A engenheira de energia Claudia Sheinbaum, de 61 anos, tornou-se no último domingo (2) a primeira mulher eleita presidenta do México. Ela tem uma carreira acadêmica sólida, com mais de 100 artigos publicados sobre energia e meio ambiente, combinada a uma trajetória política desenvolvida nas últimas duas décadas no campo da esquerda. Começou sua carreira pública como secretária de meio ambiente da Cidade do México na gestão municipal AMLO (Andrés Manuel Lopez Obrador, o atual presidente), entre 2000 e 2006; depois foi prefeita de Tlalpan, uma cidade com 677 mil habitantes, de 2015 a 2017, quando interrompeu sua gestão para assumir a chefatura de governo do Distrito Federal em 2018.
Sua expertise em temas de energia e meio ambiente e suas posições comprometidas com movimentos sociais geram grandes expectativas nos temas da transição energética e das inovações em políticas ecológicas, seja contra o aquecimento global, seja por formas de produção agrícola mais sustentáveis. Sheinbaum integrou o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que foi agraciado com o Prêmio Nobel da Paz em 2007. Ela circula nas elites acadêmicas da Cúpula do Clima (COP) como pesquisadora. Se tem algo que ela entende melhor que a maioria dos mexicanos é sobre a ameaça climática e os riscos ambientais do extrativismo agrícola ou mineral.
Apesar do seu compromisso inegável com a pauta e da vontade política anunciada, é difícil imaginar que Sheinbaum conseguirá inclinar o México para um projeto fortemente ecológico, o que implicaria no enfrentamento a grupos poderosos, mineradores e petroleiros. Além disso, para que a transição ecológica não se transforme em uma “transação ecológica”, seria preciso não apenas escapar dos combustíveis fósseis, mas também alterar os padrões de consumo de modo tão revolucionário que o extrativismo mineral para fabricação de baterias não seja apenas um novo negócio destruidor e lucrativo.
Para uma tarefa de ruptura estrutural, é decisivo que Claudia Sheinbaum aproveite as maiorias construídas nessas eleições, tanto quanto o apoio ativo dos movimentos sociais de que dispõe.
O crescimento eleitoral da esquerda (e da violência política contra ela)
Superando as expectativas das pesquisas eleitorais, Sheinbaum saiu vitoriosa nas eleições de 2 de junho com 59% dos votos e 33 milhões de eleitores – 3 milhões a mais do que AMLO, seu antecessor e aliado que presidiu o país nos últimos seis anos. A coligação vitoriosa, Sigamos Haciendo Historia, é composta pelo partido Morena (Movimiento de Regeneración Nacional), criado em 2011 e fortalecido com o triunfo de AMLO em 2018; além dos menores Partido do Trabalho e do Partido Verde Ecologista.
Puxado pelo desempenho de Sheinbaum, o crescimento eleitoral da esquerda no parlamento é impressionante. Contando apenas os parlamentares do Morena, o salto foi de 191 deputados para algo entre 233 a 251 na Câmara e de 55 senadores para margem de 57 a 60 no Senado (segundo os “conteos rápidos” [sistema de contagem rápida] do Instituto Nacional Eleitoral, resultado ainda a ser consolidado). Somados os votos da coligação, o crescimento foi estrondoso: na Câmara, de 308 deputados o governo passa para algo entre de 346 a 380, e no Senado de 69 senadores para algo entre 76 e 88 (também “conteos rápidos”, a consolidar).
Isso dá à nova presidenta uma base de mais de 70% da Câmara e mais de 60% do Senado, suficiente para aprovar políticas estruturais ousadas e fielmente programáticas (e claro, para fazer inveja à esquerda brasileira). Ao contrário daqui, os partidos da coligação vencedora no México são confiáveis e têm proximidade ideológica com a nova presidenta, podendo aprofundar a agenda social e ecológica anunciada, e não barrá-la.
