Acabo de saber da partida do grande amigo e camarada Marcos Antônio Silva, meu professor e orientador de mestrado e doutorado. Estou tristíssimo. A ele devo a possibilidade de ter dado uma guinada de propósitos em minha vida.
Em 2000, fora da Universidade havia 15 anos, sem contatos acadêmicos e passado dos 40, tentei continuar meus estudos, após me formar na FAU-USP. Marcos gostou do projeto sobre Angelo Agostini e a imprensa abolicionista no final do II Reinado que apresentei ao programa de pós-graduação em História Social da FFLCH-USP. Do quase nada, recebo seu telefonema no final daquele ano, aceitando me orientar.
Marcos tinha 73 anos e era um intelectual extremamente erudito e culto, ao mesmo tempo que se voltava para o estudo da cultura popular e de massas (são áreas distintas). Mais que um orientador, foi um companheiro de diálogos constantes e de uma atenção e afetividade ímpares.
Natural de Natal (RN), Marcos foi professor titular de Metodologia da História, doutor e mestre em História Social pela FFLCH/USP, com pós-doutorado na Université de Paris III. Assessorou equipes de professores de História nas redes estadual e municipal, durante a primeira gestão do PT em São Paulo, liderada por Luíza Erundina.
Publicou Prazer e poder do Amigo da Onça (Paz e Terra, 1989), História – O prazer em Ensino e Pesquisa (Brasiliense, 1995; reeditado em 2003) e Dicionário crítico Câmara Cascudo (Perspectiva, 2003), dentre outros, além de inúmeros artigos acadêmicos. Sua mais recente obra é Ditadura relativa e negacionismos (Editora Maria Antônia, GMarx USP, 2021), para a qual tive a honra de escrever a orelha. É um dos responsáveis por recuperar a importância da obra de Nelson Werneck Sodré para a historiografia brasileira. Deixou no prelo da Edusp o Dicionário crítico Jorge Amado, reunindo uma gama enorme de intelectuais e pesquisadores que analisaram, em verbetes, a enorme obra do escritor baiano.
Formou várias gerações de pesquisadores desde os anos 1980. Crítico do revisionismo histórico em relação à ditadura, em voga nos dias que correm, Marcos se vai, ironicamente no dia em que o golpe de 1964 completa 60 anos. Estive com ele há menos de um mês, no hospital onde se recuperava de uma cirurgia.
Choro sua perda. Adeus meu grande e fundamental amigo!
(*) Gilberto Maringoni é jornalista, cartunista e professor da Universidade Federal do ABC (UFABC).