No apagar das luzes de 2023, a Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) tornou pública a sua indignação com o orçamento aprovado para as universidades federais. Não é por menos: o montante aprovado pelo Congresso Nacional é menor que no ano anterior, com uma redução de R$ 310 milhões.
As entidades de classe ligadas à educação, ano após ano, gritam sobre a grave crise que assola as universidades brasileiras. Noutra oportunidade, denunciamos que entre 2010 e 2021, o orçamento das instituições sofreu um corte de 37% em matéria de custeio e cerca de 70% para investimento. Isso significa dinheiro insuficiente para pagar bolsas e comprar insumos para os laboratórios e quase nenhum dinheiro para concluir obras ou expandir as instituições que recebem novos alunos todos os anos.
Para funcionar minimamente em 2024, alerta a ANDIFES, é necessário um acréscimo de R$ 2,5 bilhões no orçamento discricionário das universidades federais, além de R$ 1,656 bilhão para os institutos federais e mais R$ 200 milhões para a CAPES (Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
“Mas não tem dinheiro!”
Precisamos equilibrar as contas, prega o Ministério da Fazenda. Por isso, Haddad há meses vem defendendo a política do déficit zero, ou seja, não gastar mais do que é arrecadado. Acontece que esse ajuste nas contas só vale para os gastos primários (sociais) e não para os gastos com a dívida pública. O governo terá R$ 5,5 trilhões para gastar este ano e cerca de R$ 2,7 trilhões vão para a dívida.
A imprescindível Auditoria Cidadã da Dívida escancara que no Brasil quase metade do orçamento tem sido destinado para o pagamento dos juros e amortizações da dívida (em 2022, foi 46% de todo o orçamento federal executado). Em relatório sobre a situação econômica do mundo e as perspectivas para 2024, a ONU denuncia que, em média, cerca de um quarto da receita governamental nos países dependentes é destinada para pagamento de juros da dívida pública. E vai além: reconhece que o contínuo aumento do pagamento de juros compromete o investimento de mais recursos nas áreas da saúde, educação e proteção social.
Se soubéssemos ao menos que dívida é essa! Mas não. Desde o fim da Ditadura Militar, o Brasil segue sem auditar a origem e os beneficiários das operações que resultam no aumento ad infinitum da dívida.
Marcos Oliveira/Agência Senado
Fachada do Ministério da Educação, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília
Educação é alvo das classes dominantes
Fato é que nesse baile quem dança é a educação. Justamente um dos setores mais sufocados pela política de ajuste fiscal dos últimos anos e que tinha grandes expectativas de voltar a respirar continuará pedindo socorro para fechar as contas. Isso significa corte de bolsas estudantis, redução no efetivo de trabalhadores da manutenção, segurança e limpeza, suspensão de projetos de extensão, etc.
Além da falta de dinheiro, a pasta da educação vem sofrendo forte pressão para dar continuidade ao projeto neoliberal que estava em curso desde o governo Temer, especialmente com o tema do Novo Ensino Médio, medida que precariza as escolas públicas e não foi revogado.
O ministro Camilo Santana deve escolher a qual pressão responderá. Do lado de cá, os estudantes e comunidade escolar exigem uma agenda para reverter as maldades dos últimos anos: em dezembro, mobilizações deram conta de pressionar o governo para retirar da pauta do Congresso a votação em regime de urgência do PL do Ensino Médio.
Mas como bem questiona o professor Fernando Cássio, os capitalistas da educação seguem trabalhando firme para rifar o ministro caso não corresponda aos seus anseios. Em destacada entrevista recente ao Valor Econômico, o diretor-executivo da ONG Todos pela Educação, Olavo Nogueira, fez críticas à demora do MEC em implementar a agenda do Novo Ensino Médio.
Quem sustenta um governo é seu povo
Nos últimos anos, quem governou o país apresentava uma agenda muito bem definida: defender os interesses dos bancos e do agronegócio, um governo dos patrões a todo custo. Era de se esperar, portanto, que implementasse cortes nas áreas sociais para sufocar os trabalhadores e garantir os compromissos com a classe dominante.
Por outro lado, se é verdade que esse governo é dos trabalhadores, só quem pode sustentá-lo é o seu povo. Portanto, me parece adequado prestar contas aos setores que podem defendê-lo até o final. Esses estudantes e trabalhadores que vão às ruas exigir verbas para a educação e fim do ajuste fiscal também são aqueles que estão na linha de frente para enfrentar os golpistas.
Já o presidente da Câmara e demais representantes do Centrão fizeram questão de faltar no ato do dia 8 de janeiro em Brasília. Um ato bastante institucional em defesa da democracia, realizado no Congresso Nacional na data que marcou um ano da tentativa de golpe de Estado dos generais. Estimados democratas que não querem se comprometer com a democracia. Isso deve nos dizer alguma coisa.
Não estamos navegando em águas calmas. O ajuste de contas deve ser feito com o lado de lá, caso contrário, dificilmente teremos força social para enfrentar a tempestade que se avizinha.