Considerando esse crescimento, as eleições no México parecem abrir caminho para uma esquerda mais programática, ao contrário do que se viu até agora no repique frágil da onda rosa na América do Sul. Talvez o México de Claudia Sheinbaum esteja mais próximo de uma Colômbia de Petro pela capacidade e possibilidade política de avançar em agendas estruturais. Mas também pelo enorme grau de violência política que assola o país.
Segundo os dados da ONG Data Cívica, as eleições de 2024 foram as mais letais da história do México. Em 2018, foram registrados 79 ataques a candidatos, geralmente ligados ao narcotráfico. Este ano, foram mais de 100 candidatos atacados em campanha, sendo dez candidatos do Morena assassinados e quatro do PAN. Nos últimos 10 anos, os grupos de crime organizado se quintuplicaram em tamanho, além de diversificar seus de negócios no controle de território, ou aquilo que a ciência política chama de “governança criminal”. Semelhante às milícias do Brasil, os narcos mexicanos atuam também no abastecimento de água, gás e eletricidade aos territórios vulneráveis que controlam, além de lucrarem com a indústria da construção civil e da especulação imobiliária.
Apesar da onda de violência, 80% concentrada nas eleições locais, o Morena também obteve vitórias importantes nos governos de Estados, o que confirma a solidez de sua base. Ganhou 23 governos estaduais em relação a quatro em 2018, superando largamente o PRI, que caiu de doze para dois governos estaduais, e o PAN, com queda de onze para quatro. Também levou a chefatura de governo do DF, com 52% de votos para Clara Brugada, cargo ocupado por Claudia Sheinbaum até junho de 2023 (quando renunciou para se candidatar).
Os principais rivais do progressismo compõem a coligação direitista informalmente conhecida como PRIAN (PRI+PAN): o direitista PAN (Partido de Ação Nacional) assumiu a maioria das cabeças de chapa, coligado ao centro-direitista PRI (Partido Revolucionário Institucional) e ao centrista PRD (Partido da Revolução Democrática). A profunda crise da direita mexicana vai na contramão das tendências sul e centro-americanas, que atravessam tempos difíceis, com ditaduras como de Nayib Bukele em El Salvador, ou governos autoritários de choque neoliberal como Javier Milei na Argentina, até fenômenos sociais proto-fascistas bastante profundos, como o bolsonarismo no Brasil.
A despeito do fortalecimento das direitas no mundo, o progressismo mexicano se impôs em 2024 como força política absolutamente hegemônica. Como explicar esse resultado? Quais as novas possibilidades abertas, e quais os seus limites?
Progressismo tardio: México antes e depois de AMLO
O México atravessou décadas de neoliberalismo duro desde os anos 1990 até 2018, tendo encontrado só mais tarde o triunfo político do progressismo, se comparado à chamada “onda rosa”. Em 2018, quando AMLO assumiu a presidência, o progressismo latino-americano parecia conjunturalmente derrotado na maior parte do continente – na Argentina com a vitória de Macri em 2015, no Brasil com o golpe de 2016, no Equador com a traição de Lenín Moreno em 2017, sem falar do auge da crise na Venezuela, na eleição de Bolsonaro em 2018, do golpe ultradireitista que exilou Evo Morales da Bolívia em 2019, e por fim da vitória de Lacalle Pou no Uruguai em 2020.
Nesse contexto, alguns pesquisadores chamaram o fenômeno AMLO de “progressismo tardio”, isto é, um programa de centro-esquerda que obteve vitória, mas era inevitavelmente atravessado pela crise da centro-esquerda no contexto regional e pelo fortalecimento social e político da extrema-direita. Isso explicaria, entre outras coisas, as eventuais adaptações e concessões ao neoliberalismo feitas por AMLO, mesmo dentro de um enquadramento novo e aparentemente animador para a esquerda mexicana. Entre os movimentos sociais mexicanos entrevistados por um grupo de pesquisadores brasileiros em 2019, a maioria não tinha esperança no novo governo e o via com desconfiança, com exceção de setores universitários.[1]
A despeito das críticas ao progressismo tardio mexicano, que são válidas e necessárias, o triunfo de Claudia Sheinbaum requer um diagnóstico sobre os saldos positivos do período AMLO. Sua vitória, afinal, representa um salvo-conduto para a continuidade.
