O adiamento das eleições presidenciais no Senegal desencadeou uma onda de protestos que se espalha pelo país e já causou a morte de duas pessoas. As forças de segurança têm reprimido os manifestantes com violência. Observadores notam que o país da costa ocidental da África atravessa uma crise política cada vez mais tensa.
O estudante de geografia Alpha Yero Tounkara, de 22 anos, inscrito na Universidade Gaston Berger, em Saint-Louis, morreu “em consequência dos ferimentos sofridos durante as manifestações” na sexta-feira (09/02), afirmou um representante da universidade à reportagem da RFI.
O Ministério Público senegalês abriu uma investigação para determinar as circunstâncias exatas do óbito. Em uma nota à imprensa, divulgada neste sábado (10/02), o Ministério do Interior afirmou que “as forças de defesa e segurança não intervieram no campus onde ocorreu a morte”. Mas representantes estudantis de Saint-Louis indicaram a retomada da mobilização no campus “para que justiça seja feita” e que “a democracia seja respeitada”.
A segunda vítima fatal é um morador de Pikine, subúrbio da capital senegalesa. Segundo um familiar contatado por telefone pela RFI, Modou Gueye, de 23 anos, foi baleado na sexta-feira no bairro de Colobane. “Ele não participou das manifestações, mas veio fazer compras”, disse o cunhado. As autoridades ainda não divulgaram informações sobre o caso.
As manifestações começaram logo depois que o presidente senegalês, Macky Sall, anunciou há uma semana o adiamento das eleições para designar o seu sucessor. A votação estava inicialmente marcada para 25 de fevereiro. Sall justificou a medida devido à disputa entre a Assembleia Nacional e o Conselho Constitucional pela impugnação de alguns candidatos. Deputados investigam dois juízes do Conselho, cuja integridade no processo eleitoral foi questionada.
Mission de l'ONU au Mali – UN Mission in Mali/Flickr
Segundo Ministério do Interior "forças de defesa e segurança não intervieram no campus onde ocorreu a morte de um estudante"
Na segunda-feira, o Parlamento senegalês aprovou um adiamento para 15 de dezembro, com os votos do bloco presidencial e dos apoiadores de um candidato impugnado, sob a proteção das forças de ordem.
A Cruz Vermelha local tem mantido contato com seus postos de atendimento nas diferentes regiões do país para fazer um balanço dos confrontos. Várias associações de jornalistas denunciam a violência dirigida por parte da polícia a profissionais da imprensa que fazem a cobertura dos protestos.
Presidente defende sua decisão
No plano jurídico, 14 candidatos à presidência interpuseram recursos perante o Supremo Tribunal para solicitar a anulação do decreto que adiou a votação. Paralelamente, alguns deputados apresentaram nesta semana uma petição ao Conselho Constitucional contra a lei aprovada em 5 de fevereiro na Assembleia e que adia as eleições para 15 de dezembro.
Em entrevista à agência norte-americana Associated Press (AP), o presidente Macky Sall defendeu neste sábado sua decisão de adiar o pleito. Ele afirma “estar totalmente pronto para entregar o cargo”, mas não comentou o que faria caso o Conselho Constitucional anule o decreto de adiamento da votação. “É muito cedo para considerar essa perspectiva. Quando a decisão for tomada, poderei dizer o que farei”, explicou.
Os Estados Unidos, por meio de sua embaixada em Dakar, voltaram a apelar na sexta-feira para o “restabelecimento do calendário eleitoral”. A União Europeia, por seu lado, apelou às autoridades para “organizarem as eleições o mais rapidamente possível”.
O Coletivo de Cidadãos “Aar Sunu Election” (“Vamos proteger a nossa eleição”, em wolof), que reúne movimentos da sociedade civil, organizações religiosas e sindicatos, já planejou uma mobilização para a próxima terça-feira (13/02).
Senegaleses que moram no exterior também têm se organizado para pressionar o presidente a voltar atrás e garantir à população o direito ao voto. Na França, eleitores do Senegal se reuniram neste sábado em Paris, Bordeaux, Grenoble, Rennes e Nice, atendendo a uma convocação transmitida nas redes sociais por militantes do Pastef, partido de oposição dissolvido em julho de 2023.