O clã Bolsonaro parece mesmo disposto a subordinar a política externa à orientação de Washington e colocar o Brasil no colo de Donald Trump. Enquanto o pai, eleito presidente, provoca a saída dos médicos cubanos do programa Mais Médicos e ameaça romper relações com a Ilha socialista, o filho Eduardo Bolsonaro, deputado pelo PSL, defendeu nesta semana em Washington, durante reunião com membros do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, o congelamento de bens de cubanos e venezuelanos no Brasil.
O parlamentar, neófito em política externa e inspirado num anticomunismo arcaico, manifestou a intenção de realizar uma parceria com a Casa Branca contra supostos crimes financeiros ligados a Cuba e Venezuela. Adiantou que, no Brasil, a ação poderá ser coordenada pelo Itamaraty e o Ministério da Justiça, sob o comando de Sérgio Moro. Em matéria de relações perigosas com o imperialismo o juiz curitibano pode ser considerado um veterano, uma vez que sua badalada Lava Jato foi municiada por informações colhidas pelas agências de espionagem estadunidenses, que grampearam a presidenta Dilma Rousseff e vários integrantes do primeiro escalão do seu governo, além de empresas como Petrobras e Odebrecht.
Arrogância
O filho de Bolsonaro não está investido de autoridade para definir os rumos do relacionamento da nação brasileira com a comunidade internacional, que mesmo no governo golpista de Temer, apesar da maior aproximação com Washington, não desceu a um nível tão baixo em termos de subserviência ao imperialismo. Mas fala, e grosso, como filho do novo presidente. Este já anunciou aos quatro cantos do mundo sua obsessiva admiração pelo ídolo Donald Trump, cuja liderança quer seguir cegamento ainda que isto signifique sacrificar os interesses nacionais.
Neste diapasão já comprou briga com a China, da qual a economia brasileira depende hoje, tanto do ponto de vista comercial como financeiro (investimentos externos), muito mais do que dos EUA. Criou encrenca com as nações árabes ao anunciar o desejo de transferir a embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém, fonte de discórdia entre judeus e palestinos. O Egito reagiu com irritação suspendendo um encontro com o embaixador brasileiro no Cairo e ameaçando rever as relações comerciais e reduzir as importações de mercadorias brasileiras. Nesta terça-feira (27) o filho deputado, em Washington, voltou a declarar que a polêmica decisão de reconhecer Jerusalém como capital de Israel já foi consumada e a “questão não é se isto vai ocorrer, mas quando”.
Entreguismo
As trapalhadas foram cometidas para agradar o patrão Trump, com o qual por sinal os Bolsonaros têm em comum a ideologia de extrema direita e o ódio anticomunista. No mais existem notáveis diferenças, pois o presidente dos EUA não atrelou sua política externa a potências alienistas e promove, com protecionismo e guerra comercial, uma orientação que nada tem de liberal, é na verdade uma antítese (de direita) do neoliberalismo (que inspira a agenda econômica de Paulo Guedes) e da globalização. Por aqui predomina o espírito de vira-lata, espírito reacionário, entreguista e antipatriótico que anima nossas classes dominantes e constitui o mais sério obstáculo ao desenvolvimento nacional soberano.
Profissionais na arte da mentira e do cinismo, Bolsonaro e equipe alardeiam que não pretendem pautar o futuro governo e em especial a política externa pela ideologia, acusação que as forças conservadoras sempre lançaram injustamente contra Lula, Dilma e o ex-chanceler Celso Amorim. Porém, o presidente eleito e sua equipe fazem precisamente o contrário do que pregam, ou seja, buscam definir as relações internacionais com base no mais tosco anticomunismo e numa ideologia obscura e irrealista de extrema-direita, fundada em preconceitos, intolerância e ódio.
Cuba, China, Venezuela ou Rússia não fundamentam suas políticas externas na ideologia, mas nos interesses nacionais e no respeito às divergências e liberdade de opção política e ideológica de cada nação. Não poderia ser diferente, sob pena do isolamento internacional, prejuízos financeiros e conflitos custosos e desnecessários. A vida já nos ensinou que nem sempre o que é bom para os EUA é bom para o Brasil, muito pelo contrário. O caminho que o governo Bolsonaro deseja trilhar não promete nada de bom para nosso povo e envergonha a consciência nacional.
(*) Jornalista, autor de O Golpe do Capital contra o Trabalho
Reprodução/YouTube
Durante campanha nos EUA, em 2017, Bolsonaro prestou continência à bandeira norte-americana