Após seis anos de governo AMLO (três deles em pandemia, durante a qual a condução governamental foi vergonhosamente negacionista e depois se corrigiu), o presidente do Morena ainda exibia 58% de aprovação em seu fim de mandato, em setembro de 2023. Durante todo período, a aprovação de AMLO variou entre 54% e 81%, como mostra o gráfico, e nunca mais baixo que metade da população – um feito notável para anos econômicos complexos.
Vejamos alguns saldos positivos do governo AMLO no campo econômico:
1 – Entre 2018 e 2015, o salário mínimo do México aumentou em 110%. Para efeito de comparação, na soma dos mandatos de Lula 1 e 2, e Dilma 1, o salário mínimo por aqui se valorizou em cerca de 60%, o que costuma-se elogiar como um dos feitos do PT. Em doze anos, o progressismo brasileiro valorizou o salário mínimo a praticamente metade do feito por AMLO em seis anos. Para todos os efeitos, o aumento mexicano foi quatro vezes maior.
2 – Durante o governo AMLO, a média de crescimento econômico mexicano foi de 3% ao ano, o que parece pouco. Porém, tendo em vista a forte recessão da pandemia (2020-2021), representa uma estabilidade significativa e uma média anual maior que a região. Ademais, a recuperação foi rápida: em 2022, o país já tinha recuperado e expandido seu PIB em relação a 2019. Ainda que o PIB não represente automaticamente melhoria social, o crescimento aliado ao aumento real dos salários significaram a expansão do poder de compra dos mais pobres e capitalização dos pequenos e médios negócios com seus efeitos multiplicadores, que explicam em termos materiais a popularidade de AMLO.
3 – A isso se soma a valorização do peso mexicano em relação ao dólar, que alcançou níveis relativamente altos em comparação com a última década. Isso decorre da forte entrada de dólares no país, em função, em primeiro lugar, do aumento das exportações de manufaturados (especialmente das maquiladoras) para os EUA; em segundo lugar, do aumento das remessas de mexicanos imigrantes nos EUA (10% da população mexicana vive fora do país, quase a totalidade no vizinho do norte); em terceiro lugar, das exportações de petróleo cru; em quarto, do investimento direto estrangeiro; e, quinto, do turismo. Apesar de ser um indicador tipicamente neoliberal, o incremento do peso se refletiu em melhoria social dos termos de troca para a população mais pobre, já que o México é altamente importador de bens de consumo.
4 – O governo AMLO foi responsável por expandir programas sociais que retiraram 5,1 milhões de mexicanos da pobreza (nos termos do Banco Mundial). É pouco perante os 46 milhões de mexicanos dentro dessa categoria (36% da população), mas o suficiente para torná-lo um presidente reconhecido dentro de critérios “social-liberais” de popularidade. Nesses termos, o “gerenciamento da pobreza” foi bem sucedido.
5 – A dívida externa do México cresceu apenas 0,4% durante o seu governo, o que o torna também popular nos círculos neoliberais típicos, ou ao menos “aceitável” para o mercado. A estabilidade fiscal buscada por AMLO certamente atenuou ou neutralizou ataques característicos da imprensa burguesa e da propaganda neoliberal mais ideológica – o que não significa que não ocorreram, mas que parte do empresariado estava bastante satisfeito.
Além de indicadores econômicos favoráveis, AMLO também praticou técnicas mobilizadoras de fabricação e fortalecimento de sua popularidade: reunia periodicamente uma multidão de movimentos populares, trabalhadores, estudantes e classe média-baixa no Zócalo (Praça da Constituição, na Cidade do México) para consolidar sua linha política em discursos acalorados, com forte poder de coesão nacionalista em torno ao conceito de “quarta transformação”. Além de se reunir semanalmente em uma coletiva de imprensa que durava de 2 a 3 horas, na qual prestava contas e propagava os feitos de seu mandato com notável habilidade comunicativa – uma disponibilidade rara e valorizada em presidentes de República.
