Um pequeno vídeo que circulou nas redes sociais ao longo das semana passada chamava a atenção para o fato de que a esquerda ou os setores democráticos antibolsonaristas insistiam em cair na armadilha de seguir a pauta proposta pela comunicação do presidente.
Enquanto todo o aparato das redes informais antibolsonaro ficava discutindo as já tradicionais dificuldades de mídia internacional na tradução das arengas presidenciais ou se dedicando às delícias do debate sobre as broxas com X ou as brochas com CH, deixava de lado que o executivo mantinha o corte sobre os orçamentos das universidades federais e encaminhava ao congresso duas MPs (medidas provisórias) absolutamente ilegais.
A primeira congelava a liberação de R$ 3,86 bilhões aos setores da cultura e de eventos previstos em três leis criadas por conta da pandemia da covid-19: as leis Paulo Gustavo (Lei Complementar 195, de 2022), Aldir Blanc 2 (Lei 14.399, de 2022) e do Perse (Lei 14.148, de 2021).
Ilegal porque a liberação já tinha sido aprovada pelo Congresso, os vetos presidenciais foram derrotados e a Constituição proíbe o recurso a Medidas Provisórias para matéria derrotada no mesmo ano legislativo.
O mesmo ocorreu com a MP em que o executivo propõe o desvio de 3,5 bilhões de reais do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento de Ciência e Tecnologia) para o orçamento secreto. Imoralidade à parte, ela também deveria ser devolvida pelo presidente do Senado porque o Congresso aprovou no ano passado, por pressão de toda a comunidade científica do país, uma lei complementar que proíbe o congelamento dos recursos do Fundo. E MP não pode alterar Lei complementar.
Wilson Dias/Agência Brasil
Executivo mateve corte sobre orçamentos das universidades federais e encaminha ao congresso duas MPs
Pelo que mostram as pesquisas, os estratagemas que sequestraram o que deveria ser a comemoração cívica mais importante dos últimos 200 anos da vida nacional não serviram para elevar (sic) as curvas dos gráficos de pesquisa de intenção de voto.
Mas isso não demoveu a cúpula governamental do seu desespero por botar mais dinheiro nas benesses eleitorais, a ponto desta tomar a decisão de cortar recursos da Farmácia Popular. Isso significa que às mais de 670 mil mortes pela COVID poderão se agregar outras por qualquer das razões que justificam o uso de remédios continuados por quem não tem condições econômicas para comprá-los.
Segundo o G1, “técnicos da Saúde avisaram o Ministério da Economia que a redução em recursos destinados à projetos da pasta poderia afetar programas relevantes; a área econômica, entretanto, alega que há uma ordem para não mexer nos recursos destinados ao pagamento de emendas de relator – mecanismo usado pelo presidente para garantir o apoio político do Centrão.”
Em resumo, moralidade, transparência, educação, saúde, ciência, tecnologia ou comida na mesa do pobre (75 milhões de brasileiros vivem com menos de meio salário mínimo por mês) não significam mais nada.
No desespero diante de uma rejeição que não baixa de 50%, a ordem é continuar irrigando a corrupção do centrão.
Aquele mesmo que o general baixinho, quando ainda pretendia disfarçar alguma coisa, definia pelo bordão “Se gritar pega ladrão, não sobra um, meu irmão.”
(*) Carlos Ferreira Martins é Professor Titular do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos.