Montiel, «Dupla moral da CIDH evidenciada com sentença que favorece terrorista que atentou contra embaixadas em Caracas», Imprensa Presidencial, República Bolivariana de Venezuela, 26 de julho de 2012.
[13] Agência France-Presse, «EUA avaliam que se Venezuela abandonar a Corte IDH enviará mensagem ‘lamentável’», 25 de julho de 2012.
 

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Guerra Israel x Palestina

Com dois meses de ataques israelenses, mais de 18 mil palestinos morreram em Gaza

Encaminhar Enviar por e-mail

Autoridades palestinas alertam para estado do sistema de saúde e delegação da ONU visita região para avaliar necessidades humanitárias: 'pior do que as palavras podem expressar', diz representante do Equador

Redação Opera Mundi

São Paulo (Brasil)
2023-12-11T21:17:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

A intensa operação militar israelense na Faixa de Gaza já deixou ao menos 18.205 palestinos mortos e mais de 49.200 feridos, sendo a maioria das vítimas composta de crianças e mulheres inocentes. Estas são as informações dadas pelo Ministério da Saúde palestina nesta segunda-feira (11/12) que, desde 7 de outubro, diariamente monitora o cenário e os reflexos dos incessantes ataques do exército de Israel.

As autoridades locais chegaram a emitir um alerta sobre o terrível estado do sistema de saúde de Gaza, ao informarem que mais de 300 funcionários de equipes médicas foram mortos pelos bombardeios recentemente. Além disso, disseram que os hospitais estão com 276% dos leitos de cuidados intensivos ocupados.

O Médico Sem Fronteiras denunciou, inclusive, a impossibilidade em atender tanta demanda com a limitação de recursos básicos acessíveis nos hospitais: “totalmente colapsado”, afirmou a coordenadora da entidade, Marie-Aure Perreaut.

O balanço foi divulgado no mesmo dia em que as forças de segurança lideradas pelas autoridades de Tel Aviv admitiram ter prendido 18 pessoas na Cisjordânia, na noite anterior, alegando que cinco estariam supostamente afiliadas ao Hamas. As prisões ocorreram no campo de refugiados de Balata, nas cidades de Dura e Tarqumya.

Twitter/State of Palestine - MFA
Em pouco mais de dois meses, Gaza já contabiliza mais de 18 mil mortes pelos ataques israelenses

Com o pedido internacional de cessar-fogo rejeitado na última sexta-feira (08/12) e sem expectativa alguma de que Israel tome alguma iniciativa para descontinuar os ataques, os representantes dos países-membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) - sem os Estados Unidos - visitaram a fronteira entre Egito e Gaza com o objetivo de verificar “em primeira mão o que é necessário em termos de operações humanitárias".

“A realidade é ainda pior do que o que as palavras podem expressar”, disse o representante do Equador na ONU, José De La Gasca.

Mesmo alvo de condenações por líderes da comunidade internacional, no último domingo (10/12), o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu mais uma vez reforçou que não há intenção de parar. "É o começo do fim do Hamas. Digo aos terroristas do Hamas: acabou".

Já o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, justificou as operações dizendo que os militares trabalham “de acordo com o direito internacional”, usando, mais uma vez, a tese do “direito de autodefesa” defendida pelos Estados Unidos, o único país que votou pelo veto do pedido de cessar-fogo no último encontro emergencial do Conselho de Segurança da ONU.

(*) Com Ansa

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!
Opera Mundi

Endereço: Avenida Paulista, nº 1842, TORRE NORTE CONJ 155 – 15º andar São Paulo - SP
CNPJ: 07.041.081.0001-17
Telefone: (11) 96627-3932

  • Contato
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Expediente
  • Política de privacidade
Siga-nos
  • YouTube
  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram
  • Google News
  • RSS
Blogs
  • Breno Altman
  • Agora
  • Bidê
  • Blog do Piva
  • Quebrando Muros
Receba nossas publicações
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

© 2018 ArpaDesign | Todos os direitos reservados