Enfim, apesar de uma gestão inicialmente negacionista da pandemia e dos limites estruturais do progressismo tardio, AMLO consolidou uma hegemonia capaz de conduzir sua sucessora à vitória e alçar o Morena ao partido mais forte do país em âmbitos nacional e regional.
Limites e concessões do progressismo mexicano
Apesar dos saldos, AMLO se desgastou com movimentos sociais por adotar uma perspectiva neodesenvolvimentista ou social-liberal que agrava as contradições de territórios comunitários, camponeses e indígenas com as dinâmicas extrativistas do capitalismo neoliberal.
Por exemplo, AMLO apostou em projetos de mega-empreendimentos de infraestrutura que violam territórios e soberania de comunidades camponesas e indígenas, como o Trem Maia (de 1554 quilômetros percorridos na península de Yucatán), o Trem Transístimico (que ligará o Golfo do México ao oceano Pacífico e é oficialmente comparado ao Canal do Panamá), novas refinarias de petróleo e um novo aeroporto para Cidade do México.
Para alguns, esses megaprojetos representam “progresso” e “desenvolvimento”, especialmente numa modalidade interessante de ferrovias, ao aumentar absurdamente o fluxo de pessoas e mercadorias em determinadas regiões, mas para alguns povos representa deslocamentos forçados, invasão territorial, alteração brusca de padrões de vida e consumo, novas dependências do mercado capitalista, endividamento e destruição de formas comunitárias de produção, que ainda resguardam certa autonomia.
Hoje cerca de 20% da população mexicana é rural, o que parece pouco, mas cerca de 60% dos mexicanos vivem em cidades menores do que 100 mil habitantes, muitas vezes ancorados em vidas simples, tradições rurais e comunitárias. Muitos em comunidades indígenas. Quando o “progresso” chega a estas localidades, o faz de maneira desigual, empregando alguns, mas expulsando outros e violando direitos de muitos. São as vítimas do extrativismo. Os territórios zapatistas e de outras comunidades indígenas com graus significativos de autonomia em relação ao governo central também permaneceram em confrontação às formas “neodesenvolvimentistas” do neoliberalismo.
Nesse sentido, a questão da terra e a luta por territórios persistiu como um problema estrutural, no qual AMLO se localizou, digamos, em uma posição progressista-capitalista, em contraste com as alternativas de vida comunitária e autogestionárias, que praticam economias solidárias, autônomas e coletivas. Especialistas alertam, por exemplo, que o trem Maia pode ampliar o fluxo de turistas de maneira tão abrupta em Yucatán que comprometeria o abastecimento de água e eletricidade para comunidades inteiras e alteraria completamente as dinâmicas econômicas tradicionais das populações locais.
Em outras palavras, ao progressismo de AMLO importaria mais fazer da cultura maia um artefato turístico, que atrai dólares e investimentos de empresas de infraestrutura, transporte, comunicação, gastronomia e hotelaria para as proximidades de Cancún (enclave turístico cujo movimento aeroportuário já é maior que da capital), do que propriamente proteger estes territórios e suas múltiplas formas de vida autônoma.
Por outro lado, ao contrário de Evo Morales na Bolívia e Rafael Correa no Equador, o presidente AMLO realizou e respeitou as consultas populares sobre os megaprojetos. A construção do novo aeroporto da Cidade do México, por exemplo, foi oficialmente suspensa após consulta popular dizer “não”, o que irritou empresários e investidores – que foram “devidamente” acalmados com outros contratos oficiais. Mas no caso do trem maia, algo inusitado ocorreu: 70% das comunidades afetadas participaram da consulta, das quais 92% foram favoráveis ao trem – fruto de uma propaganda bem feita sobre seus benefícios futuros. Segundo os dados oficiais, mais de 10 mil lideranças indígenas de 2 mil comunidades participaram de 30 assembleias sobre o tema, realizadas em suas próprias línguas. Se os efeitos prometidos vão se realizar ou não, só o tempo dirá.
