A questão mais importante da conferência sobre o clima de Paris – quanto os participantes vão tentar cortar em poluição por dióxido de carbono – já foi resolvida. A maioria dos países já submeteu seus compromissos com relação às emissões de gases causadores do efeito estufa para os próximos 10 ou 15 anos. Estas promessas, conhecidas como “contribuições pretendidas determinadas nacionalmente” ou INDCs [na sigla em inglês], consistirão no centro do plano global para mitigar as mudanças climáticas.
Mas muita coisa permanece no ar (tanto questões não resolvidas como gases estufa, quero dizer). Como os líderes mundiais lidarão com os seguintes pontos irá determinar se o momentum construído em torno do esforço internacional pelo clima continua a crescer ou se começa a retroceder.
Agência Efe
Marcha pelo clima realizada neste domingo (29/11) em Roma, Itália
Revisões de metas
Um acordo em Paris não pode ser o fim deste processo, porque o esquema atual de compromissos com relação às emissões de carbono não é bom o suficiente. De acordo com estimativas das Naçoes Unidas, as promessas vão limitar as mudanças climáticas a uma média de aumento das temperaturas de aproximadamente 2,7 graus Celsius. Isso é menos desastroso do que nossa trajetória atual em direção aos 5 graus Celsius, mas “tornamos o mundo um lugar menos desastroso” seria um epitáfio bem chinfrim. Com esse nível de aquecimento, o nível dos oceanos pode subir vários metros, ameaçando cidades costeiras no mundo todo. O número de pessoas expostas a enchentes severas poderia sextuplicar, e a produtividade global poderia ter uma queda de 20%.
A questão mais complexa na mesa em Paris, portanto, será um mecanismo para que os países melhorem suas metas assim que eles voltem para casa. No dia 2 de novembro, a China e a França anunciaram apoiar a medida de atualizações de metas de emissão a cada cinco anos. Os Estados Unidos estabeleceu uma meta de emissões de gases estufa para 2025, em lugar de 2030 como em muitos outros países, e também tende a apoiar revisões a partir de 2019 ou 2020.
Como a atual rodada de compromissos, o processo de revisão provavelmente seria político e não atrelado a legislações. A pressão da comunidade internacional agiria como o principal incentivo para que cada país aumente sua promessa de redução.
Avaliações frequentes também são uma boa ideia, porque as metas de redução de emissões de dióxido de carbono tendem a se tornar cada vez mais fáceis de serem alcançadas. Tecnologias renováveis vão se tornar mais baratas. Por exemplo, o preço da energia solar em 2017, de acordo com o Deutsche Bank, será comparável ao da energia baseada em combustíveis fósseis em 80% dos mercados mundiais. Além disso, na medida em que os países fazem progressos com relação à redução da poluição por dióxido de carbono sem devastar suas economias, os argumentos pessimistas tradicionais (como “cortar emissões é igual a cortar empregos”) vão perder credibilidade. A economia verde se tornará um feedback positivo retroalimentável.
Dinheiro
Uma das poucas coisas boas que emergiram dos destroços da conferência sobre o clima realizada em 2009 em Copenhagen foi o Fundo Climático Verde. O GCF [sigla em inglês] pretende disponibilizar 100 bilhoes de dólares para países em desenvolvimento até 2020 para ajudar a pagar por projetos de adaptação e mitigação climáticas. O fundo teve um começo hesitante, mas há mais de 10 bilhões de dólares disponíveis, e os administradores do fundo estão prontos para começar a distribuí-los entre as nações que mais precisam dele.
Em Paris, os negociadores deverão decidir o que acontece após 2020. Se o Fundo Climático Verde acabar assim que chegar aos 100 bilhões, muitos países em desenvolvimento não serão capazes de atingir suas metas de emissões. Índia – o quarto maior emissor de gases estufa e lar de mais pessoas vivendo na pobreza do que qualquer outro país – afirmou que não conseguirá atingir suas metas climáticas a não ser que o mundo desenvolvido cumpra sua promessa de financiamento. Além disso, muitos outros países vão recusar aumentar seus compromissos durante a próxima rodada de revisões sem o dinheiro adicional para a mitigação.
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Alguns países vão pedir promessas específicas em dólar para além de 2020, enquanto outros vão resistir a qualquer menção de dinheiro pós-2020 no acordo final. Espere algum tipo de compromisso – possivelmente novas rodadas de promessas financeiras a cada par de anos, algo parecido com as revisões periódicas dos INDC.
Outras duas questões financeiras ameaçam a conferência de Paris. Primeiro, somente 17% do financiamento climático vai para projetos de adaptação (que tornam comunidades mais resilientes frente aos impactos das mudanças climáticas) enquanto quase 80% vão para mitigação (ações para reduzir as emissões de dióxido de carbono, como a construção de usinas eólicas). Esta distribuição reflete os valores dos países ricos doadores, cuja maioria ainda está para sofrer grandes consequências das mudanças climáticas. Pequenas nações insulares e outras na linha de frente do aquecimento global querem mais dinheiro para construir diques contra o avanço do mar e proteger sua infraestrutura de grandes tempestades.
Falando em pequenas nações insulares, países vulneráveis tem feito campanha há décadas para a implantação de um esquema de compensação chamado “perdas e danos”. Países desenvolvidos causaram esse problema, argumentam eles, e portanto devem pagar pela destruição resultante de suas atividades. Alguns países ricos (que tendem a ver este esquema como “responsabilidade ilimitada por um tempo ruim”) resistem bastante a essa ideia.
Transparência
Uma das peculiaridades do sistema de tratados climáticos atual é a diferença com que ele trata países desenvolvidos e países em desenvolvimento. Os primeiros são avaliados a partir de seus progressos factuais com relação às metas de redução de emissões, enquanto os últimos, como a Índia e a China, são avaliados somente com base na transparência e na completude de seus relatórios. Países em desenvolvimento podem passar longe de suas metas e ainda sim serem considerados em conformidade com o que foi acordado, desde que sejam honestos sobre isso. OS Estados Unidos e a União Europeia querem mudar este sistema, sujeitando os países em desenvolvimento às mesmas exigências que eles enfrentam.
Parece uma questão menor, mas a China e a Índia são responsáveis por mais de um quarto das emissões mundiais de gases causadores do efeito estufa. Se queremos levar as mudanças climáticas a sério, a honestidade não pode mais ser o suficiente na Ásia. Eles devem implantar ações verificáveis.
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A COP21 será a conferência sobre o clima mais coreografada da história. Isso é uma coisa boa, mas um acordo ainda não está garantido. Pode haver ainda muito drama climático. Fique ligado.
Artigo original publicado no site da revista norte-americana OnEarth.