Outra contradição de AMLO diz respeito às relações prioritárias com os EUA em relação à América Central, gerando continuidade de uma estrutura econômica dependente. AMLO não mudou a precariedade laboral da manufatura das maquiladoras e se preocupou em reunir-se com os empresários do setor para assegurar estabilidade e expansão dos negócios. Sabemos, porém, que as ‘maquilas’ baseiam sua competitividade no trabalho mal remunerado, em terceirizações que nem sempre partilham dos aumentos de salário mínimo real por estarem em esquemas informais e/ou ilegais de contratação. Há, portanto, uma zona enorme do mercado de trabalho não alcançada pelos benefícios dos programas sociais ou aumentos salariais.
No âmbito da dependência econômica, AMLO reafirmou a prioridade ao NAFTA, recém substituído pelo USMCA (acordo Estados Unidos–México–Canadá) com aprovação do progressismo mexicano, o que amarrou o governo a determinações típicas do neoliberalismo, como o tripé macroeconômico, a gestão privatista, a estabilidade fiscal acima de tudo, a previdência privada, a inviolabilidade máxima da propriedade privada e consequente a aversão a processos expropriatórios – que seriam necessários para fazer avançar mudanças estruturais realmente transformadoras do capitalismo.
Enfim, o progressismo de AMLO foi social-liberal, com avanços do consumo popular, mas limites dados pela aderência ao neoliberalismo e suas exigências internacionais.
As complicadas transições do progressismo
Com exceção do Uruguai, as transições internas do progressismo foram em geral complicadas e problemáticas. No Brasil, Dilma perdeu hegemonia no parlamento e foi golpeada em 2016. Na Argentina, cada proposta de sucessor do kirchnerismo parecia se afastar mais e mais do núcleo progressista e abraçar o empresariado (Scioli, Fernandez, Massa). No Equador, Lenín Moreno traiu Correa, que hoje vive exilado na Europa e não pode sequer voltar ao seu país. Na Bolívia, Evo Morales nunca aceitou passar o bastão e pior, depois que o MAS venceu o pleito pós-golpe, se tornou rival e opositor contra seu ex-aliado Luís Arce. Na Venezuela, Maduro nunca obteve a mesma popularidade que Chávez e gerenciou um projeto sem identidade e com dificuldade de avançar.
Na expectativa de evitar as complicações dos outros países, Claudia Sheinbaum parece altamente preparada e conquistou uma enorme hegemonia eleitoral. Também tem estofo técnico e político, além de demonstrar habilidades comunicativas que a fizeram ganhar com ampla margem. Em seu discurso de posse, lembrou que representa o projeto coletivo de milhões de mexicanos organizados em movimentos sociais, comunidades e territórios; e homenageou mulheres trabalhadoras que tombaram em luta.
No campo simbólico, Sheinbaum tem tudo para construir o que ela chamou de “segundo andar” da quarta transformação. No entanto, no campo estrutural, os desafios são tremendos. Qualquer transição energética em um país que integra a OPEP enfrentará limites brutais, que só podem ser superados com enfrentamentos a setores poderosos do empresariado dos combustíveis fósseis – ou então com sua aliança rumo a uma “transação energética”. Por sua vez, uma reforma social e territorial profunda enfrenta limites do próprio regulamento do USMCA. O ordenamento jurídico internacional que AMLO acatou e assinou impede que o progressismo mexicano de passos mais estruturais, para além da gestão da pobreza.
Em resumo, o clima é de alegria e vitória da esquerda no México. Mas já sabemos que o progressismo latino-americano não combate o capitalismo. Se firmou, ao contrário, como uma variante social do próprio sistema. No México, com a nova presidenta podemos acreditar nas melhores intenções obstruídas por brutais impedimentos estruturais, que só seriam superados por uma improvável (ou impossível) política de ruptura do alinhamento econômico com os EUA.
(*) Joana Salém é Historiadora da América Latina contemporânea, Doutora em História Econômica pela USP e professora da UFABC.